Todos os dias ao acordar, o aposentado George Karpoousa veste o mesmo tipo de traje social que costumava usar quando trabalhava no ramo da metalurgia. Caminha até a mesma confeitaria que frequentava na Avenida Assis Brasil, para uma xícara de café preto. No trajeto, passa em frente à Praça das Flores, na rua Panamericana, bairro Jardim Lindoia, e revisa as 70 mudas que plantou.
- É para ver se nenhum desocupado colocou abaixo - explica o agricultor urbano.
Desde que encerrou os trabalhos na empresa que chefiava há mais de 50 anos, decidiu que encher o mundo de verde seria seu novo afazer. Foi uma saída para evitar a falta de ocupação e manter-se ativo. Lembrou do recado enviado pelo ex-presidente Getúlio Vargas, quando, aos 26 anos, deixou Atenas, na Grécia, e atravessou o oceano para "construir um Brasil melhor". Na época, veio atraído pela oportunidade de trabalho que apareceu logo depois que deixou o Exército. Ficou porque achou o "povo muito bom e viu que o Brasil tinha futuro, por causa da riqueza dos minérios e da agricultura".
- Depois da Segunda Guerra, o governo mandou trazer técnicos para fazer crescer o Brasil. Fiquei um tempo trabalhando no Rio de Janeiro, mas não me adaptei ao calor. Na Grécia tinha neve. Então vim para o Sul, abri uma metalurgia e "importei" uma grega para formar família - diz o pai de quatro filhos e avô de cinco netos.
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Com quase todos os descendentes formados (menos o caçula, que ainda está no colégio), sente que cumpriu a missão de educador. Como empresário, construiu três edifícios na Capital, todos na avenida Assis Brasil e batizados em homenagem à terra natal - Chipre, Kozani e Troia. Como cidadão do mundo, o sentimento é de que ainda tem muito a contribuir. Para começar, escolheu o viés ambiental. Comprou dezenas de mudas, providenciou cabos de vassouras e decidiu repaginar o cenário do bairro.
- Sempre gostei de plantas. Meu pai mexia com isso. Algumas eu trouxe da Grécia, como o figo, que é minha preferida. Outras comprei. Plantei tudo, vai ficar repleto de frutas e pássaros em volta - afirma o aposentado, feliz com a perspectiva de crescimento da vegetação.
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Morador do mesmo prédio de Karpoousa, Luiz Fernando Luz vê o ritual se repetir religiosamente dia após dia, para a sorte da vizinhança. Diz que, "cuidadoso, ele repõe caso alguém derrube alguma muda, faz um serviço que deveria ser das autoridades".
- Para ele é uma terapia, para nós, um presente, uma maravilha - diz o vizinho observador.
A praça, que até então era habitada por ipês, eucaliptos e coqueiros, foi povoada pelas cores e aromas de laranjeiras, goiabeiras, pitangueiras. Quando crescerem, as mudas poderão deixar o lugar mais colorido e frutífero. Até lá, a atitude causa controvérsia.
Plantar deliberadamente nos parques e praças da cidade não é autorizado pela lei municipal. Segundo o supervisor de parques, praças e jardins na Smam, Léo Antônio Bulling, a Secretaria do Meio Ambiente entende que todo plantio ou renovação de vegetação deve passar por planejamento porque as praças têm zonas de sombreamento e insolação, necessários nestes espaços.
- Por isso entendemos que o interessado em qualquer plantio deve conversar conosco para orientarmos como fazer e quais devem ser as espécies. Não somos contra, mas fazer isso sem orientação pode dificultar mais do que auxiliar.
Ciente da posição da prefeitura, o jardineiro grego planta convicto de que sua atitude é mais uma daquelas para melhorar o país que adotou como sua casa. Está fazendo sua parte, ainda que saiba que falta muito por arrumar.