BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O grupo de trabalho criado pelo ministro Dias Toffoli no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para avaliar a conduta de juízes em redes sociais propôs uma resolução que orienta magistrados a se abster de falar com as partes dos processos e evitar interações tanto com escritórios de advocacia como com o Ministério Público.
A proposta, que ainda precisa ser aprovada pelo CNJ para começar a vigorar, também proíbe magistrados de criticar na internet decisões ou votos de outros membros do Judiciário e veda que juízes opinem sobre processos pendentes de julgamento.
"[Recomenda-se] evitar interações pessoais que possam suscitar dúvidas em relação a sua integridade, idoneidade ou imparcialidade de julgamento, especialmente com outros profissionais da justiça, tais como escritórios de advocacia, membros do Ministério Público ou partes em processos judiciais", diz o texto.
A recomendação vem em meio à divulgação de mensagens entre o atual ministro da Justiça, Sergio Moro, e membros da força-tarefa da Lava Jato. Na época das conversas, Moro era juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelos processos da operação.
Segundo o coordenador do grupo de trabalho do CNJ, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, as proibições adaptam para as redes sociais o conteúdo de leis como a Lei Orgânica da Magistratura e o Código de Ética da Magistratura.
Os resultados foram apresentados ao CNJ na terça-feira (25), com o voto de Corrêa da Veiga pela aprovação do ato normativo. O conselheiro Valdetário Monteiro (indicado ao CNJ pela OAB) pediu para adiantar seu voto e acompanhou Corrêa da Veiga.
A discussão sobre a resolução será retomada em agosto. O CNJ tem 15 membros.
Juízes que já possuírem páginas ou perfis em redes sociais terão de adequá-las às exigências da resolução em até seis meses depois da publicação da norma, se aprovada.
"Não basta que o juiz seja correto, mas deve também parecer correto, afastando qualquer desconfiança razoável", disse Corrêa da Veiga.
Ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho), ele citou na sessão o exemplo de outros países que adotam códigos de conduta para magistrados, como a Escócia, que recomenda que juízes não se registrem em redes sociais, e a França, que veda comentários sobre decisões de colegas.
O artigo mais extenso do ato normativo proposto traz recomendações de conduta sobre temas como identificação nas redes, utilização de pseudônimo, utilização de marca ou logomarca da instituição e sobre o teor das declarações.
São proibidas, por exemplo, manifestações políticas --excluindo discussões sobre projetos de lei que estejam em debate público-- ou que revelem racismo, LGBT-fobia e misoginia.
É vedado, segundo o texto, "emitir opinião que demonstre engajamento em atividade político-partidária ou manifestar-se em apoio ou crítica públicos a candidato, lideranças políticas ou partidos".
Os juízes também devem evitar, conforme a proposta, a autopromoção, a superexposição e debates ou discussões acaloradas nas redes sociais.
Em outro trecho, a proposta de resolução diz que juízes devem se abster "de compartilhar conteúdo ou a ele manifestar apoio sem convicção pessoal sobre a veracidade da informação, evitando a propagação de notícias falsas (fake news)" e que deve "avaliar, antes de compartilhar conteúdo ou a ele manifestar apoio, se não há, ainda que de forma subliminar ou implícita, discurso discriminatório, de ódio, ofensivo, difamatório, obsceno, imoral, ilegal ou que viole direitos humanos ou direitos de terceiros".
Em março de 2018, logo após o assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL), a desembargadora Marilia Castro Neves, do Tribunal de Justiça do Rio, publicou em uma rede social comentário seguido de uma notícia falsa dizendo que a parlamentar assassinada estava "engajada com bandidos". Há contra a magistrada no CNJ três reclamações disciplinares e um pedido de providências por conta de seu comportamento nas redes --ela também publicou crítica a uma professora com síndrome de Down.
Em outro artigo, o texto recomenda aos juízes que não exponham informações profissionais e pessoais desnecessariamente, por razões de segurança. Há também um capítulo específico prevendo aulas de capacitação para uso das redes sociais nas escolas de formação de magistrados.
Na sessão de terça (25), Toffoli mencionou o projeto de lei que criminaliza o abuso de autoridade cometido por juízes e membros do Ministério Público, que estava na iminência de ser votado no Senado --o texto foi aprovado na quarta (26) e vai à Câmara. Entre as condutas de juízes sujeitas a punição estão comentários sobre processos em andamento.
Para o ministro, era preciso mostrar que os sistemas de controle do próprio Judiciário funcionam, para que outros Poderes não adotem medidas como a do projeto de abuso de autoridade. Parte dos membros da magistratura critica a iniciativa de criar normas impositivas para a conduta nas redes sociais.