Nove obras sem conclusão e R$ 21 milhões em sobrepreço
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Um ano depois de terminada a Copa, nove das 14 obras para o Mundial ainda não terminaram em Porto Alegre. ZH analisou 4,8 mil páginas de inspeções do Tribunal de Contas mostra quadro de erros, falta de planejamento e atrasos nas obras de trânsito e mobilidade urbana.
Erros em parte dos projetos básicos elaborados pelo convênio entre a prefeitura de Porto Alegre e o Ciergs geraram aditivos e readequações a um custo de, pelo menos, R$ 9 milhões. Isso porque os orçamentos iniciais estavam subavaliados, o que pode ter ocorrido por imperícia técnica ou intencionalmente.
Como agravante, há a participação do mesmo engenheiro em projetos básicos e executivos em quatro obras - algo vetado pelo próprio convênio entre o Executivo e o Ciergs e pela Lei de Licitações. Alguns dos alertas feitos por técnicos do TCE que analisaram os projetos básicos das obras da Copa se confirmaram nos projetos executivos.
Foram assinados termos aditivos relacionados a falhas no planejamento inicial nas quatro obras em que o engenheiro Martin Alfredo Beier, da Deltacon Engenharia, aparece como autor dos projetos básico e executivo. Entre as deficiências encontradas, estão métodos construtivos incompatíveis e estudos geológicos incompletos, que elevaram os custos de materiais e pessoal previstos inicialmente.
Quando o crescimento da quantidade de materiais se soma a composições incorretas de preços e serviços usados para o orçamento, as distorções no custo final de uma obra são ainda mais gritantes. No viaduto da Bento Gonçalves, por exemplo, um aditivo acrescentou R$ 3.730.227,05 ao custo total, sendo R$ 2.617.407,7 relativos ao aumento de 50% na quantidade de um tipo de estacas. Para justificar, foram usadas as novas sondagens do projeto executivo, o que demonstra que o planejamento inicial não investigou o solo corretamente.
Algo muito parecido ocorreu no Viaduto Abdias do Nascimento, que liga a Rua Pinheiro Borda à Avenida Edvaldo Pereira Paiva. Uma mudança de cálculo na quantidade e no comprimento de estacas necessárias após nova investigação geológica culminou em um termo aditivo de R$ 2.234.927,02.
O estudo do solo também era incompleto em outros projetos realizados pelo engenheiro Martin Beier. Reportagem de ZH de 9 de abril mostrou que foram feitos apenas dois furos de sondagem na obra da trincheira da Rua Anita Garibaldi, enquanto o detalhamento executivo realizou 23. A investigação insuficiente do solo ocultou algo que não escaparia até mesmo de estudantes da área: uma enorme rocha, que aumentou o custo da obra em cerca de R$ 4 milhões.
Na passagem de nível da Avenida Ceará, um estudo geotécnico realizado na fase de projeto executivo apontou deficiências na proposta inicial. O solo, na verdade, era instável, o que poderia afetar as fundações de prédios vizinhos e do Viaduto Leonel Brizola. Resultado? Termo aditivo assinado.
Engenheiro diz que sondagens foram feitas "dentro do mínimo necessário"
O engenheiro Martin Beier é enfático ao afirmar que seus projetos básicos eram suficientes e até superiores aos apresentados normalmente para obras públicas semelhantes:
- A engenharia tem uma imponderabilidade. Não sou aventureiro na área, tenho a consciência tranquila.
Sobre ter participado de projetos básicos e executivos (na verdade, os projetos executivos foram assinados pelo filho, Marcos Beier, que tem outra empresa no mesmo endereço da Deltacon), ele diz que "é algo que sempre dá encrenca na nossa área (engenharia)". Os trabalhos para as cinco obras foram feitos durante seis meses, segundo Beier, que não considera os estudos geológicos insuficientes.
- Algumas não tinham tempo hábil para mais sondagens. As sondagens foram feitas dentro do padrão do menor custo, do mínimo necessário - explica.
Após solicitação do TCE, uma câmara especializada do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-RS) vai analisar a atuação de Beier, que já apresentou defesa, baseada no conceito de direito autoral dos projetos, em que a mudança de projetista na fase de execução poderia "mudar o DNA da obra". Para ele, o problema nas obras da Copa na Capital são de gestão, mas que "acabam estourando no elo mais fraco, que é o projetista". Perguntado se teria sido responsável por algum aditivo irregular, ele preferiu se eximir e apontar para as empresas responsáveis por tocar as obras:
- Se tu me perguntares por aditivos, tem coisas exageradas, mas por causa das construtoras. Eles são comerciantes e, se a porteira está aberta, tocam ficha.
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