A inédita conquista da reeleição ao governo do Rio Grande do Sul fez de Eduardo Leite uma unanimidade no PSDB. Pela primeira vez em 20 anos os tucanos emergem das urnas unidos em torno de um nome para conduzir os rumos do partido e disputar a próxima eleição presidencial.
Embora insista que sua prioridade é a gestão do Estado, Leite vem sendo pressionado a assumir a presidência da legenda a partir de 2023. Ele deve responder aos apelos na próxima semana, quando retorna das férias após a desgastante campanha eleitoral.
Recluso e sem dar pistas da decisão, o governador eleito pondera prós e contras de se dedicar ao partido enquanto deflagra o segundo mandato. Leite teme gastar energia excessiva reconstruindo o PSDB e atrair críticas por uma suposta candidatura prematura ao Planalto.
Entre os tucanos, porém, não há outro nome sendo cogitado além do gaúcho. O ambiente é tão favorável a Leite que ele terá carta branca para montar a executiva e liderar o processo de fusão com o Cidadania ou de ampliação da federação partidária com o aliado, atraindo o Podemos.
— O Eduardo é hoje a principal estrela do PSDB e tem a convergência do partido. Claro que tem responsabilidade imensa como governador, mas o partido funciona através de sua executiva e ele teria total liberdade para escolher os nomes. Ele seria nosso maestro, apontaria os caminhos — diz o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG).
O objetivo dos tucanos é aproveitar o surgimento de uma liderança jovem, promissora e respeitada no cenário nacional para remontar o partido após as sucessivas brigas que levaram ao fracasso nas urnas em 2022. Se antes o destino do PSDB era decidido numa mesa de quatro lugares nos restaurantes sofisticados de São Paulo, envolvendo em geral a cúpula paulistana formada por Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, nos últimos anos a sigla naufragou em crises produzidas pela rivalidade entre Serra e Aécio Neves e entre Alckmin e João Doria.
O saldo foi traumático. Sem identidade, programa e tampouco militância, o PSDB não teve candidato ao Planalto e colheu o pior resultado de sua história. Além de nem sequer passar ao segundo turno da disputa pelo governo de São Paulo, bastião tucano há 28 anos, o partido não elegeu nenhum senador e montou uma bancada de míseros 13 deputados (18 na federação como Cidadania), pouco acima dos 11 exigidos pela cláusula de barreira.
Com a velha guarda tucana rumando para a aposentadoria e os mais jovens flertando explicitamente com o bolsonarismo, Leite se tornou a esperança de reencarnação do ideário social-democrata que norteou a fundação do PSDB em 1988. Filiado desde os 16 anos, o gaúcho galgou essa posição não só pelo respeito às tradições partidárias, mas sobretudo pela expressiva vitória sobre Onyx Lorenzoni (PL) e pela postura de não aderir a Jair Bolsonaro (PL) nem a Luiz Inácio Lula da Silva na disputa presidencial (PT).
— O partido precisa de uma liderança como ele. Alguém vitorioso e que cria referência ao dar centralidade à educação no novo mandato. O Eduardo hoje, em qualquer Estado que ele vá, terá uma multidão reunida para ouvi-lo, inclusive de outros partidos. Ele agrega não só o PSDB, mas todo o centro democrático — afirma o ex-deputado José Aníbal (SP).
A dependência por alguém que remodele a espinha programática do PSDB é tamanha que circula nos bastidores um entendimento tácito de que, caso recuse a presidência, Leite poderia indicar alguém de sua confiança para dirigir o partido. A única exigência é que esse nome não seja de Minas Gerais nem de São Paulo, para não reacender rixas antigas, e que tenha a chancela dos outros dois governadores tucanos eleitos em 2022, Raquel Lyra (PE) e Eduardo Ridel (MS).
Fundador do PSDB e arguto observador das entranhas do partido, o ex-deputado Marcus Pestana (MG) é um entusiasta da renovação tucana. Pestana, todavia, é uma das poucas vozes contrárias à pressa para que Leite assuma a presidência da sigla.
Para ele, o gaúcho precisa focar primeiro nas entregas do segundo mandato e na consolidação de uma liderança no fórum dos governadores, com participação decisiva no debate das questões nacionais, como a reforma tributária e a compensação pelas perdas no ICMS. O ideal, diz Pestana, é Leite indicar um presidente agora e assumir o comando da executiva nacional em 2025, preparando o terreno para a campanha ao Planalto no ano seguinte.
Segundo o ex-deputado, haverá uma renovação geracional em 2026, mas o petismo e o bolsonarismo continuarão lá, com capacidade de mobilização, engajamento nas redes sociais e um conjunto de ideias que unifica suas bases, atributos que hoje o PSDB não dispõe.
— Eduardo precisa apresentar resultados, fortalecer sua presença digital e ganhar visibilidade como liderança nacional. Não há questionamento de que ele é a bola da vez, mas hoje o PSDB não tem capacidade de ser plataforma densa para o lançamento de uma candidatura presidencial. Ele chega melhor em 2026 se conduzir esse processo de longe, sem os desgastes cotidianos. Como sei que gosta de samba, mandei para ele uma música do Paulinho da Viola que diz “faça como o velho marinheiro, que durante o nevoeiro, leva o barco devagar” — conta Pestana, fazendo justiça à tradicional paciência dos políticos mineiros.