Ao admitir a recriação de dois ministérios historicamente comandados por políticos, o governo Jair Bolsonaro indica disposição de negociar com o Congresso. O movimento agrada a partidos do centrão, sedentos por espaço na Esplanada.
Além disso, a manobra pretende atenuar a fúria de parlamentares que defendem o retorno do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para a área econômica, reduzindo o poder de Sergio Moro, ministro da Justiça e Segurança Pública e atual responsável pelo órgão.
Nesta quarta-feira (8), a comissão que analisa a medida provisória da reforma administrativa — que reduziu o número de ministérios de 29 para 22 —, deverá votar as mudanças propostas pelo líder do governo no Senado e relator do texto, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).
Caso sejam aprovadas, ainda terão que passar pelo crivo de deputados e senadores em plenário.
Entre as principais alterações, está a divisão do Ministério do Desenvolvimento Regional, com a recriação de duas pastas. A das Cidades, criada no primeiro governo petista, poderia voltar para seus tradicionais ocupantes do PP. O presidente da sigla, senador Ciro Nogueira (PI), confirmou que o ex-ministro Alexandre Baldy teria apoio para assumir o posto.
Baldy, que ocupa a Secretaria de Transportes Metropolitanos do governo paulista, é próximo ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). No entanto, não desfruta de bom trânsito entre caciques do centrão e é classificado como “protegido de Maia” por um dos líderes do PP.
O ministério, responsável na origem por iniciativas como os programas de Aceleração do Crescimento e Minha Casa Minha Vida, contava com um dos maiores orçamentos da Esplanada e era responsável pela interlocução com as prefeituras por meio de parlamentares.Também seria recriada a pasta da Integração Nacional, mantendo o ministro que atende atualmente pelo Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, no comando.
Queda de braço em torno da posse do Coaf continua
Para evitar críticas de que estaria aumentando o número de ministérios — na campanha eleitoral, Bolsonaro afirmou que teria apenas 15 pastas, mas elevou o número para 22 no início do mandato —, o Planalto deverá retirar o status de ministério do Banco Central (BC) assim que a MP da reforma administrativa for aprovada. Quanto à autonomia do BC, a expectativa do Ministério da Economia é de aprovação até o final do ano.
Após pacificar esse ponto, o governo trabalha para evitar que o Congresso recoloque o Coaf na área econômica do governo. O órgão, que analisa movimentações financeiras, foi deslocado no começo do ano para o Ministério da Justiça a pedido de Moro.
Congressistas reclamam que a manutenção do Coaf na Justiça poderia levar a uma caça às bruxas por parte do ex-juiz, com investigações recorrentes contra parlamentares. Entre as críticas, está o fato de que, com exceção da Suíça, em todos os outros países o controle de movimentações financeiras fica a cargo da Economia.
— Manter o Coaf na Justiça é uma medida casuística. Ela foi feita para Moro e não para o Brasil — reclama um dos líderes do centrão.
Na votação prevista para esta quarta-feira, deputados deverão apresentar uma emenda para enviar o Coaf para a pasta de Paulo Guedes. O movimento é liderado pelo líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), com apoio da oposição.
Além da questão financeira, há grupo contrário à separação da política indigenista. Pela proposta do governo, a Fundação Nacional do Índio (Funai) iria para a Justiça, mas a demarcação de terras indígenas ficaria a cargo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), subordinado à Agricultura.
— Não existe cultura indígena sem a vinculação com a terra. Estão fatiando esses direitos – opina o deputado Alexandre Padilha (PT-SP).
Ao todo, parlamentares apresentaram 541 emendas à proposta de alteração no número e atribuições dos ministérios. Apenas 17 foram aceitas pelo relator, que espera aprovar seu parecer por “um ou dois votos”. Entre as demandas recusadas, estão a recriação dos ministérios do Trabalho, da Segurança Pública e da Cultura.
Principais pontos
Ministérios - O governo quer desmembrar o Ministério do Desenvolvimento Regional em duas pastas: Cidades e Integração Nacional. A intenção é melhorar a articulação política e o recebimento de demandas parlamentares. Para manter o primeiro escalão com 22 pastas, o Banco Central deverá perder status.
Coaf - Órgão responsável por analisar movimentações financeiras, foi deslocado para o Ministério da Justiça e Segurança Pública a pedido de Sergio Moro. O Planalto defende a permanência na pasta. Mas deputados do centrão e oposição querem o retorno para a pasta da Economia, sob a justificativa de evitar o risco de caça às bruxas.
Índios - O governo defende o retorno da Fundação Nacional do Índio (Funai), que havia sido deslocado para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, para a Justiça e Segurança Pública. Mas segue sem consenso o fato de deixar as demarcações de terras indígenas com a Agricultura.
Registro Sindical - A área sairá do Ministério da Justiça e Segurança Pública e integrará a pasta da Economia. Também ficarão a cargo do ministro Paulo Guedes as definições sobre cooperativismo e associativismo urbano e política de imigração laboral.
Veto a auditores fiscais - A proposta é proibir que auditores fiscais da Receita Federal possam investigar crimes não fiscais. A justificativa seria a busca por maior segurança jurídica sobre o tema.