No Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) do Cais Mauá, a análise das maiores cheias do Guaíba mostram que os fenômenos ocorreram após 15 a 40 dias, em média, de chuvas com acúmulos entre 150 milímetros e 400 milímetros, normalmente ocorridas entre agosto e outubro. Depois de 1941, em 1967 houve outro evento traumático, ainda que não tão desastroso. Por causa dessa repetição é que se resolveu construir o Muro da Mauá, completado em 1970. O tempo passou e hoje a proteção está deteriorada.
Foto: Marcelo Oliveira
O resumo da situação atual é que o muro pode falhar quando acontecer essa inundação prevista para algum dia perdido em qualquer dos 2 mil anos que temos pela frente. Por quê, então, não derrubá-lo? Apesar de ser uma possibilidade remota, não existe, hoje, uma alternativa que dê mais tranquilidade ao poder público para tomar essa atitude.
O professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) Joel Goldenfum afirma que o muro não é inútil porque cumpre um papel como parte de um extenso e complexo sistema - são 68 quilômetros de diques, 14 comportas e 19 casas de bombas para evitar que as cheias do Guaíba alcancem a cidade. Derrubá-lo seria acabar com a serventia de todo o sistema.
Há alternativas mais avançadas à estrutura atual, lembra Goldenfum, como alguns sistemas de contenção de cheias utilizados na Holanda. O custo, porém, é altíssimo, ressalta. Uma ideia que brotou em Porto Alegre foi a de construir uma ciclovia com placas móveis de concreto, que se fechariam no caso de uma enchente, funcionando como muro. No entanto, a operação e manutenção desse dispositivo seria, também, cara demais. Assim, em Porto Alegre, é preciso optar por sistemas que exijam o mínimo de manutenção e operação.
- O evento de 1941 foi extraordinário, talvez nunca mais ocorra. O muro é feio e as pessoas associam a um componente ideológico porque foi construído na época do regime militar. Mas sou contra a retirada do muro se não for substituído por outro sistema que forneça no mínimo o mesmo grau de segurança. O que acontece em Porto Alegre é que não há como garantir o correto funcionamento de sistemas que exigem operação e manutenção frequentes das estruturas. É mais adequado, então, implementar a manutenção do muro existente e treinar o pessoal do que trocar o sistema - analisa Goldenfum.
Muros costumam ser repudiados. Em Berlim, talvez o mais odiado de todos foi abaixo em 1989, depois de 28 anos de separação entre os lados Oriental e Ocidental da Alemanha. Em Porto Alegre, o Muro da Mauá afasta a cidade do Guaíba há 45 anos. E, apesar de todo o desprezo por parte da população, da dúvida que as minúsculas probabilidades de repetição de grandes cheias levantam e do estado ruim de conservação (a ponto de haver o risco de não conseguir deter uma inundação), por enquanto, sua retirada não tem apoio no poder público.
- Em alguns lugares do mundo, com o tempo, esse tipo de muro foi retirado. Mas aqui, no Rio Grande do Sul, como ele tem um sentido de proteção, será mantido e restaurado. Claro que, para incorporarmos ao projeto arquitetônico, faremos uma humanização. Vamos colocar muro verde, cortina d'água para não ficar uma coisa muito feia, fora do contexto - destacou Júlia Costa, presidente da empresa Cais Mauá do Brasil S.A., que revitalizará o local.
Durante a entrega do EIA-Rima do Cais Mauá, em 1º de julho, um dos assuntos de que se falava era justamente o muro. A previsão é de que uma cortina d'água passe a embelezar cerca de 50 metros da estrutura. Mais bonito ainda seria não ter um muro entre a cidade e o Guaíba, concordaram representantes do governo municipal e da empresa. Mas ninguém quer assumir a responsabilidade pelos efeitos da imponderável alta do Guaíba.