É falso que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha reconduzido o ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró ao mesmo posto na empresa. O cargo em questão foi extinto em 2014, e a petroleira negou que haja qualquer vínculo de Cerveró com a estatal atualmente.
Conteúdo investigado
Publicações afirmam que o presidente Lula, em seu terceiro mandato, reconduziu Nestor Cerveró ao cargo que ocupava na diretoria da Petrobras, na Área Internacional da estatal.
Onde foi publicado
Conclusão do Comprova
É falso que o engenheiro químico Nestor Cuñat Cerveró, 71 anos, tenha sido reconduzido ao cargo de diretor da Área Internacional da Petrobras pelo presidente Lula. Isso não seria possível a começar pelo fato de que o cargo que ele ocupava foi extinto do quadro da estatal.
Além de condenado em 2016 pela Justiça Federal em segunda instância, Cerveró também foi responsabilizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), no ano seguinte, pela compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, pela Petrobras em 2006, o que o impede de exercer cargo público em comissão por oito anos.
Em 14 de maio, o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo informou que o advogado e ex-sócio de Cerveró em uma empresa offshore, Marcelo de Oliveira Mello, foi nomeado para chefiar o departamento jurídico da Petrobras. A matéria não diz nada, no entanto, a respeito da suposta nomeação de Cerveró para a petroleira.
A Petrobras, em nota ao Comprova, informou que Nestor Cerveró não possui vínculo com a empresa.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação
O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 29 de maio, a publicação no Twitter tinha 376 compartilhamentos, 2,5 mil curtidas e 117 mil visualizações. No Telegram, até esta mesma data, o conteúdo havia sido visualizado 7,1 mil vezes.
Como verificamos
O primeiro passo foi pesquisar na imprensa notícias sobre a indicação de Nestor Cerveró à Petrobras e, depois, sobre a composição atual da diretoria da empresa e o modelo de contratação dos diretores. Também pesquisamos qual a relação de Cerveró com a empresa, quais cargos assumiu, como foi sua carreira e como se deu a saída da estatal.
Contatamos a Petrobras para saber se Cerveró faz parte do quadro de diretores ou foi indicado recentemente para compor a diretoria. Também questionamos qual seria o atual envolvimento dele com a empresa.
O Supremo Tribunal Federal (STF) e a Justiça Federal do Paraná também foram contatados sobre a situação dos processos a que ele responde em decorrência da Lava-Jato. O Comprova ainda buscou a defesa do ex-diretor da Petrobras para esclarecer a atual situação jurídica de Cerveró. Entretanto, não obteve retorno até a publicação desta checagem.
Diretoria foi extinta em 2014
Em decorrência dos casos de corrupção investigados a partir de 2014 na Lava-Jato, a Petrobras realizou uma mudança no organograma da empresa e extinguiu a então diretoria da Área Internacional, substituindo-a, em novembro daquele ano, pela diretoria de Governança, Risco e Conformidade. O primeiro diretor nomeado foi João Adalberto Elek Júnior, em janeiro de 2015, após um processo seletivo conduzido pela empresa Korn Ferry. Atualmente, o posto é ocupado por Mário Spinelli.
Em 2020, o Conselho Administrativo da Petrobras aprovou outra alteração no organograma, com a criação da diretoria de Logística e a extinção da diretoria de Assuntos Corporativos, que teve suas atividades realocadas para outras diretorias da empresa. Neste ano, em abril, uma nova mudança organizacional foi aprovada, mas manteve o quantitativo de oito diretorias, além da presidência.
Atualmente, o corpo diretivo da Petrobras é composto por:
- Jean Paul Terra Prates – Presidente;
- Carlos José do Nascimento Travassos – Diretor Executivo de Engenharia, Tecnologia e Inovação;
- Clarice Coppetti – Diretora Executiva de Assuntos Corporativos;
- Claudio Romeo Schlosser – Diretor Executivo de Logística, Comercialização e Mercados;
- Joelson Falcão Mendes – Diretor Executivo de Exploração e Produção;
- Mário Spinelli – Diretor Executivo de Governança e Conformidade;
- Mauricio Tolmasquim – Diretor Executivo de Transição Energética e Sustentabilidade;
- Sergio Caetano Leite – Diretor Executivo Financeiro e de Relacionamento com Investidores; e
- William França da Silva – Diretor Executivo de Processos Industriais e Produtos.
Além disso, a diretoria da Petrobras é formada em um processo de eleição definido pelo Conselho de Administração da companhia. O Conselho é formado atualmente por 11 membros eleitos em Assembleia Geral de Acionistas para um mandato de até dois anos, admitidas três reeleições consecutivas. Seis dos membros são indicados pelo acionista controlador (governo federal), quatro pelos acionistas minoritários e um eleito pelos empregados.
Entre os membros da Diretoria Executiva, somente o presidente da companhia pode integrar o Conselho de Administração. No entanto, o presidente, atualmente Jean Paul Prates, não pode exercer a presidência do Conselho, comandada por Pietro Adamo Sampaio Mendes. É possível, porém, que se tenha indicações políticas para a composição da diretoria, mesmo que seja necessária a aprovação do Conselho para o exercício do cargo.
