Porto Alegre alaga. Basta chover forte e os problemas se repetem nos mesmos locais – todos bem conhecidos das autoridades e da população, que amarga prejuízos e contratempos. A falta de investimentos em infraestrutura convive com problemas na gestão municipal e com a inoperância do Ministério Público, há uma década com inquéritos abertos sem conclusão.
A lista de motivos que deixam a Capital submersa a cada chuvarada é extensa, foi escrita ao longo dos anos e, diante de uma gestão municipal que padece de falta de recursos, tende a aumentar.
MP tem nove inquéritos sobre alagamentos e casas de bombas em Porto Alegre
Moradores fazem vaquinha para consertar equipamento em casa de bombas
"Não vamos apresentar soluções fáceis, que se desmancham", diz Marchezan
Evitar cheias como as dos últimos dias exige investimentos pesados em obras de macrodrenagem, para construção e ampliação de galerias subterrâneas. Verbas federais de R$ 237 milhões aguardam, sem previsão, liberação da Caixa e do Ministério das Cidades. O problema é agravado por um sistema de casas de bombas que funcionam à metade da capacidade e por redes pluviais e bueiros entupidos com frequência devido à ausência de manutenção pela prefeitura, onde faltam até ferramentas para o trabalho no Departamento de Esgotos Pluviais (DEP).
Durante as últimas duas semanas de chuvas, Zero Hora questionou a prefeitura sobre se há um plano, ainda que emergencial, para conserto de bombas de sucção de água e outras obras necessárias para minimizar os alagamentos. Em meio aos transtornos, a ação mais concreta foi pelas mãos da Associação Comunitária dos Moradores do bairro Anchieta, que fez uma vaquinha, juntou R$ 5,3 mil e doou o valor à prefeitura para o conserto de um dos equipamentos da casa de bombas 6, que atende a região. O prefeito Nelson Marchezan diz que tentará resolver, ao menos, parte dos problemas, mas não o cenário todo:
– Estamos falando com o Ministério das Cidades, mas não depende de nós. A questão macro ou é com nossos recursos, que não temos, ou parcerias. É um mapeamento que demora mais e não terá resultado na vida das pessoas neste inverno.
Sem dinheiro em caixa, a prefeitura calcula serem necessários R$ 3 bilhões para compensar "a falta de investimentos das últimas décadas". Mas há problemas evidentes de gestão. Há quatro meses, o DEP não tem uma terceirizada para o serviço de desassoreamento e dragagem de arroios. Os contratos de manutenção da rede pluvial com a Cooperativa de Trabalhadores Autônomos das Vilas de Porto Alegre (Cootravipa), que funcionavam com problemas de má execução de serviços, encerraram-
se há 10 dias. A licitação aberta foi impugnada e não há data prevista para ocorrer. A Secretaria de Serviços Urbanos garante que servidores do próprio quadro do DEP vão atuar nas ruas. Mas a Cootravipa tinha 227 funcionários fazendo o serviço e o DEP tem 34 – sem ferramentas, já que o material era fornecido pela terceirizada.
Há 43 bombas de sucção de água com problemas na cidade, que fazem as casas de bombas funcionarem a 50% da capacidade. A prefeitura aposta em parcerias público-privadas para sua melhoria. Está previsto um investimento privado de R$ 2,295 milhões na casa de bombas 9, do bairro Sarandi. Anunciada em janeiro, a obra é uma contrapartida à ampliação da fábrica da Coca-Cola Femsa e deveria ter começado em março, mas o termo de cooperação com a empresa ainda não foi assinado – as negociações seguem em andamento.
Investimentos de R$ 237 mi não foram liberados para ações
Um exemplo da lentidão do poder público é o DrenaPOA, um conjunto de projetos contra alagamentos anunciado há quase dois anos pelo então prefeito José Fortunati. Chamada de "maior projeto de drenagem da história", a iniciativa previa investimentos de R$ 237 milhões, com início em março do ano passado. Mas não saiu do papel, em um exemplo do emaranhado burocrático que envolve Ministério das Cidades, Caixa Econômica Federal e DEP.
1) Macrodrenagem do Arroio Areia
R$ 107,2 milhões
O que é: implantação de sete bacias de detenção e condutos de macrodrenagem, além de reforma na casa de bombas Silvio Brum
Bairros beneficiados: Boa Vista, Chácara das Pedras, Cristo Redentor, Higienópolis, Jardim São Pedro, Passo D'Areia, Santa Maria Goretti, São João, Três Figueiras, Vila Ipiranga, Bom Jesus e Vila Jardim
Situação: aguarda liberação pelo Ministério das Cidades
2) Macrodrenagem no Arroio Moinho
R$ 40,7 milhões
O que é: implantação de duas bacias de detenção de cheias e construção de novas tubulações e galerias pluviais, que alcançarão 4.827 metros de extensão
Bairros beneficiados: Vila João Pessoa e São José – onde, na sexta-feira, uma mulher desapareceu ao ter a casa atingida por uma enxurrada e ser levada pelas águas do arroio
Situação: em análise pela Caixa Econômica Federal. Se autorizada, a licitação precisa ter verba liberada pelo Ministério das Cidades
3) Casas de bombas
R$ 86,9 milhões
O que é: reforma e ampliação de sete casas de bombas que datam de 1970 – entre elas, a Vila Farrapos, que beneficia uma das regiões mais castigadas por alagamentos na Capital
Bairros beneficiados: diversos
Situação: em análise pela Caixa Econômica Federal. Se autorizada, a licitação precisa ter verba liberada pelo Ministério das Cidades