Com uma fala próxima aos discursos do pré-candidato à Presidência Sergio Moro, o ex-procurador Deltan Dallagnol se filiou nesta sexta-feira, 10, ao Podemos, ampliando a base de apoio do ex-juiz. No evento, tentou fazer uma ponte entre o perfil de procurador e de candidato, resgatando o que toma como avanços da Lava Jato e criticando medidas do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF).
O recém-filiado relembrou uma série de fases da força-tarefa e atacou decisões do STF que anularam condenações da Lava Jato e comparou a Corte a um árbitro que quer "mudar as regras e anular os gols" depois da partida. "A luta contra a corrupção é uma luta da sociedade brasileira e precisa ser vencida de baixo para cima", defendeu em evento em Curitiba, enquanto lia um discurso previamente preparado.
Apresentado por Moro como o próximo deputado federal "mais votado do Paraná", Deltan disse que irá assinar uma carta suprapartidária, visando "colocar no Congresso Nacional 200 deputados com três compromissos básicos: democracia, combate a corrupção e preparação política".
Ao sustentar sua atuação como procurador no que chamou de "defesa do que é certo", reforçou a postura de Moro de colocar o combate à corrupção como mote da campanha de 2022. O ex-juiz também esteve no evento, mas foi embora antes da fala do recém-filiado. Do lado de fora, um pequeno protesto de um coletivo ligado ao PT o acusava de ter usado o Ministério Público para fins pessoais e ser "inelegível" para uma possível candidatura.
A filiação de Dallagnol consolida o esforço do Podemos de criar uma "bancada da Lava Jato" com ex-integrantes do Judiciário e do Ministério Público. Além de Deltan, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot também deve se filiar à legenda. Segundo o senador Alvaro Dias, outros integrantes do meio jurídico também chegam na sigla nos próximos meses.
Dallagnol citou diversas organizações como movimentos sindicais, empresas, universidades e igrejas. Se diz dependente de Deus e elogiou à exaustão a Lava Jato. Mas também acredita que a operação fracassou por ter sido desmantelada pelo "sistema", o que o motiva para a disputa em 2022.
Em seu discurso, Moro fez uma defesa contundente dos membros do Podemos que compunham a mesa. Entre eles, os três senadores do Estado, Oriovisto Guimarães, Alvaro Dias e Flávio Arns. "A nossa turma é essa turma aqui. Não é a turma do mensalão, do petróleo, da rachadinha. Nós aqui não precisamos ficar escondendo ninguém", afirmou. No próximo ano, Dias deve se candidatar novamente ao Senado na expectativa de manter a bancada do partido.
Moro foi um dos poucos a extrapolar o tema do combate à corrupção e voltou a levantar questões como os problemas econômicos. Citou por exemplo, o aumento da inflação, a taxa de desemprego e a recessão do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. "Quando o País não cresce, o emprego também não aumenta e as pessoas sofrem", afirmou.
Ao final do evento, Alvaro Dias pontuou que a corrupção não é uma pauta única para o partido, mas que é inevitável devido à característica dos integrantes do Podemos. "Nosso tema é o Brasil, um projeto estratégico de desenvolvimento econômico e social", afirmou.
Estratégico, o evento aconteceu em Curitiba, município usado como símbolo de combate à corrupção por grupos "lavajatistas" que ainda se reúnem na capital paranaense. Apoiadores ficaram até o final da reunião para conseguir fotos com o ex-procurador.
O salão do evento, no Hotel Mabu, que tem capacidade para 150 pessoas, estava superlotado. O local escolhido para a ocasião é o mesmo onde Dallagnol celebrou algumas coletivas da Lava Jato.
Dallagnol esteve no centro de momentos controversos da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Em um deles, apresentou um PowerPoint em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era apontado como chefe de uma organização criminosa. O fato foi lembrado pelo ex-juiz Moro em sua agenda de lançamento do livro "Contra o sistema da corrupção", na última terça-feira, 7. "Puxa esse PowerPoint foi realmente uma violação do Estado de Direito", ironizou.
A candidatura consolida a relação de proximidade do ex-procurador com Moro, duramente criticada por opositores quando os dois comandavam a Operação Lava Jato.
Conforme o Estadão mostrou, a vontade de entrar na política não era novidade para o ex-procurador. Contudo, ele foi desencorajado por colegas que temiam a repetição do que ocorreu na Itália, onde um dos principais nomes da Operação Mãos Limpas decidiu entrar para a política.
Para a presidente do Podemos, Renata Abreu, a participação de Moro e Dallagnol provoca um efeito inverso. "Fico feliz que eles não desistiram e entenderam que agora precisam estar inseridos na política para não acontecer no Brasil o que aconteceu na Itália."