O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, determinou a abertura de um inquérito para investigar se o ex-juiz da Lava-Jato e senador Sergio Moro (União-PR) cometeu abusos no acordo de colaboração premiada do ex-deputado estadual do Paraná e empresário Antônio Celso Garcia, mais conhecido como Tony Garcia. Garcia alega ter sido ameaçado e coagido para fechar a delação e afirma que passou a trabalhar como um "agente infiltrado" de Moro em investigações ilegais de autoridades com foro privilegiado na década de 2000.
A abertura da investigação foi autorizada em um despacho sigiloso no dia 19 de dezembro. A decisão ocorreu após a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Polícia Federal (PF) protocolarem pareceres defendendo a abertura de um inquérito. A informação foi revelada com exclusividade pela repórter Daniela Lima, da GloboNews. Moro nega irregularidades no acordo de delação.
"Mostra-se necessária a instauração de inquérito neste Supremo Tribunal Federal para investigação sobre os fatos narrados, nos exatos termos em que pleiteados, na medida em que demonstrada a plausibilidade da investigação de condutas, em tese, tipificadas como crime", escreveu Toffoli no despacho de dezembro.
Os supostos abusos praticados por Moro teriam acontecido no começo dos anos 2000. Na época, Garcia foi acusado de fazer parte de um esquema de fraude do Consórcio Garibaldi, que deixou 4 mil clientes lesados. Em dezembro de 2004, o ex-deputado fez um acordo de colaboração premiada homologado por Moro.
Além de informações referentes ao Consórcio Garibaldi, o acordo de colaboração também envolveria supostas compras de liminares e beneficiamento indevido em processos que, supostamente, eram feitos por magistrados que possuíam foro privilegiado.
Delator deveria colher provas
De acordo com o acordo de delação, o ex-deputado deveria então colher provas em casos em que estariam envolvidos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), além de um corregedor da Polícia Federal (PF), um juiz eleitoral, um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Paraná e um presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). A petição enviada ao STF destaca que esses inquéritos não tinham relação com o Consórcio Garibaldi.
Garcia também acusou Moro de ter agido como "juiz, acusador e vítima" no caso de uma escuta telefônica que teria sido instalada por um advogado no telefone de Moro. O defensor em questão era Roberto Bertholdo, que atuava em favor do empresário. De acordo com a delação, o ex-deputado recebeu Bertholdo de madrugada em casa, onde foi informado que Moro o condenaria à prisão, de acordo com uma gravação ilegal. O ex-deputado revelou o suposto grampo.
Para esta ocasião, assim como para outras, o delator tinha autorização para que usasse grampos telefônicos para obter as provas. "O beneficiário poderá testemunhar, fornecer as provas documentais, inclusive com escutas externas", diz o acordo de delação de 2004.
"Tony Garcia foi o laboratório daquilo que o então Juiz Sérgio Moro posteriormente colocou em prática na Lava-Jato", diz a petição da defesa do empresário que foi apresentada ao Supremo.
O que diz Moro?
Em nota, o senador afirmou que a sua defesa não teve acesso aos autos do inquérito e que não houve "qualquer irregularidade" no acordo de delação premiada com o ex-deputado estadual. O ex-juiz da Lava-Jato se referiu às informações dadas por Garcia ao STF como "fantasioso relato".
"O senador informa que sua defesa não teve acesso aos autos e reafirma que não houve qualquer irregularidade no processo de quase vinte anos atrás. Nega, ademais, os fatos afirmados no fantasioso relato do criminoso Tony Garcia, a começar por sua afirmação de que 'não cometeu crimes no Consórcio Garibaldi'", diz a nota de Moro.