Quem é Nestor Cerveró
Nestor Cuñat Cerveró, de 71 anos, é um engenheiro químico que atuou como diretor da Área Internacional na Petrobras entre 2003 e 2008. Ele era funcionário de carreira da petroleira desde 1975.
Ainda em 2008, passou a ser diretor financeiro da BR Distribuidora, que era uma subsidiária da estatal até 2017, quando começou a ser privatizada em um processo finalizado em 2021, passando a se chamar Vibra Energia. Cerveró esteve no cargo indicado pelo então presidente Lula e permaneceu até 2014.
O ex-diretor se tornou conhecido ao virar alvo das investigações da Lava-Jato, com o objetivo de desvendar casos de corrupção envolvendo a Petrobras, que culminou em sua exoneração do cargo na BR Distribuidora. Ele foi preso em janeiro de 2015 assim que pousou no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, ao voltar de Londres (Inglaterra) por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro. Por esses crimes, o ex-diretor foi condenado a cinco anos de prisão em regime fechado meses depois.
Cerveró também é conhecido por ter sido o responsável pelo relatório, em 2006, sobre a compra da refinaria de petróleo de Pasadena, nos Estados Unidos, que gerou prejuízo para a Petrobras. Na época, a estatal pagou US$ 360 milhões por 50% da refinaria, valor muito superior ao que foi pago um ano antes pela belga Astra Oil pela refinaria inteira (US$ 42,5 milhões).
A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) era a presidente do Conselho de Administração da Petrobras na ocasião da compra da refinaria e afirmou, em depoimento à Procuradoria-Geral da República (PGR), em 2014, que foi a favor da aquisição por não saber os detalhes do contrato que seria firmado.
Em 2016, Cerveró fechou um acordo de delação premiada em que disse que a ex-presidente teria conhecimento de detalhes da negociação relativas à compra de Pasadena.
Em 2017, o TCU condenou o ex-diretor e o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli pelo envolvimento no negócio que envolveu a refinaria, enquanto Dilma e o Conselho foram inocentados. Cerveró e Gabrielli também ficaram inabilitados de exercer qualquer cargo público em comissão por oito anos.
A delação de Cerveró foi alvo de outras polêmicas, pois houve a acusação de que ele teria sido parte passiva em um processo de obstrução de Justiça, de modo que um grupo teria tentado comprar o seu silêncio. Na denúncia, eram apontados como integrantes desse grupo o presidente Lula e o ex-senador Delcídio do Amaral (PT-MS).
A ação se baseou também em depoimento de Bernardo Cerveró, ator e filho de Nestor, que gravou um encontro com o ex-senador, no qual ele teria lhe prometido ajuda financeira. Eles foram absolvidos no processo em 2018.
Processos
Pelo crime de lavagem de dinheiro, Nestor Cerveró foi condenado à prisão, em regime inicialmente fechado, por cinco anos em decisão do então juiz federal, hoje senador, Sérgio Moro (União Brasil-PR), em maio de 2015.
A decisão se refere à compra de um apartamento de luxo no bairro de Ipanema, Rio de Janeiro, para uso próprio, mas em nome de uma empresa, com dinheiro que recebeu como propina da Petrobras. Essa foi a primeira condenação do ex-diretor da empresa estatal, que ficou preso em Curitiba (PR).
Em agosto do mesmo ano, a partir de um processo penal, Cerveró foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro a 12 anos e 3 meses de prisão, além de ter de devolver R$ 17 milhões à Petrobras. O processo se referia à contratação pela Petrobras da Samsung Heavy Industries para o fornecimento dos navios-sonda para perfuração de águas profundas.
Em junho de 2016, após acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF) e homologado pelo STF, ele passou a cumprir prisão domiciliar na casa da família em Itaipava (RJ), monitorado por tornozeleira eletrônica e sem poder sair do país.
No final daquele ano, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) aumentou a pena de Cerveró para 27 anos e quatro meses de reclusão.
Em 2022, em maio, Cerveró retomou o direito de sair do país. Ofício da 12ª Vara Federal de Curitiba informou que ele já cumpriu “as penas privativas de liberdade e restritivas de direitos previstas no seu Acordo de Colaboração Premiada“.
O que diz o responsável pela publicação
O Comprova entrou em contato com o perfil @mspbra por meio do Facebook e de e-mail em 30 de maio. Até a conclusão desta checagem, não recebeu retorno.
O que podemos aprender com esta verificação
O conteúdo de desinformação em questão resgata um nome envolvido em processos judiciais e famoso por casos de corrupção e o vincula a uma nomeação a uma estatal. Neste caso, uma pesquisa junto à imprensa seria eficaz para verificar que não houve a nomeação de Nestor Cerveró a uma diretoria da Petrobras, visto que se trata de um personagem conhecido e seu retorno a um cargo público seria amplamente noticiado.
É preciso estar atento aos alardes provocados por desinformadores ao citar esses nomes. Ao se deparar com mensagens sobre a vinculação de uma pessoa a um cargo nos governos, busque notícias e também acesse canais oficiais, como o Diário Oficial da União (DOU), dos estados ou municípios, ou mesmo os sites das empresas estatais ou ministérios, onde estão os organogramas dos órgãos ou entidades.
Por que investigamos
O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp (11) 97045-4984.