Presidente da Câmara de Vereadores de Porto Alegre no primeiro ano da atual legislatura, Nádia Gerhard (PL) assume o posto com o desafio de fazer avançar temas polêmicos, como o novo Plano Diretor e a concessão do Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae).
Aos 56 anos, a tenente-coronel da Brigada Militar é conhecida pelo estilo combativo de fazer política e promete uma gestão equilibrada, com obediência ao regulamento e respeito à liberdade de atuação de todos os vereadores.
Confira a entrevista concedida a ZH.
Quais temas são prioritários para a senhora na presidência da Câmara?
Fazer a coisa andar. Fico apavorada quando o problema é guardado na gaveta. Sempre pedi isso aos vereadores e aqui não vai ficar problema guardado. Tudo que tivermos de coisas para serem resolvidas, nós vamos debater.
A ideia é aumentar a produção legislativa?
Não é aumentar a produção, é qualificar o tempo. O tempo da Câmara tem de ser o tempo da rua. Hoje o morador de Porto Alegre quer resolutividade. Podemos ter o melhor prefeito do mundo, mas se a Câmara for um órgão que vai atrapalhar, não vai ter entrega. Então, o meu maior desafio é liderar líderes.
Temos 34 líderes aqui, todos têm uma representatividade que tem de ser respeitada, mas a eficiência da Câmara não pode ser prejudicada por qualquer tipo de politicagem.
A senhora pretende evitar projetos polêmicos e que não resolvem problemas da cidade, como o Dia do Patriota, em alusão aos ataques do 8 de Janeiro, aprovado e depois revogado?
Não tem como evitar. É legítimo que qualquer vereador coloque qualquer projeto, por mais absurdo que a gente ache. O presidente da Câmara não tem esse poder e nenhum outro vereador vai dizer: “Olha, teu projeto é uma porcaria, não vai servir para nada”. O que podemos fazer é agilizar para que não se perca cinco, seis sessões debatendo um projeto desses. Se conseguirei fazer, não sei. A função primordial do vereador não é fazer lei, que já tem demais, mas é fiscalizar, é estar na rua, com o cidadão.
Como fazer isso?
Com a Câmara itinerante. Vou propor à Mesa Diretora que possamos, pelo menos uma vez por mês, fazer sessões nas regiões do Orçamento Participativo, para possibilitar às pessoas conhecer o que é uma Câmara de Vereadores, participar com vaia, com aplauso, entender o meandro do rito parlamentar.
Uma das críticas que alguns setores fazem à Câmara é justamente a restrição de acesso em votações polêmicas. Como pretende proceder?
Como sempre se faz: pela capacidade de pessoas. O plenário Otávio Rocha tem 228 lugares. Não posso permitir que entrem 229 pessoas. O que se faz quando se tem projetos polêmicos é dividir o plenário, 114 lugares para cada grupo, favorável e contrário, separados um do outro.
A previsão é de ao menos dois projetos bem polêmicos em 2025, a concessão do Dmae e o novo Plano Diretor. Há tempo e ambiente para essas votações?
Está até passado o tempo do Plano Diretor. Estamos atrasados 10 anos. Ele é a matriz de como a cidade vai se expandir ou não. Falam que o Plano Diretor é adensamento, isso é o mínimo. Ele prevê habitação, empreendimento, oportunidade de emprego. Se temos problema de mobilidade, vamos facilitar também. Esse desordenamento que a cidade vive é por falta do Plano Diretor. Como imaginamos a cidade daqui a cinco, 10, 20 anos? Não vejo mais como esperar.
E a concessão do Dmae?
Sou favorável. É uma parceirização, diferente do que fizeram na CEEE, que foi vendida e hoje está administrando mal a nossa luz. O medo das pessoas é que, com a concessão, o preço da água vá aumentar, e hoje a água de Porto Alegre é das mais baratas do país, mais barata do que a da Corsan. O governo quer manter o mesmo preço com qualidade. As pessoas vivem com esgoto a céu aberto. O mínimo que se espera de dignidade é saneamento e água potável.
Cerca de 300 cidades no mundo reestatizaram o serviço de água em função de preço alto, falhas e pouca transparência. Como garantir que vai melhorar?
O poder público é paquidérmico, se move muito lentamente. E será uma concessão, não é privatização. A prefeitura entrega, se não cumprir as regras, ela retoma. É quase um empréstimo.
