O direito de opinar é fundamental em uma democracia, assim como em qualquer forma de convívio na qual a verdade não seja imposta pelo mais forte. A liberdade para opinar é sempre ameaçada em laços totalitários, quando não se quer saber de nada que esteja em desacordo com o discurso oficial. Uma opinião é fato subjetivado: com ela, alguém se posiciona em relação a algo, colore um dado com as tintas de sua experiência.
Tenho a impressão, porém, de que andamos um pouco levianos com nosso direito de opinar. O "eu acho" vem ocupando lugares onde não é chamado, e até mesmo onde não faz nenhum sentido. É cada vez mais frequente seu uso para desconsiderar a fala do outro, mesmo quando este é mais qualificado para opinar sobre uma questão, elevando-nos a soberanos da razão pelo simples fato de que a opinião é nossa. Isso quando não é usada para negar fatos, como se a opinião se sobrepusesse, em valor, a evidências e consensos. Como chegamos a esse uso quase delirante da opinião?
Um elemento é o individualismo do nosso laço social, que não apenas naturaliza, mas promove o egoísmo. O que importa é o que queremos e quando queremos; a publicidade nos vende essa ilusão, assim como livros de autoajuda e a ideia do "querer é poder". Essa inflação do nosso tamanho é o avesso do sentimento de impotência que secretamente carregamos, pequenos diante de um mundo do qual temos de dar conta – sozinhos. Assim, opinar é uma forma de tentar se engrandecer, de fazer jus a esse tamanho que acabamos acreditando ter.
O mundo, de fato, tornou-se mais complexo – ou, ao menos, temos mais notícias dessa complexidade. Os meios de comunicação e, sobretudo, a internet, nos apresentaram a dados, elementos, discursos e questões em que antes não pensávamos. Há uma constante tensão entre diferentes leituras dos fatos e do mundo, e isso convoca a uma tomada de posição. Opinar é, nesse sentido, marcar um lugar no mundo, já que não contamos com lugares prestabelecidos e perenes, mas sim móveis e cambiantes.
A internet também reforçou esse empuxo a opinar ao permitir que qualquer um publique o que pensa em condição de igualdade. Se por um lado isso possibilitou que outras vozes fossem escutadas, produzindo fissuras nos discursos hegemônicos, por outro tirou do âmbito da intimidade opiniões antes consideradas inaptas a serem veiculadas. Umberto Eco denunciou isso ao dizer que as redes sociais deram voz a uma legião de imbecis, por dar legitimidade a opiniões no mínimo questionáveis.
A liberdade de opinar pode facilmente se transformar em uma opressora obrigação, se nos sentimos coagidos a nos posicionar o tempo todo. Opinar, no entanto, não pode ser um exercício banal de voluntarismo, pois formar opinião implica escuta, leitura, diálogo, conflito – e isso requer tempo e esforço. Nossa época imediatista não nos dá esse tempo de bandeja: é preciso um esforço para cavá-lo e não se deixar tomar pela urgência de opinar. Não emitir uma opinião não é necessariamente sinal de ignorância, isenção ou anulação; talvez seja justamente essa uma tomada de posição que, em muitas ocasiões, estejamos precisando reaprender.
Paulo Gleich escreve mensalmente para o Caderno DOC.