A Polícia Federal (PF) transferiu a investigação sobre possíveis desvios em contratos de kits robóticos para o Supremo Tribunal Federal (STF) após encontrar documentos com referências ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e uma lista de pagamentos ligados ao nome "Arthur". O documento foi apreendido com Luciano Cavalcante, assistente direto do presidente da Câmara, e lista um total de R$ 834 mil em pagamentos feitos de dezembro de 2022 a março de 2023.
Dentre esse valor total, pelo menos R$ 650 mil estão relacionados ao nome "Arthur". O documento apresenta datas, valores, destinatários dos pagamentos e os nomes aos quais as despesas estão associadas. Há pelo menos 30 pagamentos com referência a "Arthur".
A investigação sobre os desvios em contratos de kits robóticos acontece no âmbito da Operação Hefesto, iniciada sob a supervisão da 2ª Vara Federal de Alagoas para apurar um esquema de fraudes em licitações de 43 municípios no Estado com verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O prejuízo estimado até o momento é de R$ 8,1 milhões, mas os investigadores avaliam que o rombo nos cofres públicos pode ser maior. Outra lista com pagamentos ligados ao nome "Arthur" também foi encontrada pela PF, revelada pela revista Piauí e confirmada pelo jornal A Folha de São Paulo.
Com a remessa, o STF deve decidir de quem é a competência para conduzir e eventualmente julgar o caso. Uma investigação sobe ao Supremo Tribunal Federal quando há suspeita de envolvimento de autoridades com prerrogativa de foro.
Os autos foram encaminhados após a análise das primeiras provas apreendidas na primeira fase ostensiva da investigação, a Operação Hefesto, batizada em referência ao deus grego da tecnologia e da metalurgia. Naquela etapa da investigação, A PF fez buscas em 27 endereços ligados aos investigados, entre eles o assessor Luciano Cavalcante, auxiliar de Arthur Lira que estava lotado na liderança do PP da Câmara.
No documento apreendido com Luciano, há justificativas para os repasses, incluindo despesas com hotéis usados por Lira, gastos com alimentação na residência oficial (assinalada como RO), impostos, combustíveis, gastos com carros e até mesmo fisioterapia do pai do presidente da Câmara.
Luciano ocupava um cargo na liderança do PP da Câmara e foi exonerado após ser alvo de uma busca e apreensão na operação Hefesto, que investiga desvios nos contratos de kits robóticos. Ele é conhecido em Brasília como o braço direito de Lira, que está em Portugal para participar de um evento organizado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), fundado pelo ministro Gilmar Mendes, decano do STF. O deputado falará nesta segunda-feira (25), na mesa de abertura.
A filha de Luciano é sócia do filho de Lira em uma empresa de publicidade em mídias e ambos estiveram envolvidos em contratos milionários do governo federal na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O advogado de Luciano, André Callegari, afirma que não teve acesso completo aos documentos e diligências do inquérito, o que impossibilita qualquer manifestação, pois a motivação da operação ainda é desconhecida.
Na lista de pagamentos encontrada pela Polícia Federal, além do nome "Arthur", há indícios de que os valores estão relacionados ao próprio presidente da Câmara. Um exemplo é o pagamento de fisioterapia para o pai do político, conhecido como Bill.
Também consta na lista um pagamento de R$ 4,5 mil relacionado a "Arthur" para a "revisão Hilux". A campanha de Lira usou uma picape Hilux na eleição de 2022, que também teria sido utilizada para a entrega de dinheiro em Maceió, o que está sob investigação da Polícia Federal.
A caminhonete está registrada em nome de Murilo Nogueira Júnior, que também é alvo da investigação, mas fica na residência de Luciano na capital de Alagoas.
Além disso, há registros de despesas do deputado. No ano passado, quando Lira concorreu à reeleição como deputado federal, Luciano cedeu um carro de sua propriedade, uma VW Amarok preto de 2020, para ser usado na campanha do presidente da Câmara.
Nas anotações obtidas pelos investigadores, constam gastos para a revisão de uma Amarok em fevereiro deste ano. Também há anotações sobre a compra de pneus para um veículo Saveiro. Lira declarou possuir uma Saveiro em suas prestações de bens à Justiça Eleitoral nas últimas eleições.
Avaliação da Polícia Federal
Segundo a PF, houve direcionamento e superfaturamento de contratos para a compra de equipamentos de robótica para escolas públicas, custeados com recursos do FNDE, que é repassado pelo governo federal. As fraudes teriam ocorrido entre 2019 e 2022.
O Tribunal de Contas da União (TCU) já havia aberto um procedimento para investigar a compra dos kits de robótica. Os ministros chegaram a suspender contratos firmados entre prefeituras de Alagoas e de Pernambuco. A área técnica do TCU afirmou ter encontrado indícios de superfaturamento e apontou que algumas escolas sequer tinham condições operacionais e de infraestrutura para receber os equipamentos.