As reviravoltas em torno do pedido de liberdade ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) suscitaram inúmeras dúvidas sobre atribuições e hierarquia na tomada de decisões no processo do petista.
Confira as opiniões de dois especialistas, o professor de direito constitucional da PUCRS Marcelo Peruchin e o ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp.
Desembargador Rogério Favreto poderia ter tomado a decisão de soltar Lula?
Marcelo Peruchin
Em tese, não, por ser um desembargador plantonista. Assim, não poderia decidir monocratimente, não teria condição de afastar uma decisão tomada em colegiado, no caso a 8ª Turma do TRF4.
Gilson Dipp
Pode, porque era desembargador de plantão designado pelo tribunal para os casos mais urgentes.
O caso do triplex já não havia encerrado sua tramitação no TRF4?
Marcelo Peruchin
Sim. Mas a justificativa é que o habeas corpus foi impetrado contra a juíza da execução penal, Carolina Lebbos. Contudo, a decisão de Favreto ofende decisão do próprio TRF4, que determinou a execução provisória da pena, inclusive já assegurada pelo Supremo Tribunal Federal quando negou por 6 a 5 habeas corpus a Lula.
Gilson Dipp
Sim. Tanto que deu certo. Nada impede que ele fosse examinado aqui.
Sergio Moro, juiz de primeira instância, poderia ter desrespeitado o desembargador ao determinar a PF que não solte Lula?
Marcelo Peruchin
Na verdade, o juiz do caso não seria Sergio Moro, mas sim Carolina Lebbos, que cuida da execução penal. No entanto, por entender que Favreto não teria competência para tomar tal decisão, justificou o descumprimento da medida.
Gilson Dipp
Não. Não pode um juiz fazer juízo de valor sobre decisão de um desembargador que está na plenitude de sua competência.
Moro pode despachar mesmo de férias?
Marcelo Peruchin
A princípio, não. Como está em férias, Moro está sem jurisdição. A 13ª Vara Federal inclusive tem juiz substituto. Para proferir decisão, Moro teria de cancelar as férias para recuperar a jurisdição.
Gilson Dipp
É uma questão controvertida. Como ele era juiz natural, veio responder.
Moro pode pedir a manifestação de um desembargador no tribunal?
Marcelo Peruchin
Sim. Por ser o juiz natural da causa e por entender que a decisão do TRF4 de ordenar a prisão de Lula foi descumprida, Moro pode pedir uma manifestação de Gebran, relator do processo no colegiado.
Gilson Dipp
Tudo é embrulhado neste caso. Na verdade, o que cabe de uma decisão supostamente errada é um recurso feito por uma parte. Em tese, só poderia se manifestar o Ministério Público. E ele pede a revogação da liminar ao plantonista.
João Pedro Gebran Neto pode anular decisão de um colega do mesmo nível hierárquico?
Marcelo Peruchin
Sim. Se não fosse em regime de plantão, o pedido de habeas iria naturalmente para apreciação de Gebran, por ser o relator do caso no TRF4.
Gilson Dipp
Não. O fato de ser relator não lhe dá poderes maiores que um desembargador de igual hierarquia e que está de plantão, portanto apto a decidir.
Quem de fato pode soltar Lula?
Marcelo Peruchin
Como se trata de pedido de liminar em habeas, só o Superior Tribunal de Justiça (STJ), já que a prisão havia sido determinada pelo TRF4.
Gilson Dipp
Os órgãos hierárquicos competentes. O TRF4, o STJ ou o STF.
Favreto poderia cassar a decisão de Gebran?
Marcelo Peruchin
Não. Como já havia posição do relator do processo chamando para si a decisão, o desembargador plantonista não tem mais jurisdição no caso.
Gilson Dipp
Sim, porque como desembargador plantonista seria desmoralizado caso sua decisão fosse descumprida.