É possível que você já tenha recorrido a um deles para descansar ou prosear sobre o tempo sem nem desconfiar que estava sobre um pedaço da história de Porto Alegre. Caracterizados por contornos delicados e ricos em detalhes, muitos dos bancos de concreto armado do antigo Araújo Vianna estão espalhados pela cidade, como pequenas ruínas do auditório que teve memoráveis concertos a céu aberto junto à Praça da Matriz entre as décadas de 1920 e 1950.
Quando a concha acústica foi demolida para a construção da sede da Assembleia Legislativa, os bancos foram reaproveitados em outros pontos – a prefeitura cita como exemplo a Redenção, parque onde foi construído o novo auditório. O ZH Pelas Ruas encontrou peças idênticas do mobiliário também na Praça Júlio de Castilhos e nos Jardins do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), no bairro Moinhos de Vento, em clube e em igreja do Teresópolis, na Zona Sul, e também na Praça Otávio Rocha, no Centro.
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– Eu não sei de onde veio, nem quem fez ele. Mas dá pra ver que o formato é desenhado, que é diferente dos outros bancos de praça – disse o auxiliar fiscal Alex Júnior Silveira Alvarez, 17 anos, enquanto descansava na Otávio Rocha.
Os mais de 400 bancos do primeiro Araújo foram feitos em uma fábrica de artefatos de cimento nos fundos da casa do engenheiro Armando Boni (morto em 1946, com 59 anos), na Rua Marquês do Pombal. O italiano taciturno que chegou ao Brasil na década de 1910 desenhou e fabricou as peças, finalizadas a mão, e também foi responsável por projetar o auditório.
Como a prefeitura de Porto Alegre não dispõe de levantamento de localização desses bancos e Boni provavelmente usou as mesmas formas para outras encomendas, até mesmo para outras cidades, não é possível afirmar com convicção quais deles testemunharam as apresentações no auditório. Mas o filho do fabricante, o engenheiro aposentado Benito Boni, 92 anos, acredita que os que estão espalhados pela Capital, provavelmente, fizeram parte dessa história.
– Quando a gente se senta naquele banco, lembra coisas antigas – relata o aposentado, que assistia aos concertos da Banda Municipal nos bancos "normalmente cheios de gente".
Em 2009, a professora de Artes Jéssica Couto, 31 anos, rastreou e registrou cerca de 80 bancos para seu projeto de conclusão do curso de Fotografia na UFRGS – como foi divulgado por Zero Hora em reportagem do caderno Cultura no mesmo ano. Embora não se dedique mais com tanta intensidade, ela ainda não abandonou a pesquisa, e sonha em um dia publicá-la em livro.
– Para uns, são só bancos velhos, mas para mim sempre foram muito representativos pelo seu contexto, pela importância histórica, artística e afetiva para a cidade – diz Jéssica, acrescentando que os bancos comprados nas últimas décadas têm valor estético atrelado ao menor preço apresentado em licitação.
De acordo com informações do departamento de Patrimônio Histórico e Cultural da prefeitura, os bancos não têm nenhum tipo proteção individual (não são tombados), e a Secretaria de Meio Ambiente, responsável por parques e praças, afirma que não há nenhuma ação de resgate histórico em andamento.