Tão logo assinou o termo de posse, Eduardo Leite (PSDB) fez do seu primeiro discurso à frente do Executivo uma convocação cívica em prol da retomada do desenvolvimento no Estado. Da tribuna da Assembleia Legislativa, durante 26 minutos ele pregou a necessidade de uma "nova equação política" para enfrentar a crise financeira que legou ao Rio Grande do Sul um passivo superior a R$ 100 bilhões.
Diante de políticos de diferentes matizes ideológicos e dos chefes dos demais poderes do Estado, o tucano afirmou quer o "novo futuro" que tomava posse com ele exige "convergências construtivas" e que é preciso "aproveitar a mudança de era para mudar o jeito de governar".
— Esse novo momento exige novas formas de fazer. Não podemos mais ficar parados no tempo, porque sequer temos mais tempo — salientou.
A pressa do novo governo já havia se manifestado mais cedo. Antes mesmo do horário marcado para a solenidade, o presidente da Assembleia, Marlon Santos (PDT), abriu os trabalhos e conduziu Leite até o plenário da Casa. Vestindo terno cinza, camisa branca e gravata bordô, o novo governador acenou para a família, disposta na primeira fileira de poltronas, antes de ouvir de Marlon que o povo gaúcho está "cansado de bravatas, doidices e loucuras". Em sua saudação ao tucano, o deputado pediu um voto de confiança ao novo governo.
— Se cada um não fizer sua parte, não vai dar certo o governo — vaticinou o pedetista.
A manifestação prévia abriu caminho para a mensagem que Leite pretendia impregnar no local onde são tomadas as mais importantes decisões políticas do Estado. Após citar cinco vezes a palavra convergência e defender o rompimento definitivo com a "polarização inútil" e a "ideologização das pautas", Leite afirmou que o bom confronto é o do "bem comum contra os grupos de interesses".
A expressão introduziu o recado seguinte, destinado aos membros dos demais poderes que, no fim de 2018, aprovaram gastos milionários na folha de pagamento. Sem precisar fazer referência aos 36 meses de atrasos nos salários impostos exclusivamente aos servidores do Executivo, o governador invocou todos a participarem dos esforços fiscais.
Não é justo que o esforço seja só de alguns quando todos compartilham do mesmo território e da mesma realidade. Quanto mais comprometimento de todos, mais rápido mudaremos o Rio Grande, mais fortes sairemos desta crise.
Para ilustrar o "dramático quadro fiscal", Leite fez um balanço contábil das dívidas do Estado. Ao destacar que o governo tem uma das piores situações financeiras do país, disse que o Rio Grande não cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal. Enumerou um débito de quase R$ 30 bilhões com precatórios atrasados e saques dos depósitos judiciais ainda não cobertos, além de outros R$ 70 bilhões em financiamentos devidos à União e bancos.
— A conta chegou e foi gerenciada no limite por uma série de improvisos e soluções extraordinárias — alertou.
O governador citou ainda o déficit de R$ 4 bilhões previsto para 2019, as duas folhas de pagamento em atraso (dezembro e o 13º) e as dívidas com fornecedores. Para o combate inaugural à penúria, Leite edita nesta quarta-feira (2) sete decretos de contenção de gastos, envolvendo corte no custeio e nas despesas com pessoal. Eles serão anunciados pela manhã, após a primeira reunião geral do secretariado no Palácio Piratini. O governador também afirmou que haverá um choque emergencial nas contas públicas e um pacote de reformas estruturantes a ser apresentado ainda nos 100 primeiros dias de gestão.
— O inadiável ajuste fiscal somente vai ser possível com engajamento e compartilhamento de todos — afirmou, reafirmando que pretende debater as medidas propostas com todos os poderes, o governo federal e a sociedade.
Ao final, Leite fez uma profissão de fé nos pilares da social democracia — "a liberdade, a igualdade, a proteção social e o livre mercado" — e na impessoalidade do governo. Citando que a Assembleia tem 55 deputados de 17 partidos diferentes, defendeu a construção coletiva de soluções, num Rio Grande "em que quase não se perceba de quem "partiu uma iniciativa".
Eu não quero ter razão, eu não quero autoria, eu não preciso de elogios. Eu quero que os gaúchos melhorem de vida.
Interrompido uma única vez por aplausos, o tucano encerrou o discurso convocando os gaúchos a acreditarem na capacidade de mudança. Findo o ato, atravessou a rua e ingressou pela primeira vez no Palácio Piratini como governador empossado. Aos 33 anos, será o 39º ocupante do mais elevado cargo do Executivo gaúcho, um dos mais jovens e sobre o qual pesa a mais crítica situação financeira da história.