Correção: o endereço do consulado norte-americano é Av. Assis Brasil, 1.889, e não 4.320. A informação incorreta permaneceu publicada entre 7h4min e 9h7min desta quinta-feira (8).
Prestes a iniciar o atendimento ao público em geral, nesta quinta-feira, o Consulado dos Estados Unidos, na Avenida Assis Brasil, em Porto Alegre, já motiva viagens. De olho nas oportunidades criadas pela emissão de vistos, comerciantes da região foram a outros Estados para ver de perto o funcionamento dos consulados norte-americanos e identificar possíveis maneiras de lucrar com a chegada do novo vizinho.
Proprietário de quatro estacionamentos na Rua Andaraí, atrás do consulado, o empresário Tiago Guerrieri, 39 anos, foi um dos que não perderam tempo. Ao saber, pela imprensa, que o departamento do Tio Sam se instalaria nas proximidades, tratou de ampliar seu negócio. Em 2015, abriu o quarto ponto com vagas para veículos na mesma rua onde possui outros três e atua há mais de 15 anos.
– Está tudo tão ruim que cair um negócio desses próximo do teu comércio gera uma expectativa enorme. Todo mundo está ajustando alguma coisa – conta.
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Empolgado com a possibilidade de aumentar a clientela, ele foi ainda mais longe. Meses atrás, tomou um avião rumo a São Paulo para descobrir que outros nichos de mercado um consulado poderia movimentar. A empreitada o lançou em um novo ramo: em dezembro, inaugurou uma hamburgueria na Rua Bezerra de Menezes, a poucos metros do prédio. Os constantes adiamentos do começo da operação do consulado, porém, frustraram a expectativa dos primeiros meses, marcados por mesas vazias.
– Penei esperando por eles. Agora, o movimento está melhor, os funcionários gostaram. Vou fazer um cardápio em inglês também. Mas eles sabem mais ou menos o que são as coisas, apontam. Bacon, essas coisas, eles conhecem – diz.
Quase ao lado da hamburgueria de Guerrieri, Alexandre Tomasel, 44 anos, corria para dar os últimos retoques na cafeteria Garden Coffee, inaugurada na segunda-feira. O empreendimento não foi sua única aposta na chegada do consulado à região. A poucos metros do novo local, na mesma rua, ele tinha aberto outro café no ano passado.
Seu ímpeto empreendedor também passou por uma pesquisa de mercado. Em dezembro, passou dois dias no Rio de Janeiro para estudar possibilidades de negócio perto do departamento norte-americano. Hospedou-se em um hotel nas proximidades do local, e, por dois dias, monitorou a atividade na vizinhança.
– Eu ia às seis da manhã para lá, sentava em um café que tem na frente e ficava observando. Uma vez contei quantos vistos deram: 970 até as 9h30min – relata.
Do monitoramento na capital carioca saiu a ideia para o que deve ser um dos principais diferenciais de seus dois cafés: o serviço de guarda-volumes. Informado sobre restrições para o acesso ao local, que não permite a entrada com diversos tipos de objetos, incluindo relógios e aparelhos de celular, ele instalou armários com compartimentos para guardar esses equipamentos.
Para não fazer feio no atendimento, ainda providenciou cardápios bilíngues e investiu em um curso intensivo de inglês para si e para os funcionários. Acredita que as aulas, que ocorreram de janeiro a maio, foram suficientes para as primeiras abordagens:
– Agora, a gente tem alguns macetes para atender eles, tipo slowly (lentamente), que é para dizer quando eles começarem a falar, para falarem mais devagar. Mas acho que cliente vendo que a gente tem boa vontade já é um jeito de cativar – avalia.
Se os espíritos mais empreendedores andam inquietos à espera da movimentação no local, também há os indiferentes. A despeito do que indica um cavalete ostensivo anunciando um xerox em frente ao número 71 da Rua Bezerra de Menezes, Jorge Sperb Morandi, 32 anos, não traçou um plano para capturar clientes que eventualmente precisem de cópias de documentos – exigidas para alguns tipos de visto. Sócio de uma assistência técnica no primeiro andar do prédio, ele conta que a demanda para esse tipo de serviço costuma ser pequena, e está longe de ser o foco de seu estabelecimento, voltado ao conserto de computadores. Vê com bons olhos a possibilidade de movimentar os negócios, apesar da falta de estratégia.
– Escolhemos o lugar, no ano passado, pelo preço e pela localização, perto da Assis Brasil. Só temos uma copiadora, que colocamos para atrair as pessoas e divulgar o serviço de assistência. Na verdade, é bem difícil alguém aparecer aqui por causa do xerox. Agora, acho que vai ser uma consequência inevitável. Mas a impressora estragou, está no conserto – diz.
Aura de mistério e policiamento ostensivo
Vigilantes ou curiosos, multiplicam-se os olhares na altura do número 1.889 da Avenida Assis Brasil nos últimos meses. Fardados, guardas ao redor do prédio à esquina com a Rua Bezerra de Menezes monitoram, durante todo o dia, a movimentação do local: os mais ousados são repreendidos e, eventualmente, interpelados pela segurança por espicharem o olho por tempo demais ou apontarem o smartphone para o prédio.
"Cuidadosos", "desconfiados" e "misteriosos" são apenas alguns dos termos que comerciantes e moradores do entorno usam para tentar descrever o estranhamento causado pelo excesso de precaução dos norte-americanos, que começou antes mesmo de o departamento se instalar em Porto Alegre.
Ainda durante a obra, a preocupação dos americanos com a segurança ficou evidente para os vizinhos. Além de fomentar a curiosidade sobre o que estava sendo feito no local, deu margem a especulações das mais variadas.
– A gente tinha a impressão de que ia ser uma igreja. Colocaram uns tapumes até o meio da rua. Mas aí vimos que tinha muitos gringos, mexicanos, colombianos trabalhando na obra – conta o empresário Tiago Guerrieri, que mora há duas quadras do local.
– Eles são bem desconfiados. Às vezes, nem os motoristas dos caminhões entravam na obra: vinha um cara deles pegar a carga. Passavam detector de metais em tudo que chegava. Nunca tentei entrar lá e, se tentar, com certeza não vou conseguir – diz Alexandre Tomasel.
Inconteste, no entanto, são os reflexos positivos que a chegada dos vizinhos cautelosos trouxe para as vias do entorno. Isso porque, além da segurança do prédio, as visitas da Brigada Militar passaram a ser mais frequentes na percepção dos vizinhos – durante o período em que a reportagem esteve no local, uma viatura da BM permaneceu estacionada à esquina da Assis Brasil com a Bezerra de Menezes.
– Foi bom pela segurança. Era muito difícil ver uma viatura aqui. Agora é diário – avalia Jorge Morandi.