Criada há seis meses pelo Movimento de Mulheres Olga Benario, a Ocupação Mirabal tenta, com o apoio do Ministério Público, reverter decisão de reintegração de posse obtida na Justiça pelo dono do prédio em que está instalada, no Centro.
Sem receber dinheiro público, a organização é reconhecida por órgãos que combatem a violência contra a mulher por realizar um trabalho sério junto a vítimas. A delegada Tatiana Bastos, da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher de Porto Alegre, costuma enviar para a Ocupação Mirabal casos que entram em lacunas da rede de proteção da Capital, quando há a impossibilidade de atender mulheres de outros municípios ou não há vagas nos abrigos públicos. Se coordenadoras da Mirabal levam vítimas para registrar ocorrências na delegacia, recebem a mesma prioridade de encaminhamentos feitos pela assistência social oficial do município ou do Estado.
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Para ela, a decisão de encaminhar mulheres para um espaço não reconhecido legalmente pelo Estado é uma "escolha de Sofia":
– Mesmo com a questão legal, eu sempre vou priorizar a defesa da mulher, porque nesses casos ela precisa de acolhimento e o trabalho que a ocupação faz é maravilhoso. Quando a rede não suporta a demanda ou há mulheres de outros municípios, nós encaminhamos, sim, para a Mirabal.
No fim do ano passado, a ONG Themis - Gênero, Justiça e Direitos Humanos emitiu uma nota de apoio à Ocupação de Mulheres Mirabal. A organização salienta que "a luta das mulheres por sobrevivência deve ser encarada com seriedade pelos poderes públicos e pela sociedade".
Nos três andares do casarão no Centro, há dormitórios, salas de atendimento, brinquedoteca, refeitório, cozinha, banheiros, auditório e um pátio amplo nos fundos. Sem burocracia, o primeiro atendimento à vítima é realizado em uma salinha logo na entrada. Algumas mulheres chegam com filhos pequenos, muitas vezes só com a roupa do corpo. Além de vestimentas, kit higiene e comida, ganham atenção especializada e, principalmente, carinho.
– Depois que entra aqui, a mulher passa a ser parte da nossa família. Recebemos todas as mulheres, sem exceção. É claro que há pensamentos diferentes, mas tudo é resolvido na base da conversa – comenta Cláudia.
Além do atendimento realizado pela rede de apoio, acontecem diversas oficinas e atividades para as mulheres e crianças que vivem lá, como teatro, dança do ventre, yoga, defesa pessoal, debates e grupos de estudos sobre feminismo. As oito coordenadoras da ocupação também divulgam vagas e encaminham para entrevistas de emprego – a ideia é ajudar na recolocação profissional.
RELATOS DE ESPERANÇA
Veja trechos de cartas escritas pelas acolhidas às integrantes do Movimento Olga Benario. Os nomes são omitidos por razões de segurança.
"Descobri que sou capaz de criar meu filho com todo meu amor, sozinha. Mesmo que na ocupação os bebês sejam bem bajulados e com várias mamães, como dizem as crianças. Hoje, eu me sinto vivendo em uma grande família, onde aprendi a me expressar mais, dividir meus problemas, acolher todos como forma de gratidão à vida."
"Aqui na Mirabal, me reencontrei. Obrigada, meninas, obrigada, mulheres Mirabal, por devolver a vida, a liberdade a mim e ao meu filho."