O vereador Alexandre Bobadra, único integrante da bancada do PSL na Câmara de Porto Alegre, teve as contas de campanha rejeitadas, em primeira instância, pela Justiça Eleitoral. A decisão aponta dívidas eleitorais e gastos indevidos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), abastecido por verbas públicas, e determina a devolução de R$ 81.985 ao Tesouro Nacional.
A defesa do vereador acredita que, no Tribunal Regional Eleitoral (TRE), conseguirá reverter a situação para uma "aprovação de contas com ressalvas" (veja contraponto ao final).
Foram três os motivos que levaram o juiz João Ricardo dos Santos Costa, da 1ª Zona Eleitoral de Porto Alegre, a acatar os argumentos do Ministério Público (MP) em favor da rejeição das contas, em sentença emitida no dia 4 de fevereiro.
O primeiro deles foi a contratação, pela campanha de Bobadra, da empresa Siar Serviços de Portaria e Limpeza, que recebeu R$ 33.750 para prestação de serviços de “vigia” durante a corrida eleitoral, entre 5 e 14 de novembro de 2020.
Para as autoridades que analisaram o caso, a contratação desse serviço não se enquadra em despesas de campanha e não houve justificativa plausível para a situação. Na tramitação processual, a defesa de Bobadra chegou a protocolar um contrato de prestação de serviços entre a empresa e a campanha do vereador.
Conforme o documento, a Siar, que atua em serviços de portaria e limpeza, foi contratada para executar “serviços de panfletagem e divulgação de material da campanha política para vereador desta Capital”. Já na prestação de contas feita no sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Bobadra declarou que a Siar recebeu por “prestação de serviços de vigia”.
Na nota fiscal eletrônica emitida pela empresa, também anexada ao processo, o campo “discriminação dos serviços" registra a finalidade: “prestação dos serviços de vigia”.
“Instado a explicar a relação do gasto com a campanha eleitoral, o prestador (empresa Siar) limitou-se a comprovar o gasto com a nova juntada da NF (nota fiscal). O artigo 35 da Resolução TSE 23.607/2019 elenca os gastos eleitorais sujeitos a registro e não inclui os serviços de vigilância. Desta forma, as despesas com vigia, declaradas pelo prestador, deveriam ser justificadas no processo de prestação de contas, diante da falta de previsão legal específica e também por não se enquadrar em qualquer descrição genérica do que a legislação concebe como gastos de campanha”, decidiu o magistrado.
A segunda irregularidade apontada na sentença foi o pagamento de R$ 1,6 mil, com recursos de campanha, a uma pessoa física. O cheque deveria estar cruzado, mas isso não foi feito, deixando de se observar norma da Justiça Eleitoral. O objetivo dessa regra, frisou o magistrado, é garantir o registro do destinatário dos recursos.
O terceiro apontamento refere-se à dívida de campanha deixada por Bobadra. O então candidato arrecadou R$ 297,2 mil, dos quais R$ 280 mil vieram dos recursos públicos do fundo especial de campanha, mas gastou R$ 332,3 mil.
As dívidas de campanha citadas na sentença superam a diferença entre receitas e despesas disponíveis no sistema do TSE, totalizando R$ 46.635,00. Foi assinalado que a direção nacional do partido não fez acordo para assumir os débitos, o que poderia livrar o vereador da pendência. Também não há um “cronograma de pagamento”.
“A soma dos valores que atestam as não conformidades é de R$ 81.985. É um valor bastante expressivo, que atinge 27,58% da receita financeira estimável da campanha. Supera, e muito, o percentual de 10% tolerável pela aplicação jurisprudencial dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade”, escreveu o juiz eleitoral, sentenciando pela rejeição das contas e pela devolução do valor ao Tesouro Nacional.
O caso já tramita em segunda instância, no Tribunal Regional Eleitoral (TRE), corte em que Bobadra ingressou com pedido liminar para que fosse autorizado a pagar R$ 43.153,68 ao “suposto credor de campanha”, redigiu em despacho o desembargador eleitoral Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz.
No dia 11 de fevereiro, Thompson Flores rejeitou o pedido da defesa de Bobadra com a argumentação de que “a obrigação de efetuar o recolhimento da importância a que foi condenado na sentença apenas será exigível após o trânsito em julgado da decisão”. O desembargador ainda ressaltou que “os débitos de campanha devem ser adimplidos até a data da apresentação das contas, o que inviabiliza o reconhecimento da probabilidade do direito para autorizar o recolhimento da importância em sede recursal”.
De acordo com a legislação, mesmo que a reprovação das contas seja mantida até o trânsito em julgado, Bobadra não ficará inelegível. A exigência legal é que faça o recolhimento dos valores determinados ao Tesouro Nacional para assegurar a quitação eleitoral.
Contraponto
O que diz Lucas Hanisch, advogado do vereador Alexandre Bobadra
Sobre a contratação da empresa de vigia
“Acredito que deve ter ocorrido um erro no lançamento da prestação de contas. O PSL estadual fez de maneira unificada a prestação de contas. Uma empresa fez para os candidatos do Estado todo. O que deve ter ocorrido: um erro no lançamento. Em sede de recurso, juntamos cópia do contrato, as fotos das pessoas trabalhando e os recibos da empresa para as pessoas. A gente juntou todo o conjunto probatório. Está bem demonstrada a questão desta empresa, ela foi contratada para serviço de panfletagem.”
Sobre o cheque não cruzado de R$ 1,6 mil
“Nós juntamos a microfilmagem do cheque. Em primeiro grau, o juiz afirma que não tem como se ter certeza de que a pessoa que recebeu o cheque foi a que sacou porque não estava cruzado, e a norma diz que o cheque deve ser cruzado. Como a pessoa não tinha conta bancária, houve um equívoco da equipe de não cruzar o cheque, mas a microfilmagem mostra que quem sacou o cheque na boca do caixa foi a mesma pessoa a quem ele era nominal. Acredito que, em sede de recurso, será sanado este ponto.”
Sobre as dívidas de campanha de R$ R$ 46.635
“Se o candidato não arca com suas contas de campanha até a data final da prestação de contas, pela lei eleitoral somente quem pode assumir este compromisso é o diretório nacional do partido. A gente sabe que não é assim para um diretório nacional assumir débitos. Bobadra inseriu poucos recursos pessoais na campanha e ele tinha disponível a quantia de R$ 43 mil. Pedi liminarmente que liberassem ele, a cobrir do próprio bolso, o valor que fica dentro do limite de gasto pessoal. O nosso entendimento é de que, provavelmente, o partido, na esfera nacional, não vá assumir essa dívida. E como já encerrou o prazo para ele adimplir, não tem outra alternativa senão a Justiça Eleitoral autorizar ele a adimplir isso. A nossa discussão neste processo vai adentrar forte neste questionamento: por que só o partido pode adimplir se o candidato tem recursos disponíveis e tem margem disponível conforme a lei eleitoral? A reprovação das contas eu acredito que seja revertida para aprovação com ressalvas.”