O Ministério Público Eleitoral (MPE) ingressou com representação judicial solicitando a cassação de mandato do vereador Alexandre Bobadra (PSL), de Porto Alegre, por supostas irregularidades praticadas na corrida eleitoral de 2020, incluindo possível uso ilegal de verbas públicas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (Fefc).
A Promotoria de Justiça Eleitoral, que subscreve a peça, argumenta que Bobadra, estreante na Câmara e único integrante da bancada do PSL em Porto Alegre, agiu com “má-fé”, o que teria “maculado a lisura do pleito em benefício próprio”.
A representação tem data impressa no documento de 19 de fevereiro, mas sua assinatura digital na Justiça Eleitoral é desta quinta-feira (4), na 158ª Zona Eleitoral de Porto Alegre, que ficará responsável pelo julgamento. Em primeiro grau, a Justiça Eleitoral já reprovou a prestação de contas de campanha de Bobadra e determinou a devolução de R$ 81.985 ao Tesouro Nacional pelos mesmos motivos elencados no pedido de cassação.
A defesa de Bobadra avalia que o requerimento de perda de mandato será arquivado por supostamente ter caráter “intempestivo”, ou seja, ter sido apresentado oficialmente fora do prazo legal. No mérito, a avaliação é de que as acusações podem ser revertidas (veja contraponto na íntegra ao final).
A representação descreve três supostas ilegalidades que teriam sido praticadas pelo parlamentar durante o pleito. A primeira delas foi a contratação da empresa Siar Serviços de Portaria e Limpeza, localizada no Centro de Porto Alegre, para a prestação de serviços de vigia, conforme consta na nota fiscal, com pagamento de R$ 33.750. Por esse valor, a Siar foi contratada para atuar por 10 dias, de 5 a 14 de novembro de 2020. O entendimento é de que o serviço de “vigia”não é previsto pelas normas eleitorais dentre os gastos de campanha.
“Não houve esclarecimentos e justificativas plausíveis quanto à utilização deste tipo de serviço, que é incompatível com os gastos permitidos na campanha eleitoral, em verdadeira afronta”, diz a representação do MPE.
Tanto no sistema de prestação de contas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) quanto na nota fiscal emitida pela empresa, a contratação é descrita para fins de “vigia”. Contudo, posteriormente, a defesa de Bobadra apresentou um contrato em que a relação entre a campanha e a Siar, que atua nos ramos da vigilância, portaria e limpeza, era descrita como prestação de serviços de panfletagem para o então candidato.
A segunda suposta irregularidade descrita pelo MPE foi o pagamento com recursos de campanha a uma pessoa física, no valor de R$ 1,6 mil, com cheque que não estava cruzado. Essa é uma norma da legislação eleitoral para permitir a identificação dos sacadores do dinheiro na boca do caixa.
O terceiro apontamento refere-se à dívida de campanha deixada por Bobadra. Pelo Fundo Especial de Financiamento de Campanha (Fefc) ele arrecadou R$ 280 mil, acrescidos de R$ 17,2 mil de pessoas físicas, mas o então candidato teve dispêndios maiores e deixou pendências no valor de R$ 46.635. A representação do MPE diz que os débitos em aberto são de “gastos com publicidade”. Pela legislação, o diretório nacional do PSL deveria ter assinado um acordo para assumir o passivo, com apresentação de um cronograma de pagamento, mas isso não ocorreu.
“Houve verdadeira ilegalidade na forma com que o representado gastou os recursos de campanha, marcada pela má-fé do candidato, visando macular a lisura do pleito em benefício próprio. (...) No caso em apreço, ocorreu uma quebra no princípio da isonomia e igualdade entre os candidatos, na medida em que muitos dos gastos do representado estão em desacordo com as normas vigentes, em afronta, também, ao princípio da moralidade”, diz o MPE.
Bobadra é policial penal, denominação mais recente para os agentes penitenciários, e foi eleito em 2020 para a Câmara de Vereadores com 4.703 votos.
CONTRAPONTO
O advogado Lucas Hanisch, defensor do vereador Alexandre Bobadra (PSL), diz que a ação do MPE é “intempestiva”. Ele argumenta que o prazo limite para pedidos de cassação de mandatos era 1º de março de 2021, mas o MPE protocolou a representação na Justiça Eleitoral no dia 4. Por isso, ele avalia que o caso será arquivado.
No mérito, Hanisch avalia que os três itens que pesam contra Bobadra serão revertidos. Veja abaixo o que diz o advogado do vereador, na questão de mérito, para cada um dos três itens em discussão.
Sobre a contratação da empresa de vigia
“Acredito que deve ter ocorrido um erro no lançamento da prestação de contas. O PSL estadual fez de maneira unificada a prestação de contas. Uma empresa fez para os candidatos do Estado todo. O que deve ter ocorrido: um erro no lançamento. Em sede de recurso, juntamos cópia do contrato, as fotos das pessoas trabalhando e os recibos da empresa para as pessoas. A gente juntou todo o conjunto probatório. Está bem demonstrada a questão desta empresa, ela foi contratada para serviço de panfletagem.”
Sobre o cheque não cruzado de R$ 1,6 mil
“Como a pessoa não tinha conta bancária, houve um equívoco da equipe de não cruzar o cheque, mas a microfilmagem mostra que quem sacou o cheque na boca do caixa foi a mesma pessoa a quem ele era nominal. Acredito que será sanado este ponto.”
Sobre as dívidas de campanha de R$ R$ 46.635
“Se o candidato não arca com suas contas de campanha até a data final da prestação de contas, pela lei eleitoral somente quem pode assumir este compromisso é o diretório nacional do partido. A gente sabe que não é assim para um diretório nacional assumir débitos. O nosso entendimento é de que, provavelmente, o partido, na esfera nacional, não vá assumir essa dívida. E como já encerrou o prazo para ele adimplir, não tem outra alternativa senão a Justiça Eleitoral autorizar ele a adimplir isso. A nossa discussão neste processo vai adentrar forte neste questionamento: por que só o partido pode adimplir se o candidato tem recursos disponíveis e tem margem disponível conforme a lei eleitoral? ”