Para o coordenador da Lava-Jato no Paraná, procurador da República Deltan Dallagnol, um discurso contra as forças-tarefas tem ganhado relevo. A afirmação ocorreu nesta quinta-feira (2), em entrevista ao Timeline, e vem na esteira da notícia de uma inspeção feita por uma pessoa da Procuradoria-Geral da República (PGR), que teria encontrado gravadores de voz no local de trabalho dos procuradores da Operação. Após, surgiram boatos de que a força-tarefa teria três aparelhos guardiões, dos quais dois teriam desaparecido.
— O que eu vejo é surgir um discurso interno para acabar com as forças-tarefas. (...) a quem interessa essa criação dos fake news, a criação desse discurso de gerar um ambiente propício para acabar com a força-tarefa? Nós entendemos que o combate à corrupção precisa continuar — defende, lembrando que, na quarta-feira (1), o procurador-geral da República, Augusto Aras, tirou a exclusividade de atuação dos colegas da força-tarefa Greenfield.
— Eles vieram aqui, surgiu essa história que não tem pé nem cabeça aí, em seguida, no domingo, o procurador-geral vem falar que as forças-tarefas são "órgãos clandestinos", chama quase de ilegal. Sendo que ele quem prorrogou a força-tarefa. Então, o que ele tá fazendo é coisa ilegal? — questiona.
Sobre os aparelhos, Dallagnol afirmou que são apenas gravadores de voz, comprados por licitação pública, no valor de R$ 15 mil. De acordo com ele, serve para gravar os ramais quando solicitado pelo dono, usualmente em casos de ameaças. Um guardião, por outro lado, pode ser usado para interceptar ligações, e custa mais de R$ 1 milhão. Para isso, ressaltou o procurador, é necessário, porém, que as empresas telefônicas desviem chamadas, o que é feito somente mediante ordem judicial.
Ouça, abaixo, a entrevista na íntegra:
Bolsonaro e a luta contra a corrupção
Embora o presidente Jair Bolsonaro tenha erguido a bandeira contra a corrupção durante sua campanha eleitoral e defendido o trabalho da Lava-Jato, atualmente o chefe do Executivo nacional não está apoiando, por exemplo, a questão da prisão após a segunda instância. Questionado se sentia-se enganado, diante da diferença entre as promessas durante as eleições e a realidade que se põe no momento, o procurador afirmou que nunca esperou nada de Bolsonaro.
— Eu não fui enganado porque eu nunca esperei nada dele. Vários políticos quando querem voto, quando querem se eleger, eles vão falar o que a população quer escutar (...) E é natural que, num contexto em que a sociedade está indignada contra a corrupção, vários políticos fizessem esse discurso — avalia.
— Onde que estava o atual presidente quando a Lava-Jato começou? Onde que estava quando já se desenvolveu? Onde estava quando sofreu ataques de diferentes lugares? Onde estava quando propomos as 10 medidas contra a corrupção e foi enterrado no Congresso? A gente até compreende que ele tenha feito esse discurso, mas a gente precisa que esse discurso seja mais do que palavras. Depois que ele assume, onde está o compromisso com as reformas contra a corrupção? — questiona.
Ainda assim, Dallagnol afirmou que o principal lugar para que as mudanças e a luta contra a corrupção se instaurem é dentro do Supremo e do Congresso. Afirmou que, a seu ver, estão "devendo nos últimos anos" no tocante ao combate à corrupção.
— Agora, embora eu faça críticas às instituições, eu não estou pregando de forma nenhuma, e ninguém deve pregar, o fechamento das instituições. É delas que depende a nossa democracia, a nossa liberdade. A gente deve, sim, criticar, mas para aperfeiçoar as instituições — defende.
Maia e Alcolumbre ocultados
O coordenador da Lava-Jato também comentou sobre a denúncia de que os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, teriam seus nomes camuflados em uma denúncia da Procuradoria da República do Paraná, datada de dezembro de 2019. De acordo com Dallagnol, a denúncia não era contra políticos, mas, sim, de lavagem de dinheiro de mais de R$ 1 bilhão de reais contra pessoas ligadas ao grupo Petrópolis.
— O grupo Petrópolis fazia pagamentos no Brasil por ordem da Odebrecht, em favor da Odebrecht e recebia lá no Exterior, esse era o esquema de lavagem de dinheiro — explica.
— Para comprovar, puxamos todos os pagamentos eleitorais que a Petrópolis fez em favor da Odebrecht. E de onde que a gente puxou ? De sistemas públicos, do TSE. Puxou planilhas de doações feitas por empresas do grupo Petrópolis para políticos que hoje ocupam diferentes cargos públicos. E quando a gente puxou esses pagamentos foram tabelas, planilhas. Isso foi planilhado e essa planilha foi colocada na denúncia, mas alguns campos foram cortados. Em algumas partes dessa tabela, não apareciam os nomes inteiros. — diz.
Dallagnol também afirma que nem o presidente da Câmara, nem do Senado, foram investigados ou acusados nesse caso. Além disso, lembra que a investigação veio para Curitiba por desmembramento do Supremo Tribunal Federal, e que a planilha — pública, do Tribunal Superior Eleitoral — foi enviada pela própria Corte para eles.