Principal suspeita de ter provocado alterações no cheiro e no sabor da água tratada de Porto Alegre no ano passado, a empresa Cettraliq informou ter concluído a retirada dos resíduos de sua planta, na zona norte da Capital, nesta semana. O esvaziamento dos tanque e da lagoa onde eram armazenados os efluentes tratados no local foi determinado pela Justiça em outubro, mas teve o prazo modificado a pedido da companhia, que iniciou os trabalhos apenas em 16 de novembro.
Segundo a Cettraliq, o material removido do local – 2,6 mil metros cúbicos de efluentes – foi encaminhado para uma companhia de Santa Catarina para receber o tratamento adequado. Em nota, a empresa disse que "um relatório final está sendo finalizado e será apresentado ao Juízo competente após o recesso" e que, após a retirada dos efluentes, "a equipe segue os trabalhos de limpeza de equipamentos e instalações".
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Em visita às imediações da central de tratamento de efluentes, que teve as atividades suspensas pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) em agosto, a reportagem de ZH constatou que o odor percebido no local, semelhante ao identificado na água tratada por mais de três meses, voltou a se intensificar. Para o pesquisador da Feevale que trabalha com análise microbiológica da água, Fernando Spilki, a volta do mau cheiro no entorno da planta pode ser proveniente de resíduos que tenham aderido aos tanques – e que, agora, sem água para diluição, exalam odores.
– Compostos que dão esse nível de cheiro podem ficar aderidos à borda do tanque. Se forem solventes, será complicado de limpar. Tem de aguardar para ver como vai ficar depois que estiver limpo e seco – analisa.
A companhia, que se considera injustiçada pelo órgão ambiental estadual, segue afirmando que a persistência do mau cheiro após o esvaziamento indica que "a causa do problema não é a empresa nem a atividade que desenvolvia". No entendimento do Ministério Público (MP) e da prefeitura, porém, o fato de a água ter voltado ao normal dias após a paralisação das atividades da planta indica uma relação direta entre a Cettraliq e as alterações que imprimiram cheiro e gosto de mofo no líquido tratado pelo Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae).
Também reiterou, por meio de nota, que operava "dentro dos parâmetros e determinações de sua Licença de Operação (LO) e que não foram utilizados ou detectados solventes ou outras substâncias não permitidas nos efluentes armazenados em sua planta", uma vez que licença junto à Fepam apresenta restrição para o recebimento e o tratamento de efluentes que contenham solventes.
Conforme a promotora de justiça e defesa do meio ambiente Ana Marchesan, que abriu inquérito para investigar as ações do poder público em relação às alterações na água, a retirada dos resíduos, feita aos poucos, foi acompanhada pelo Ministério Público em pelo menos três oportunidades. Após a entrega da documentação da Cettraliq à Justiça – que inclui relatório de processo e comprovantes de transporte dos resíduos –, uma vistoria deve ser feita na empresa para verificar se a operação atendeu ao que foi solicitado. Mesmo se tudo estiver correto, atividades da Cettraliq devem seguir suspensas.
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Procurado pela reportagem para comentar a retirada dos efluentes da Cettraliq, o Dmae informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não deve se manifestar até que receba o relatório da empresa – o que não deve ocorrer antes do fim do recesso do sistema judiciário, que segue até 9 de janeiro. Na ação civil pública ajuizada pelo órgão em parceria com o MP, que motivou a retirada dos resíduos da Cettraliq, o Dmae pede, ainda, que a empresa reembolse a prefeitura em mais de R$ 4 milhões pelos gastos extras com o tratamento de água no período das alterações. O processo ainda corre na Justiça.
A central de tratamento de efluentes, suspeita por alterar a água na Capital, está fora de atividade desde agosto, quando teve as atividades suspensas pela Fepam por emissão de odores acima no estabelecido na licença de operação. Posteriormente, a Cettraliq foi interditada preventivamente pela prefeitura por oferecer risco "à população e ao ambiente" e, em setembro, o órgão ambiental estadual disse que a empresa não voltará a abrir na zona norte de Porto Alegre.