Outrora fator de união entre apoiadores do governo, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar atos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) divide a base bolsonarista. Liderada pela cúpula do PSL, partido do presidente, a pressão para desidratar o movimento enfrenta críticas de aliados e já causou uma baixa no partido. Ainda assim, vem tendo sucesso em preservar o Judiciário. Nesta quinta-feira (19), a lista de apoiadores perdeu uma assinatura, reduzindo o grupo a 26 parlamentares, um a menos do que o necessário.
Entre os senadores do PSL, apenas Flavio Bolsonaro (RJ) é contra a CPI da Lava-Toga, com o respaldo do Palácio do Planalto. Ele foi procurado pelo presidente da legenda, Luciano Bivar (PE), para tentar reverter o apoio dos correligionários à iniciativa, o que ampliou o racha na sigla. Selma Arruda (MT), chamada de "Moro de saia", migrou para o Podemos. Major Olímpio (SP) criticou o filho do presidente e sinalizou que poderá seguir o caminho da colega no futuro.
— O partido estava sugerindo a seus membros no Senado que não assinassem a CPI. E eu não assinei. Então, não botem isso também como se fosse eu querendo fazer. Cada senador tem a sua consciência, seu projeto pessoal — disse Flavio, em entrevista ao Canal Terça Livre.
Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) já engavetou dois pedidos de CPI neste ano e tem atuado fortemente contra novas adesões.
Na Câmara, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP) segue os passos do irmão. No último domingo, pelo Twitter, ele compartilhou um vídeo da youtuber Paula Marisa com críticas à CPI. No material, ela afirma que a ação poderia “acabar com a Lava-Jato” e disse acreditar ser mais efetivo lutar pelo impeachment de ministros e o fim da PEC da Bengala, que faria com que magistrados se aposentassem aos 70 anos, e não mais aos 75.
A resposta veio na mesma rede social pelo proponente da Comissão, senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que escreveu a Eduardo: "o sistema está usando o rabo preso da sua família para barrar o combate à corrupção".
À reportagem, o parlamentar disse acreditar que há um acordo entre a família Bolsonaro, o Senado e o STF. Ele acredita que enterrar a Lava-Toga blindaria Flavio de investigações que utilizam dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e abriria caminho para apoio às indicações de Eduardo à Embaixada brasileira nos Estados Unidos e de Augusto Aras à Procuradoria-Geral da República (PGR).
— É um acordão, não tenho a menor dúvida. Tentam confundir uma investigação de ministros do Supremo com ataque à instituição — opina Vieira.
Em maio, Bolsonaro publicou em suas redes sociais um vídeo em que um manifestante grita "Lava-Toga" e é aplaudido pelos demais participantes. No entanto, nas últimas semanas, a família do presidente se aproximou do STF, em especial, do presidente da Corte, Dias Toffoli.
Líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO) é favorável à instalação da CPI, mas discorda que a tentativa governista de abafar o movimento tenha origem em negociações entre os poderes.
— Não existe isso de acordo. Não interessa quem seja, todo mundo tem que ser investigado.
Waldir criticou a posição do ministro do STF Gilmar Mendes que, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo e ao portal Uol, disse que a CPI seria inconstitucional e que o Supremo poderia arquivá-la.
Presidente do PSL gaúcho, o deputado federal Nereu Crispim evita se posicionar em nome do partido no Estado. No entanto, se posiciona contrariamente à instalação da CPI.
— Não é que eu não seja a favor (de investigar), mas temos que preservar as instituições. Desmoralizar os poderes é um perigo à democracia.
Bolsonaristas
Pelas redes sociais, o escritor Olavo de Carvalho — guru da família Bolsonaro — criticou a Lava-Toga, dizendo que a investigação não levaria a nada. Ele conclamou os seguidores a formar uma “militância bolsonarista organizada” e defendeu apoio incondicional ao presidente, independentemente da pauta em discussão.
Já a deputada estadual e autora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, Janaína Paschoal (PSL-SP), assume posição diversa. Para ela, a instalação da CPI não seria inconstitucional e poderia mostrar “outros crimes de responsabilidade e ensejar novos pedidos de impeachment” de ministros.
A defesa mais apaixonada da abertura de investigação é feita por apoiadores da Operação Lava-Jato e do ministro da Justiça, Sergio Moro. O movimento "Vem Pra Rua" chama manifestação em defesa da Lava-Toga para a próxima quarta-feira (25), na Praça dos Três Poderes, em Brasília.
Apoiador de Jair Bolsonaro, o youtuber de direita Nando Moura tem feito duros ataques a Flavio pela atuação contrária à CPI, a quem chamou de “covardão” em um vídeo postado, recebendo apoio de parte dos bolsonaristas. A crítica foi endereçada a uma entrevista que o senador concedeu ao youtuber Allan dos Santos, do canal de direita Terça Livre, onde defende barrar a investigação.
Lava-Toga
O pedido para a criação de uma CPI que investigue atos do STF é focada na instalação de inquérito pela Corte para investigar a proliferação de fake news dirigidas contra magistrados. O senador Alessandro Vieira, proponente do colegiado, afirma que houve ilegalidades na condução das apurações.