Na agitação da nova crise entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o Poder Judiciário, o ministro Carlos Bastide Horbach, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), declarou ter convicção de que os resultados das eleições de 2022 serão respeitados. De passagem por Porto Alegre para participar do 18º Encontro do Colégio de Dirigentes das Escolas Judiciárias Eleitorais (Codeje), Horbach destacou, nesta sexta-feira (6), que o sistema eletrônico de votação brasileiro “está em utilização há mais de 25 anos”, salientando que jamais houve caso de fraude.
— Existe confiança total de que teremos eleições em outubro e que, até o dia 19 de dezembro, nós vamos diplomar os eleitos, sejam eles quem forem. Isso é algo que, para todos nós, é pacífico. Não há dúvida quanto a esse desfecho no ano de 2022 — assegurou Horbach.
Nos últimos dias, Bolsonaro voltou a levantar suspeitas, sem apresentar provas, quanto à segurança do sistema eleitoral do país. O presidente cobrou recentemente que o TSE aceite sugestões das Forças Armadas ao processo eleitoral. Uma delas, conforme o próprio Bolsonaro, seria para que os militares acompanhassem a apuração dos votos, no dia da eleição, fazendo uma espécie de escrutínio paralelo. No ano passado, as Forças Armadas foram convidadas pelo então presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, para participar da Comissão de Transparência das Eleições (CTE). A esse colegiado, os militares levaram dezenas de indagações e sugestões, parte das quais está sob sigilo.
— Essa apuração paralela pode ser feita por qualquer pessoa hoje em dia. Toda urna eletrônica, quando encerra a votação, emite um boletim de urna. Ele é obrigatoriamente afixado na porta da seção eleitoral e tem um QR Code que eu posso fotografar. Isso me dá todos os dados da urna. Até a última eleição, já tinha uma apuração paralela. Os partidos tiravam a foto, mandavam por WhatsApp para uma central de processamento que, muitas vezes, em cidades pequenas, dava o resultado antes da Justiça Eleitoral — diz Horbach.
Ele complementou dizendo que, na eleição de 2022, o sistema será ampliado porque os boletins de urna, além de afixados nas portas das seções, serão disponibilizados na internet de forma imediata após o encerramento do pleito.
— Se os veículos de imprensa quiserem fazer um pool para ter, entre aspas, uma apuração paralela, eles podem fazer. Os dados são públicos e isso é viável. A totalização que é feita no TSE é simplesmente a soma desses diferentes dados que são divulgados nas portas das seções — afirmou o ministro.
Ele ainda disse receber com tranquilidade a afirmação de Bolsonaro de que o seu partido, o PL, irá contratar uma empresa privada para auditar as eleições.
— O processo é completamente auditável. Não vejo com preocupação. O sistema já se mostrou seguro nos últimos 25 anos — avaliou Horbach.
No evento da Justiça Eleitoral, realizado em Porto Alegre entre quinta (5) e sexta-feira, o principal tema foi o combate à desinformação nas eleições de 2022. Aspecto que foi observado na eleição de 2018, a circulação de fake news em redes sociais e em aplicativos de conversas é outro ponto de atenção do TSE. Depois daquele pleito, a Corte criou o Programa Permanente de Enfrentamento à Desinformação no âmbito da Justiça Eleitoral, ao qual aderiram plataformas como Google, Facebook, Instagram e WhatsApp. Mais recentemente, em março de 2022, o Telegram, atualmente muito utilizado por aliados de Bolsonaro, também ingressou na iniciativa.
O desembargador Jorge Luís Dall’Agnol, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, é presidente do Codeje e afirmou que está sendo produzida uma cartilha com informações e esclarecimentos sobre o funcionamento das eleições e da urna eletrônica para distribuição à população. Meios de levar informações verídicas aos eleitores também estiveram entre os pontos de debate no evento. Um dos palestrantes, o professor de Direito Carlos Affonso Souza, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), abordou outro tema que tem despertado discussões: a liberdade de expressão no mundo digital e suas eventuais restrições. O tema, destaca ele, ganhou ainda mais holofotes após o anúncio da compra do Twitter pelo bilionário Elon Musk, que se apresenta como um defensor irrestrito da liberdade de manifestação. Apoiadores do presidente brasileiro comemoraram o fato, no sentido de que isso poderá representar menos moderação de conteúdo por parte da rede social.
— É bom esclarecer que a liberdade de expressão não é absoluta. Como todo o direito, ela enfrenta limites. Esse limite é encontrado no direito alheio e nos danos que a liberdade de expressão eventualmente pode causar quando ela é abusada — avaliou Souza.
O ministro Horbach, do TSE, também abordou o tema das fake news e definiu a liberdade de expressão como fundamental para o regime democrático.
— É importante diferenciar o que é fake news do que é opinião. O que é fake news e o que é uma crítica política mais severa, mais ácida. O que é charge, meme ou piada. Isso tudo acaba sendo protegido pela liberdade de expressão, um dos grandes valores da democracia. A nossa atuação é sempre de ponderação muito delicada entre o controle da igualdade de disputa eleitoral de um lado e, de outro lado, a liberdade de expressão e sua preservação — avaliou Horbach.