Quando chegar à sede da Polícia Federal (PF) em Curitiba para dar início ao cumprimento de sua pena, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não deve ser visto com mãos atadas por algemas, muito menos acorrentado pelos tornozelos. A possibilidade de repetição de uma cena com ares medievais, vivida pelo ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB-RJ) no início do ano, foi vetada pelo juiz Sergio Moro nesta quinta-feira (5), quando determinou a expedição do mandado de prisão.
No despacho, o magistrado disse que é "vedada a utilização de algemas em qualquer hipótese". Sua posição vai ao encontro da orientação da mais alta corte do país.
— O uso de algemas é degradante. (A restrição) é para preservar a dignidade e os direitos humanos, evitando uma exposição desnecessária — analisa o professor de direito penal André Callegari, do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
O especialista acrescenta que, embora o juiz não precisasse dizer isso, teve atitude coerente:
— Até como advertência, para que se padronize.
A opinião de Callegari está calcada em uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2008, que expressou só ser lícito "o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia". Na época, o então presidente do colegiado, ministro Gilmar Mendes, justificou:
— O juízo geral é de que está havendo uma exposição excessiva, degradante, afrontosa à dignidade da pessoa humana, e o Tribunal então se sentiu no dever de se pronunciar com a celeridade adequada sobre este tema, no interesse geral.
Ao ser transferido do Rio para o Paraná em janeiro, Cabral estava algemado nos pulsos e nos tornozelos. Além de a medida receber críticas de juristas de renome — como José Roberto Batochio e Lenio Streck —, motivou um pedido de explicações de magistrados que atuam na Operação Lava-Jato. O próprio Moro ressaltou que se evite "o uso conjunto de algemas em pés e mãos salvo casos de maior necessidade". A PF contrapôs dizendo que "tudo foi realizado dentro dos parâmetros e do protocolo de segurança".