Porto Alegre agora alaga e fica sem luz com qualquer chuva de verão. Como a Câmara pode ajudar a solucionar esses problemas?
Já estamos conversando. O vereador Ramiro Rosário (Novo) está retomando uma frente parlamentar para fazer essa discussão, e o prefeito (Sebastião Melo) se colocou à disposição, inclusive colocando os seus secretários para que a gente saiba a pequeno, médio, longo prazo o que está sendo feito e de que forma podemos facilitar. Uma das coisas que precisamos é ter as informações, porque as comunidades que a gente representa querem saber o que está sendo feito.
A vereadora Juliana Souza (PT) pretende criar uma frente parlamentar e uma comissão da verdade para investigar crimes da ditadura em Porto Alegre. Como a senhora vê a iniciativa?
Todo vereador tem a legitimidade de propor a frente parlamentar que quiser, o projeto que quiser. A discussão vai ser interessante e se tiver votos suficientes vai passar. Espero que não seja uma discussão de 10 sessões, cinco sessões, porque efetivamente não vai mudar em nada a vida das pessoas ali na rua.
A senhora é conhecida pelo estilo abrasivo de fazer política, é muito combativa. Como atuar de forma isenta no comando do plenário?
O pessoal está com medo disso, né? Jesus! Tenho posicionamento forte. Nunca vão me ver titubeante. Se me virem abraçada no PT é porque é briga. A coisa mais chata do mundo é não saber para onde o teu vereador vai. Com a comandante não tem isso. O político isentão só atrapalha aquilo que tem de andar.
Mas, como presidente, a senhora precisa atuar como magistrada, não?
Mas aí não é isentona, é com o regimento na mão. Todos os vereadores, sejam do PL, meu partido, seja do PSOL, meus adversários, terão o mesmo tratamento da presidente. Vou jogar nas quatro linhas, vou jogar dentro do que está especificado.
Uma das vereadoras do PT me perguntou como vou agir. Eu disse que, como presidente, serei facilitadora, não posso ser a tranca-rua. O que não estiver regrado, vamos decidir na mesa diretora ou no plenário, democraticamente.
Dois partidos de oposição, PT e PSOL, têm as maiores bancadas da casa. É justo serem retirados do rodízio da presidência?
Democracia é o que a maioria decide. E se a maioria dos vereadores, são 23, decidiu que eles não estarão na presidência, é justo.
A senhora está na terceira legislatura seguida, mas sempre concorreu nas eleições de meio de mandato, primeiro a deputada estadual e depois desistiu no meio de uma campanha ao Senado. Tem planos para a eleição de 2026?
Não me atropela. Tenho uma fila aqui para atender em 2025. Quero focar na presidência da Câmara, resolver questões de segurança. A Casa é vulnerável, qualquer um entra aqui. Quero fazer também uma simulação de sinistro. O prédio é velho, podemos ter um curto-circuito, um incêndio. 2026 deixa rolar. Tenho desejo de ser deputada estadual, mas depende do eleitorado, do partido, de tanta coisa.
Em oito anos de vida pública, a senhora passou por quatro partidos. Mudaram os partidos ou mudou a senhora?
Comecei a entender o que são os partidos. Primeiro, fiz parte do MDB, convidada por amigos. Fiquei dois anos como vereadora e, em 2018, me tornei suplente de deputada estadual. Queria assumir em algumas votações envolvendo a Brigada Militar e não me deixaram. Percebi que estava no lugar errado. Me encontrei no DEM, mas houve a fusão que criou o União Brasil e tive que procurar outra casa. Fui para o PP, um partido de direita, mas eles entraram no governo Lula e eu acabei saindo. Estou confortável no PL.
Em janeiro do ano que vem, que legado a senhora espera deixar dessa passagem pela presidência?
O legado de primeira mulher brigadiana, de direita, fardada, sendo representada na vereança. Acho que isso já é um legado. Dizem que milico tem que estar no quartel, mas desde que não seja eleito. Eu fui eleita.
Quero que a Câmara de Vereadores dê o seu melhor sem olhar a quem. Não podemos tratar individualidades, mas sim o coletivo. Temos de ter a responsabilidade de tratar a cidade como um todo e para que ela cresça. Quero tornar Porto Alegre um lugar melhor.