O acordo para que o MDB indique o deputado estadual Gabriel Souza como candidato a vice-governador na chapa de Eduardo Leite (PSDB) à reeleição não está selado. O que aconteceu foi a real abertura de uma janela de negociação, sob apoio implícito e ranger de dentes de diferentes setores do MDB gaúcho. A mera admissão pública de conversas que buscam repetir no Rio Grande do Sul o alinhamento nacional entre PSDB e MDB já foi suficiente para abalar as bases da pré-candidatura de Gabriel ao Palácio Piratini.
Nesta quinta-feira (9), a direção executiva nacional do PSDB, por ampla maioria, aprovou o apoio do partido à candidatura presidencial da senadora Simone Tebet (MDB). Os tucanos esperam a retribuição do MDB no Rio Grande do Sul, com o alinhamento à tentativa de reeleição de Leite ao Piratini.
Na terça-feira (7), Leite, o presidente estadual do MDB, Fábio Branco, e o ex-governador Germano Rigotto (MDB) tiveram uma reunião em Porto Alegre e o tucano sentiu que há espaço para a composição. Contudo, a construção tende a ser longa e espinhosa. O MDB é a legenda mais vitoriosa em eleições ao Palácio Piratini no pós-redemocratização.
Foram quatro pleitos vencidos, dois deles de forma improvável, e deixar de ter a cabeça de chapa pela primeira vez é um processo que requer paciência e cuidado. Por isso, Leite ficou satisfeito com a abertura de negociações e deu sinal verde para o PSDB fechar com Tebet, mesmo sem a confirmação da aliança no Estado.
Já na quarta-feira (8), Rigotto e o ex-prefeito de Porto Alegre José Fogaça (MDB) se manifestaram publicamente defendendo que a sigla abra o diálogo sobre a união do centro democrático, em candidatura única que representaria o reformismo dos governos Leite e do seu antecessor, José Ivo Sartori (MDB). Internamente, grupos do MDB estavam cobrando uns dos outros sobre quem tomaria a dianteira ao conclamar publicamente o debate que pode culminar no apoio do MDB a Leite. Rigotto e Fogaça, que construíram o plano de governo de Tebet, abraçaram a causa. A dúvida, agora, é se outras lideranças irão se encorajar para seguir o caminho e pavimentar a parceria junto às bases, trabalho considerado árduo. A avaliação é de que os filiados comuns, que não necessariamente detêm mandato, devem formar resistência ao acordo.
— O MDB do Rio Grande do Sul tem a responsabilidade de analisar o quadro nacional, o efeito disso no Estado e avaliar uma situação nova, que é a candidatura do Eduardo Leite. Ele é candidato a governador e isso tem de ser analisado pelo MDB. O Gabriel, como candidato, também tem a responsabilidade de analisar esse novo quadro. Dividir o centro seria um erro — avalia Rigotto, que pede um “grande debate interno”.
A maioria da bancada do MDB na Assembleia Legislativa é próxima de Gabriel e não se oporia à indicação dele como vice de Leite, embora ainda não se admita isso publicamente. Na federal, somente Osmar Terra é notoriamente contrário.
Já nas alas do MDB que fazem oposição ao acordo, a avaliação de bastidores é de que o jogo está jogado. Para esse grupo, que conta com nomes de peso, sobretudo da velha guarda, Gabriel será candidato a vice de Leite. Mais do que isso: ele deseja a composição com o tucano.
Na noite de quarta-feira (8), após a repercussão nacional do acordo entre PSDB e MDB, junto de algumas notícias de que a aliança seria replicada no Rio Grande do Sul, Gabriel disparou um áudio de WhatsApp para os correligionários.
— Não tenho como comentar algo que não conheço. O que posso dizer a vocês é que não tenho nenhum motivo para desistir da minha pré-candidatura a governador do Estado. Estou firme, cumprindo minha tarefa — afirmou Gabriel.
Para os opositores do acordo com o PSDB, a mensagem não soou convincente.
— Vão conduzir para o MDB ser vice do Leite, mas ele (Gabriel) vai negar até o último momento — diz um graduado emedebista.
Entre as diferentes alas, desde as favoráveis até as contrárias ao acordo, a avaliação é de que Gabriel será desidratado com o discurso de que o retorno de Leite, após o fracasso na tentativa de ser presidente, deixa o pré-candidato emedebista no limbo. Leite, por ter maior envergadura política, projeção nacional e boa avaliação entre eleitores, ocupará o espaço de candidato do centro democrático e da continuidade do reformismo. Segundo a tese, Gabriel ficará espremido de forma que nem a força do MDB seria capaz de catapultá-lo.
A volta do tucano ao páreo também retirou um dos maiores trunfos de Gabriel: a afirmação de que tinha o apoio e empenho pessoal do próprio Leite para concorrer à sucessão. Nesses termos, o acordo é visto com bons olhos por montar uma chapa forte — quiçá favorita — na defesa do projeto reformista iniciado por Sartori e Leite.
Na direção nacional do MDB, fontes avaliam que o processo precisará de tempo, mas há otimismo de que a aliança irá se concretizar. Tebet telefonou dias atrás para o ex-senador Pedro Simon, guru do MDB gaúcho, e pediu sua ajuda para que o partido apoiasse Leite. Simon teria respondido que poderia auxiliar na construção, mas que não seria o primeiro a se jogar, logo ele, que sempre defendeu candidatura própria.
Por outro lado, o deputado estadual Tiago Simon, filho do decano emedebista, afirma ter posição contrária ao acordo.
— Seguindo a orientação do pai, vou defender a candidatura própria — diz o parlamentar.
O fato é que, mesmo entre as alas contrárias, a percepção é de que, hoje, a aliança passou a ser mais possível. Isso não significa que será fácil. Há representantes da velha guarda que nutrem forte oposição e até mágoa de Leite, rescaldo da eleição de 2018, quando ele e Sartori se enfrentaram no segundo turno, com vitória do tucano. As avaliações, nesse núcleo, são de que Leite fez promessas de apoiar Gabriel e de não concorrer à reeleição. Voltou derrotado da aventura rumo ao Palácio do Planalto e, agora, quer fazer o Rio Grande do Sul de “estepe”.
Também há questionamento se, caso selada a aliança, seria Gabriel um indicado natural ou deveria ser aberta nova discussão sobre o nome do MDB. Outro componente de dúvida é se Sartori ainda poderá compor a chapa concorrendo ao Senado. Existem reclamações generalizadas sobre a condução do processo e o silêncio de lideranças, inclusive de Leite, que ainda não veio a público dizer formalmente que é candidato à reeleição, após ter renunciado ao Piratini em março pelo sonho presidencial.
Mesmo que o MDB seja carregado habilidosamente ao encontro do tucano, os embates devem persistir até o fim: o experiente Cezar Schirmer, atualmente vereador na Capital e influente nome da velha guarda, segue disposto a inscrever seu nome como candidato do MDB ao Palácio Piratini no dia da convenção partidária, instância oficial de definição do rumo do partido na eleição. Na convenção, pré-agendada para 31 de julho, a decisão é no voto dos delegados, um colegiado de cerca de mil filiados.