O Judiciário concedeu 48 horas para que o Piratini forneça informações sobre a contratação de um laboratório agropecuário de Pelotas, no sul do Estado, para realizar exames de coronavírus. A decisão foi tomada nesta quinta-feira (16), após pedido de suspensão cautelar do contrato feito pelo Ministério Público (MP).
A solicitação do prazo foi requisitada pelo próprio governo e aceita pelo juiz Murilo Magalhães Castro Filho, da 5ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre. Segundo ele, os questionamentos levantados pelo MP são graves.
“A complexidade da contratação objeto do feito, a gravidade dos questionamentos levantados pelo autor (Ministério Público) e o relevante interesse público acerca da avença torna imprescindível neste momento a oitiva do Estado do Rio Grande do Sul antes de qualquer decisão”, relata o magistrado em trecho do despacho.
Na quarta-feira (15), o MP ingressou com ação civil pública com pedido de suspensão liminar do contrato por 30 dias. Na petição inicial, o promotor Voltaire de Freitas Michel afirma que o prazo é necessário para investigar melhor a escolha do estabelecimento para a realização do serviço.
No processo, o promotor questiona as vistorias feitas por servidores estaduais ao local, que foi atestado como tendo capacidade técnica mesmo antes de ter obedecido a todas as obrigações legais para o funcionamento. Ele também chama atenção para a declaração da secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, de que o laboratório tem "equipe de alto nível":
"É, no mínimo, exagerada, e quiçá, temerária, uma vez que apenas após a celebração do contrato a Agropecuária Machado tomou providências para sua adequação à RDC nº 302/2005, inclusive contratando profissional farmacêutico".
Michel cita ainda que, mesmo diante da pandemia do coronavírus, não é claro o motivo pelo qual o estabelecimento foi o escolhido: "Os movimentos paralelos e simultâneos da empresa a ser contratada e a tolerância do Estado com vários aspectos no mínimo controvertidos a respeito de sua capacidade de cumprir o contrato, assim como o caráter inusitado de um laboratório agropecuário adquirir uma proeminência diante de toda a rede laboratorial clínica privada do Estado, levantam indícios de ação concertada entre agentes públicos e privados, de modo oportunista, diante do relaxamento das regras licitatórias a pretexto da pandemia mundial".
Procurada, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) afirmou que a petição com as explicações será entregue no prazo. A reportagem procurou o sócio-gerente do laboratório, Toni Machado, e aguarda uma manifestação.
250 testes diários
O contrato foi criticado por entidades ligadas à área da saúde. O local se adequou legalmente para as análises somente no dia em que o compromisso foi firmado com o Estado, em 6 de abril, tendo buscado o registro junto ao Conselho Regional de Farmácia (CRF) dois dias depois.
A assinatura ocorreu com dispensa de licitação e, de acordo com a Secretaria Estadual da Saúde (SES), não possui irregularidades, já que foi realizada porque o estabelecimento era o único que possuía os insumos adequados para a ação e após a garantia de que o local possui qualificação técnica. A pasta ainda afirma que as licenças legais já foram expedidas.
De acordo com a SES, laboratórios de universidades e privados foram procurados para reforçar a rede de exames de coronavírus, realizados na rede pública, até então, somente pelo Laboratório Central do Estado (Lacen). Os critérios utilizados para as sondagens não foram divulgados. Arita Bergmann afirma que o laboratório da Agropecuária Machado foi o único que poderia começar a fazer as análises imediatamente.
No contrato, o estabelecimento se compromete em realizar 250 testes diários, com entrega dos resultados em 24 horas, ao custo de R$ 175. O prazo do contrato é de seis meses, podendo ser renovado. Os primeiros 24 testes feitos receberam contraprova do Lacen, com 100% de acerto, segundo a SES.
Em entrevista anterior à decisão judicial, o sócio-gerente do laboratório, Toni Machado, relatou que a equipe é formada por cinco pessoas: uma farmacêutica, uma enfermeira, uma biomédica e dois veterinários com formação em biotecnologia e saúde pública.
Também contou que possui dois equipamentos que utilizam a técnica RT-PCR para análises de biologia molecular. O método é considerado padrão ouro por autoridades sanitárias e oferece a forma mais precisa de identificar se um paciente está com o coronavírus.