A terceira pessoa diagnosticada com leishmaniose em Porto Alegre morreu na manhã desta terça-feira, após cinco dias internada em estado grave no Hospital Nossa Senhora da Conceição. A mulher, de 81 anos, era considerada uma paciente de risco em função da idade. Outras duas mortes decorrentes da doença – provocada pelo protozoário Leishmania e transmitida pelo mosquito-palha após picar um cão infectado – já foram registradas na Capital. No início do mês, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) suspendeu a eutanásia de cães infectados após protestos de defensores dos animais.
Na ocasião da primeira morte – uma menina de um ano e sete meses morreu em setembro do ano passado –, a secretaria disse que acenou o alerta ao Ministério da Saúde (MS). Desde então, a situação em Porto Alegre já é considerada de emergência. Em fevereiro deste ano, quando foi registrada a morte de um homem de 40 anos pela doença, o secretário Erno Harzheim se reuniu com representantes da Secretaria Municipal dos Direitos Animais (Seda), da Secretaria Estadual da Saúde (SES) e do ministério para definir as estratégias de combate à doença. Após dois dias de discussões, foi definido que era preciso quebrar a cadeia de transmissão que envolve o cão, o mosquito e o humano.
Pelo menos 35 cães diagnosticados com a doença e recolhidos nos bairros onde houve os casos estão isolados em dois canis na sede da Secretaria Municipal dos Direitos Animais (Seda) em Porto Alegre. Em reunião no mês de fevereiro entre órgãos responsáveis pela vigilância epidemiológica ficou acordado que animais infectados seriam mortos por meio da eutanásia (sem sofrimento) – acordo que a Seda assinou, conforme documento ao qual ZH teve acesso.
Porém, segundo a secretária-adjunta Fabiane Tomazi Borba, a secretaria é contra a eutanásia e só assinou o documento porque foi voto vencido. Dessa forma, a própria Seda e outros órgãos acabaram se manifestando contra a medida, sugerindo tratamento aos animais doentes por meio de medicamentos que baixem a carga parasitária no organismo dos cães e os impeça de transmitir o protozoário. A Seda alega também que os testes feitos para detectar a doença são superficiais e passíveis de erro e defende novos testes em laboratórios de fora do Estado.
– Nunca fomos a favor da eutanásia de cães sem diagnóstico preciso, fomos vencidos por uma norma técnica, não significa que é nossa opinião. Além disso, outros animais podem ser portadores da doença, mesmo com o extermínio dos cachorros vamos continuar tendo mortes de pessoas – defendeu Fabiane.
Porém, o tratamento de animais não é viabilizado pelo Ministério da Saúde, que só disponibiliza tratamento para humanos, e a Secretaria Municipal da Saúde, além de não ter verba nem equipe disponível para monitorar a saúde dos cachorros doentes a cada quatro meses (que seria necessário no tratamento sugerido), diz que o tratamento não garante que o cão deixará de ser um transmissor.
– Não haverá oposição caso seja apresentada uma solução tecnicamente embasada que seja capaz de romper a cadeia de transmissão e seja sustentável sob o ponto de vista financeiro – avaliou Harzheim.
Em cerca de uma semana, a prefeitura deve analisar novamente a situação dos cães para uma tomada de decisão.
Casos registrados em uma mesma região
Apesar de o mosquito poder adquirir o protozoário picando um humano infectado, conforme explica o professor Pedro Romão, que estuda novos bioativos contra a doença em um projeto da Universidade Federal de Ciências Sociais de Porto Alegre, a Leishmania se multiplica com mais facilidade na pele dos cães. Por isso, segundo o biólogo da Coordenadoria Geral de Vigilância em Saúde da Capital, Getúlio Dornelles Souza, o cão é considerado transmissor.
Sobre os casos registrados em Porto Alegre, todos nos bairros Jardim Carvalho e Morro Santana, a Vigilância em Saúde constatou que os mosquitos adquiriram o protozoário ao picarem cães infectados, e os insetos com a doença acabaram infectando os humanos. Para o secretário, a situação precária de alguns moradores é preocupante, uma vez que o mosquito se reproduz em meio ao lixo.
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– A vulnerabilidade social é um grande fator de risco pra doenças, precisamos proteger as pessoas mais vulneráveis. Estamos extremamente preocupados – revelou o secretário Harzheim.
Ações da Secretaria Municipal de Saúde:
- Armadilhas estão sendo colocadas em locais suspeitos para monitorar a existência de insetos;
- Inseticidas são aplicados em áreas de risco, tanto nos domicílios quanto na área silvestre.
- Limpeza do lixo acumulado em áreas urbanas. Pelo menos 30 toneladas de lixo foram recolhidas no bairro Jardim Carvalho, onde foram recolhidos os cães infectados.
- Profissionais de saúde foram capacitados para identificar a doença e acelerar o atendimento.
O que pode ser feito para evitar:
- Evitar o acúmulo de lixo, principalmente de materiais orgânicos ou de restos de vegetação. Segundo o professor Pedro Romão, da Universidade Federal de Ciências Sociais de Porto Alegre, o inseto vetor da leishmaniose gosta de se proliferar em ambientes úmidos e escuros. Diferente do mosquito transmissor da dengue, não precisa de água para sobreviver. Em caso de lixo na rua, os moradores podem solicitar, pelo 156, que a Secretaria de Serviços Urbanos recolha os materiais.
- Em caso de suspeita de cães infectados, os moradores podem ligar para a Vigilância em Saúde no telefone: 3289-2400
Vetor e transmissão
O inseto transmissor da leishmaniose tem tamanho inferior ao mosquito doméstico. Mede cerca de 3mm e é popularmente conhecido como mosquito-palha. Ele se procria em áreas silvestres – hoje próximas à área urbana. A doença não é transmitida pelo contato, apenas pela picada do mosquito.
Sintomas da doença em humanos:
Perda de força, perda de apetite, emagrecimento, febre, dores abdominais. Se apresentar os sintomas, a pessoa deve procurar uma unidade de saúde o mais rápido possível. O tratamento é feito no hospital com medicamentos disponibilizados pelo governo federal.
Sintomas da doença em cães:
Crescimento das unhas, feridas na pele, aparência apática, perda de peso e vômito. Se o cão apresentar os sintomas, ele deve ser levado em um veterinário.