Gestada desde o início do governo Eduardo Leite, a proposta de reforma tributária do Estado deve começar a ser apresentada a partir desta terça-feira (14) para deputados, jornalistas e entidades empresariais. Entre os principais pontos de mudança, está a redução do número de alíquotas de ICMS para duas faixas, em um esforço de simplificação do sistema.
Hoje, há cinco percentuais nominais previstos em lei para operações internas no Estado e três para operações interestaduais, mas, devido a alterações feitas ao longo das últimas décadas, o número é bem maior. Na prática, as alíquotas efetivas são inúmeras e dependem da base de cálculo utilizada, entre outros fatores. Na avaliação de Leite, enxugar o modelo facilitará a vida das empresas, tornará mais ágil a administração tributária e eliminará uma série de exceções, que complicam as operações e aumentam a insegurança jurídica.
— O governador apresentou os conceitos gerais para os 12 partidos da base, em reunião na última sexta-feira. A partir daí, ele vai começar, agora, a chamar as entidades representativas e as bancadas para detalhar os planos. O conceito básico é de que nós nos comprometemos a não reeditar o aumento de alíquotas e vamos aproveitar o momento para modernizar nosso sistema tributário — diz Frederico Antunes, líder do governo na Assembleia.
Elaborada por auditores fiscais especializados no tema, a proposta está praticamente pronta desde o início de março, mas acabou ficando em banho-maria nos últimos meses em razão da pandemia. Agora, a avaliação é de que não há mais tempo a perder. Isso porque, para entrar em vigor a partir de janeiro de 2021, a reforma precisa ser aprovada, no máximo, até o fim de setembro (devido à exigência de noventena).
Além de diminuir a quantidade de alíquotas, o texto trará a possibilidade de redução da tributação para pessoas com menor renda e estímulos para a prática de cuidados ambientais e atração de novas tecnologias.
No caso da redução, a ideia do Palácio Piratini é tornar o sistema mais justo para famílias com menos condições financeiras, que sofrem uma pressão fiscal maior, já que os impostos sobre o consumo, como o ICMS, são regressivos (isto é, oneram mais quem tem renda menor). A intenção é de que elas recebam uma espécie de devolução de parte do imposto recolhido. Os detalhes sobre como isso vai funcionar ainda são mantidos em sigilo pelo governo.
É possível que sejam beneficiadas pessoas inscritas no Cadastro Único, que já serve de base ao Bolsa Família. O fato é que algo semelhante também vem sendo discutido no âmbito nacional, nos projetos de reforma tributária que tramitam no Congresso, mas, em termos regionais, se a novidade for aprovada, deverá ser inédita entre os Estados.
Quanto aos estímulos à inovação, no caso do IPVA, por exemplo, a intenção é criar faixas de isenção para incentivar a renovação da frota e a aquisição de veículos sustentáveis ambientalmente. Tudo isso será debatido com os setores. O objetivo de Leite é abrir o tema ao diálogo e, para isso, contará com o apoio do presidente da Assembleia, Ernani Polo.
— A gente ainda não conhece os detalhes da proposta, mas sabemos que vai no caminho da simplificação, o que é positivo. Entendo que é o momento de enfrentarmos esse tema e de olhar para o futuro do Estado. O Rio Grande do Sul precisa retomar a competitividade — afirma Polo.
O grande desafio de Leite será levar adiante uma série de cortes de benefícios e de isenções fiscais, para compensar as perdas. A tendência é de que isso atinja praticamente todos os setores. O mandatário sabe que o assunto será alvo de resistências, mas entende que não há como escapar disso, já que, em 31 de dezembro deste ano, chega ao fim a majoração do ICMS. A tarefa é complexa e delicada.
Vale lembrar que, em 2015, por iniciativa do governo de José Ivo Sartori, a Assembleia aprovou o aumento de algumas alíquotas. Em dezembro de 2018, a pedido de Leite, a ampliação foi prorrogada até o fim de 2020. Em troca, o atual governador se comprometeu a não pedir nova prorrogação e a propor a reformulação do sistema. Chegou a hora de cumprir a promessa. A dúvida, diz um interlocutor próximo, é se, dessa vez, Leite terá o suporte do empresariado, que, na reforma administrativa, foi fundamental.
Por que Leite quer mudar o sistema
Na campanha eleitoral, Eduardo Leite defendeu a prorrogação das alíquotas majoradas de ICMS* até o fim de 2020 e se comprometeu, a partir daí, a reformular o sistema tributário para simplificá-lo e recuperar a competitividade do Estado.
*Alíquotas elevadas
Em 2015, o governador José Ivo Sartori propôs a ampliação da alíquota básica de 17% para 18% e da alíquota sobre produtos e serviços seletivos (como gasolina, álcool e telecomunicações) de 25% para 30%. O pedido foi aprovado na Assembleia, com prazo até 31 de dezembro de 2018, mais tarde prorrogado para 31 de dezembro de 2020.
Qual é a principal dificuldade
Com o fim da majoração, o Estado perderá cerca de R$ 3 bilhões em arrecadação bruta por ano. Desse valor, por lei, 25% ficam com os municípios e 75%, com o governo estadual. Em 2019, isso representou, para o Estado, cerca de R$ 2,2 bilhões, o equivalente 1,8 folha líquida do Executivo. Agora, Leite precisa compensar ao menos parte da perda. Isso virá por meio de cortes em incentivos fiscais.
Como será a proposta
Os detalhes começarão a ser divulgados a partir desta terça-feira (14). O que se sabe até agora é que a proposta inclui:
- Redução de alíquotas de ICMS para no máximo duas
- Corte de incentivos fiscais em praticamente todos os setores
- Diminuição de benefícios sobre produtos de consumo
- Redução da tributação para famílias de baixa renda
- Estímulos para atrair novas tecnologias e práticas que preservem o meio ambiente
ICMS
O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços é o principal tributo estadual. Praticamente todas as operações comerciais têm incidência de ICMS, como a compra de combustível, alimentos, bebidas e de eletrodomésticos e a aquisição de serviços, dos transportes às telecomunicações.
A arrecadação bruta de ICMS do Estado em 2019 foi de R$ 36 bilhões, 80% de toda a receita tributária
Alíquotas de ICMS em vigor no RS
1) Nas operações interestaduais com mercadorias ou prestações de serviços: 4% (sobre produtos importados), 7% ou 12% (dependendo de onde estiver o destinatário).
2) Nas operações internas com mercadorias ou prestações de serviços: 12%, 18%, 20%, 25% e 30%, conforme o produto ou serviço. Esses percentuais podem ser alterados via Assembleia, ao contrário dos índices citados no item 1, sobre os quais o Estado não tem ingerência. É no ICMS sobre operações internas que o governo do Estado deve promover as alterações.