A Polícia Federal (PF) indiciou o senador Renan Calheiros (MDB-AL) por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito de investigação sobre suposta propina de R$ 1 milhão que teria sido solicitada e recebida pelo parlamentar em 2012.
De acordo a corporação, o pagamento teria sido realizado pela Odebrecht como uma contrapartida pelo apoio político à aprovação de uma resolução do Senado que restringiu incentivos fiscais de produtos importados concedidos por Estados, beneficiando a Braskem — episódio conhecido como guerra dos portos.
Em relatório datado desta quinta-feira (1º), enviado ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, os investigadores dizem ter identificado elementos probatórios concretos de autoria e materialidade para se atestar a presença de indícios suficientes de que Calheiros teria praticado os crimes em conjunto com outras quatro pessoas, também indiciadas.
"No caso em tela constatou-se a existência de elementos probatórios demonstrando que o Senador Renan Calheiros, codinome Justiça, recebeu valores indevidos no montante de R$ 1 milhão, com a senha "justo", no dia 31/05/2012, às 15hs, no endereço da empresa Internet Pool Comércio Eletrônicos S/A, por intermédio do senhor Fábio Brito Matos, funcionário da empresa e motorista do senhor Milton de Oliveira Lyra Filho, operador financeiro do parlamentar e sócio administrador da empresa", diz trecho da peça.
Fábio Matos e Milton Lyra também foram indiciados pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. A PF ainda atribuiu crimes de lavagem à Adolpho Julio da Silva Mello Neto (codinome Botox) e Rosangela Benetton Grimaldi (codinome Maravilha). De acordo com os investigadores, ambos seriam ligados ao TrendBank, o qual teria sido usado para operacionalizar a entrega dos valores.
As informações sobre as supostas propinas foram reveladas pelos delatores Claudio Melo Filho, Carlos Fadigas e Marcelo Bahia Odebrecht, em 2017. As apurações culminaram em uma fase ostensiva, aberta no ano seguinte, 2018, a Operação Armistício.
Inicialmente, o inquérito que tramitava junto ao STF atingia ainda três ex-senadores: Romero Jucá, Delcídio do Amaral e Gim Argello. As apurações sobre o envolvimento dos ex-parlamentares foram enviadas à primeira instância, motivo pelo qual o delegado Vinicius Venturini, pediu o compartilhamento do relatório conclusivo com o delegado responsável pelo caso na PF do Distrito Federal.
O senador se pronunciou sobre o caso em seu perfil no Twitter. Na publicação, ele lembrou que a Polícia Federal não tem competência para indiciar um senador e criticou a gestão do presidente Jair Bolsonaro.
"Polícia Federal não tem competência para indiciar senador, só o STF. Bolsonaro pensa que a Constituição e a PF são dele, que delegado é jagunço. Quis tumultuar a CPI: plantou áudio, mandou investigar o dono da Precisa para ele obter HC (habeas corpus) e calar-se. Mas, a cada dia chegamos mais perto dos seus crimes", escreveu.
Mais cedo, a defesa do senador já havia dito em nota que o pedido de indiciamento é um movimento de retaliação da Polícia Federal ao trabalho desempenhado por ele na CPI da Covid. Matheus Felivene, doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), explica que o pedido de indiciamento movido pela PF não possui efeito prático, porque cabe ao STF autorizar a ação.
— O indiciamento sem autorização violaria a prerrogativa de função do parlamentar — afirma.
Segundo Calheiros, a instituição teria instaurado inquérito contra o empresário Francisco Maximiano, dono da Precisa Medicamentos, empresa envolvida em denúncias de irregularidades no processo de aquisição da vacina Covaxin pelo Ministério da Saúde, com o intuito de colocá-lo na condição de investigado e, assim, facilitar a obtenção de seu habeas corpus junto ao STF.
"É uma surpresa que justamente agora, quando a PF, instituição de Estado, abre a investigação sobre a Precisa para facilitar Habeas Corpus do vendedor da vacina da propina e garantir seu silêncio na CPI, tentam essa retaliação", diz um trecho a nota emitida pela defesa de Calheiros.
Na última quarta-feira (30), a ministra Rosa Weber acatou o pedido da defesa de Maximiano e concedeu o habeas corpus que garante ao empresário o direito de ficar em silêncio durante o depoimento à CPI para preservar o direito à não autoincriminação. A comissão ainda não marcou a data do novo depoimento do dono da Precisa.
A oitiva do empresário estava prevista para acontecer na quinta-feira, mas foi desmarcada para que os senadores ouvissem Luiz Paulo Dominguetti Pereira, representante da empresa Davatti Medical Suply, que acusou um integrante do governo Bolsonaro de operar um esquema de cobrança de propina de US$ 1 sobre o valor de cada dose da vacina AstraZeneca, como revelou uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo.
O advogado Luís Henrique Machado, que defende Calheiros, diz que o senador "é investigado desde 2009 pela Procuradoria-Geral da República. Sob o aspecto investigativo, a sua vida foi devassada e jamais foi encontrado qualquer indício de ilicitude sobre os seus atos. Nunca tratou, tampouco autorizou ou consentiu que terceiros falassem em seu nome".
A defesa completa: "por fim, importante salientar que aproximadamente dois terços das investigações contra o senador já foram arquivadas por falta de provas. Assim como os demais inquéritos, a defesa está confiante que a investigação da Odebrecht também será arquivada, até porque nenhuma prova foi produzida em desfavor do senador, restando, somente, a palavra isolada dos delatores".