Para evitar invasões de hackers, o presidente Jair Bolsonaro recebeu, quando assumiu o mandato, um telefone criptografado, mas ele segue utilizando um telefone comum. Nesta quinta-feira (25), o Ministério da Justiça, sob o comando de Sergio Moro, informou que aparelhos celulares utilizados por Bolsonaro também foram alvo de ataques do grupo de supostos hackers presos dois dias antes pela Polícia Federal.
Em conversas reservadas, Bolsonaro reclama que o aparelho protegido é pouco prático, uma vez que ele não permite a instalação de aplicativos como WhatsApp, Telegram, Twitter e Instagram.
A Agência Brasileira de Tecnologia (Abin) vem tentando convencer Bolsonaro a adotar apenas o aparelho criptografado. Sem sucesso, ela estuda agora desenvolver uma nova tecnologia, segundo relatos feitos à reportagem.
A ideia é tornar o dispositivo mais operacional, com um aplicativo de mensagens próprio que seja mais moderno. A avaliação do setor de inteligência é de que o Telegram e o WhatsApp não são totalmente confiáveis.
O telefone criptografado, chamado Terminal de Comunicação Segura (TCS), só permite a comunicação criptografada com outros aparelhos similares, que são distribuídos apenas a integrantes do alto escalão.
Em junho, em café da manhã com jornalistas, Bolsonaro disse que optou por não utilizar o telefone criptografado, apesar das recomendação, e afirmou que não tem nada a esconder. No início deste mês, após posse do novo diretor-geral da Abin, o presidente chegou a dizer que estava "com a consciência tranquila".
— Estou com o mesmo telefone e não tenho sistema criptografado nenhum. Se invadir, pode achar uma piada, uma brincadeira — acrescentou em julho, em visita à sede da Abin.
Nos Estados Unidos, quando assumiu o cargo, Barack Obama foi aconselhado pelo serviço secreto a não utilizar mais seu telefone pessoal, um BlackBerry. Ele, contudo, insistiu no aparelho, o que obrigou o governo americano a instalar uma encriptação intensificada no celular.
O Planalto já foi alvo de espionagem em outra ocasião. Em 2015, o site WikiLeaks revelou que a Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA, na sigla em inglês) espionou a então presidente Dilma Rousseff. Segundo ele, 29 telefones de assessores presidenciais foram grampeados. Na época, Dilma criou até mesmo uma rede de e-mails exclusiva do Palácio do Planalto para melhorar a segurança.
A operação da Polícia Federal deflagrada na terça (23) mirou supostos hackers que teriam invadido celulares de autoridades, como o ministro Moro e o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol.
Foram presos Walter Delgatti Neto, Gustavo Henrique Elias Santos, Suelen Priscila de Oliveira e Danilo Cristiano Marques. Os quatro são originários de Araraquara (SP), mas moravam em cidades diferentes. As ordens de prisão foram cumpridas em São Paulo, Araraquara e Ribeirão Preto (SP). Eles foram transferidos para Brasília.
Nesta quarta-feira (24), Moro comemorou a ação da PF e associou o grupo preso à divulgação, pelo site The Intercept Brasil, de mensagens que mostram interferência do ex-juiz da Lava-Jato nas investigações da força-tarefa da operação.
Não há, até o momento, indícios tornados públicos de relação entre a ação dos supostos hackers e a divulgação de mensagens privadas de procuradores da Lava-Jato e do ex-juiz Sergio Moro.
Essa conexão indicada por Moro, por exemplo, não foi citada na decisão do juiz federal Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal do Distrito Federal, que autorizou as prisões dos suspeitos.
Os responsáveis pelo The Intercept Brasil disseram, por sua vez, que não fazem comentários sobre as suas fontes. Os diálogos foram revelados pelo site The Intercept Brasil e têm sido publicados por diversos veículos, incluindo o jornal Folha de S.Paulo.
Entenda a operação
Qual o resultado da operação da PF?
Nesta terça (23), quatro pessoas foram presas sob suspeita de hackear telefones de autoridades, incluindo Moro e Deltan. Foram cumpridas 11 ordens judiciais, das quais sete de busca e apreensão e quatro de prisão temporária nas cidades de São Paulo, Araraquara (SP) e Ribeirão Preto (SP). Os quatro presos foram transferidos para Brasília, onde prestariam depoimento à PF
As prisões têm relação com as mensagens trocadas entre Moro e procuradores da Lava-Jato divulgadas desde junho pelo site The Intercept Brasil?
A investigação ainda não conseguiu estabelecer com exatidão se o grupo sob investigação em São Paulo tem ligação com o pacote de mensagens. Também não há provas de que os diálogos, enviados ao Intercept por fonte anônima, foram obtidos a partir de ataque hacker
Como a investigação começou?
O inquérito em curso foi aberto em Brasília para apurar, inicialmente, o ataque a aparelhos de Moro, do juiz federal Abel Gomes, relator da Lava-Jato no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), do juiz federal no Rio Flávio Lucas e dos delegados da PF em São Paulo Rafael Fernandes e Flávio Reis. Segundo investigadores, a apuração mostrou que o celular de Deltan também foi alvo do grupo
Quando Moro foi hackeado?
Segundo o ministro afirmou ao Senado, em 4 de junho, por volta das 18h, seu próprio número lhe telefonou três vezes. Segundo a Polícia Federal, os invasores não roubaram dados do aparelho. De acordo com o Intercept, não há ligação entre as mensagens e o ataque, visto que o pacote de conversas já estava com o site quando ocorreu a invasão.