Os ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) decidiram juntar uma representação sobre supostas "práticas ilegítimas" do ex-juiz Sergio Moro à época em que era titular da 13ª Vara Federal de Curitiba ao processo que apura eventual conflito de interesse na atuação do pré-candidato à Presidência na consultoria americana Alvarez & Marsal, que administra a recuperação da empreiteira Odebrecht, um dos principais alvos da Operação Lava-Jato.
A decisão foi tomada por unanimidade em sessão plenária realizada pela Corte de contas na última quarta-feira (16). Na ocasião, os ministros decidiram não arquivar a representação contra o ex-juiz, como indicado, em um primeiro momento, pelo relator, ministro Aroldo Cedraz. O colegiado acatou voto-vista do colega Bruno Dantas e viu "necessidade de aprofundamento" das questões citadas na representação.
De autoria do subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, o documento aponta "práticas ilegítimas de procuradores da República que integraram a força-tarefa da Operação Lava-Jato, bem como do ex-juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pela condução de processos judiciais daquela operação". De acordo com Furtado, as "práticas ilegítimas seriam revolving door — movimento de agentes públicos de alto escalão para empregos na iniciativa privada e vice-versa — e lawfare — instrumentalização do Direito para prejudicar pessoa física ou jurídica".
Em novembro, o relator, ministro Aroldo Cedraz, propôs o arquivamento da representação, ocasião na qual Dantas solicitou mais tempo para analisar o caso e verificar "eventuais repercussões" com o processo que estava sob sua relatoria.
Tal apuração mira possíveis "prejuízos aos cofres públicos pelas operações supostamente ilegais dos membros da Lava-Jato de Curitiba e do ex-juiz Sergio Moro, afetando a empresa Odebrecht mediante práticas ilegítimas de revolving door" — movimentação em que políticos ou servidores se tornam lobistas ou consultores na área em que atuavam —, e lawfare, "conduzido contra pessoas investigadas nas operações" da força-tarefa.
Após estudar o caso, Dantas defendeu sobrestar a representação até o avanço das investigações que estão sob sua relatoria. Caso a sugestão principal não fosse acatada, o ministro aventou a possibilidade de apensar o caso à apuração citada, considerando que ela está com "tramitação mais acelerada". O ministro ponderou que, no âmbito da mesma, foram realizadas "diversas diligências e oitivas, além de existir levantamento de informações em curso".
Cedraz acatou a sugestão do colega, apontando "necessidade de aprofundamento" das questões citadas na representação de Furtado. Em seu voto, o ministro chegou a ponderar que a apuração sobre suposto conflito de interesse de Moro tem "maior amplitude" e está em "adiantada fase de apuração", "com o endereçamento de expedientes à Procuradoria-Geral da República, Secretaria Especial da Receita Federal, Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça e Segurança Pública".
Foi no âmbito da investigação "mais avançada", sob relatoria de Dantas, que a Alvarez & Marsal foi instada a apresentar os documentos ligados à saída de Moro da empresa em outubro, quando o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública se lançou na política. Diante do imbróglio, o ex-juiz resolveu revelar os montantes que recebeu da consultoria americana — um salário bruto de US$ 45 mil, resultando em um valor total e convertido de R$ 3,65 milhões.
A apuração foi aberta a pedido do subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, que chegou a informar ao ministro Bruno Dantas que, no âmbito da apuração, "se avaliam questões relativas a possíveis conflitos de interesse, favorecimentos, manipulação e troca de favores entre agentes públicos e organizações privadas".
Moro foi contratado pela Alvarez & Marsal após pedir demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública acusando o presidente Jair Bolsonaro de suposta tentativa de interferência política na Polícia Federal — tema de inquérito que tramita junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). O ex-aliado do chefe do Executivo, que deixou a magistratura para comandar o ministério, se mudou para os Estados Unidos para a área de Disputas e Investigações da consultoria americana.
A Alvarez & Marsal fornece serviços de consultoria, aprimoramento de desempenho de negócios e gestão de recuperação e atua, por exemplo, no processo de recuperação da Odebrecht — empreiteira que celebrou acordo de leniência com a Lava-Jato e viu 77 de seus executivos fecharem delações premiadas, inclusive o patriarca Emílio Odebrecht e seu filho Marcelo, que foi condenado por Moro em diferentes ações penais.