O brasileiro ávido por mudança está bem servido em 2018. De olho na disputa eleitoral, movimentos de renovação proliferam sob a promessa de romper com a política tradicional e o derretimento ético no país implodido pela Lava-Jato. Há para todos os gostos: do eleitor ligado à direita ao alinhado à esquerda – ou mesmo àquele desiludido com a polarização.
Pouco importa a ideologia individual. Eles querem oxigenar o poder.
Em comum, colocam-se como grupos suprapartidários de pessoas distantes do cenário político, financiados pelo meio empresarial e de discurso progressista e liberal em sua maioria. Um estudo que mapeia iniciativas na América Latina identificou 18 movimentos de inovação política no Brasil até o ano passado. Hoje, o Instituto Update, responsável pela pesquisa, estima que mais uma dezena já tenha aparecido.
— Existe um passo sendo dado pela cidadania e pelas pessoas interessadas em contribuir com a política eleitoral e institucional. Esses movimentos servem como um suporte para as pessoas que não se identificam com a forma tradicional de fazer política e não encontram espaço dentro dos partidos e das instituições tradicionais — diz o pesquisador Rafael Poço, fundador do Update.
Como startups políticas, os grupos buscam se apresentar sob a forma de respiro de novidade ou, ao menos, de boa vontade em meio ao desgaste. Nascidos em 2016, no agudo da crise, estruturaram-se em 2017 e, agora, consolidam-se para lançar candidatos nas eleições proporcionais – seriam ao menos 500, segundo levantamento da Folha de S.Paulo.
Para participar, Acredito, Agora, Bancada Ativista, Brasil 21, Frente Favela Brasil e outros pretendem se valer de partidos como espécie de incubadores de seus candidatos. Os diálogos caminham avançados com PSB, PPS, Rede e Novo para que, em 2019, tenham um deputado para chamar de seu.
— Vivemos um momento de polaridades, mas acreditamos no diálogo ao partir da premissa de que todos querem construir um Brasil melhor. Por isso, adotamos uma frase que surgiu em uma reunião: decidimos deixar de lado os lados — afirma o jornalista gaúcho Rodrigo Vieira da Cunha, um dos fundadores do Agora.
Se a sociedade que se diz enojada de todo esse processo de corrupção votar nos mesmos personagens, a responsabilidade será dela.
CELSO ATHAYDE
Fundador da Frente Favela Brasil
Os olhares repousam especialmente sobre o movimento desde o início de janeiro, quando o apresentador da TV Globo Luciano Huck mencionou, em rede nacional e horário nobre, sua participação no Agora. O célebre integrante até mesmo das listas de presidenciáveis está entre os 90 membros que, divididos em grupos temáticos, elaboram cartas-mandato com proposta de agenda para o país a serem disponibilizadas a qualquer candidato.
Mesmo que se reforce apartidário, o Agora assinou cartas-compromisso com a Rede e o PPS e conversa com outras siglas que devem abrigar os integrantes que querem concorrer. Da inconformidade, veio a ideia de tentar ocupar os espaços de decisão.
— De repente, um monte de gente que nunca se colocou nessa piscina de água gelada decidiu pular — resume a ambientalista Natalie Unterstell, do Agora.
Dinâmica semelhante estabeleceu a Frente Favela Brasil, movimento que nasceu no Rio de Janeiro e deve lançar dois candidatos pelo Rio Grande do Sul. O fundador, Celso Athayde, quer criar um partido formal. Enquanto aguarda o processo de registro, procura legendas simpáticas ao seu ativismo social para participar do pleito. Nas suas palavras, quer colocar "preto e favelado" no Congresso:
— Se a sociedade que se diz enojada de todo esse processo de corrupção votar nos mesmos personagens, a responsabilidade será dela. Esses movimentos mostram que existem alternativas e se colocam à disposição. Pode ser que, no final, aconteça a mesma coisa. Mas pode ser que não.
Neste momento de efervescência política, os movimentos surgem como janela de oportunidade.
NARA PAVÃO
Cientista política da UFPE
Já a Bancada Ativista quer driblar o sistema eleitoral. O grupo anunciou que disputará com candidaturas coletivas. Na prática, várias pessoas devem fazer campanha, mas com um único número na urna. Se eleitos, prometem governar juntos.
"Desafiaremos a política tradicional construindo candidaturas coletivas que unirão representantes de diversas causas em torno de um mesmo número na urna. O voto para a Bancada Ativista não elegerá uma pessoa, mas um grupo", escreveu o movimento, por e-mail, após negar a indicação de um porta-voz.
Para a cientista política Nara Pavão, da Universidade Federal de Pernambuco, o principal efeito do mais recente fenômeno de renovação política no Brasil está no aumento da oferta de candidatos:
— Neste momento de efervescência política, os movimentos surgem como janela de oportunidade. As crises têm essa dinâmica de renovação porque geram demandas pelo novo e provocam as pessoas a pensarem em outras possibilidades.