O diretor da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA), William J. Burns, esteve em Brasília em julho de 2021 e teria dito a membros do alto escalão do governo de Jair Bolsonaro que o presidente deveria parar de questionar o sistema de votação brasileiro, relatou a agência de notícias Reuters.
Burns é o mais alto membro do governo norte-americano a se reunir com autoridades em solo brasileiro desde a eleição de Joe Biden. O diretor da CIA chegou a Brasília seis meses após o ataque de 6 de janeiro ao Capitólio dos Estados Unidos.
À época do ataque, Bolsonaro chegou a reproduzir alegações do ex-presidente norte-americano Donald Trump sobre o resultado das eleições nos EUA, indicando a possibilidade de fraude eleitoral no Brasil, sem apresentar provas.
O diretor da CIA se encontrou com Bolsonaro, com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, e com o então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem.
Porém, o comentário teria acontecido durante um jantar na residência do embaixador americano Todd Chapman, na presença de Heleno e do ex-ministro da Casa Civil Luiz Eduardo Ramos. Segundo fontes ouvidas pela Reuters, Heleno e Ramos tentaram minimizar o significado das alegações de Bolsonaro.
Burns teria respondido que o processo democrático é sagrado e que Bolsonaro não deveria falar daquela maneira.
— Burns estava deixando claro que as eleições não eram um assunto com o qual eles deveriam mexer. Não foi uma palestra, foi uma conversa — disse uma das fontes.
Outra fonte em Washington confirmou que uma delegação liderada pelo diretor da CIA afirmou aos "principais assessores de Bolsonaro" que o presidente deveria parar de tentar abalar a confiança no sistema eleitoral brasileiro, mas não tinha certeza se o próprio Burns havia entregue a mensagem.
As fontes também ressaltaram que é incomum os diretores da CIA entregarem mensagens políticas, porém, Burns, um dos mais experientes diplomatas dos Estados Unidos, estaria capacitado como porta-voz discreto da Casa Branca.
A mensagem teria sido reforçada no mês seguinte, quando o conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan, visitou Bolsonaro e também teria mostrado preocupação com as tentativas de desacreditar a confiança nas eleições. Mas, de acordo com a fonte ouvida pela agência, a mensagem da delegação de Burns foi mais forte.
Segundo um ofício encaminhado por Heleno à Câmara dos Deputados em 2 de setembro, ao qual o jornal O Globo teve acesso, no encontro com Burns foram discutidos assuntos relativos "à promoção da democracia, da segurança e da estabilidade no Hemisfério". O documento aponta que Burns se mostrou interessado, em relação à Abin, "na permanência da cooperação em matéria de inteligência, fundamental para responder a ameaças de caráter transnacional, como o terrorismo, a criminalidade organizada e a criminalidade cibernética".
Heleno também ressaltou que o jantar foi apenas um evento de cortesia "e, naturalmente, transcorreu com conversas informais a respeito de temas de interesse mútuo do Brasil e dos Estados Unidos da América".
O gabinete de Bolsonaro não respondeu aos pedidos de comentários da Reuters. Já a CIA se recusou a comentar o assunto.