O empreiteiro Marcelo Odebrecht afirmou, em interrogatório do juiz Sergio Moro, nesta quinta-feira (9), ter sofrido um "achaque" do ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine. O ex-presidente da maior construtora do país havia afirmado, em delação premiada, ter repassado R$ 3 milhões a Bendine. Na audiência desta quinta-feira, em ação na qual é acusado de corrupção ativa, Odebrecht foi enfático ao reiterar a acusação ao ex-presidente da estatal.
Bendine é réu acusado de exigir R$ 17 milhões em propinas da Odebrecht. Segundo a investigação, ele acabou recebendo R$ 3 milhões em três parcelas de R$ 1 milhão, entre junho e julho de 2015, enquanto ocupava a Presidência da Petrobras. Em troca teria agido em defesa dos interesses da empreiteira.
Os dois estão presos. Odebrecht está na cadeia desde junho de 2015, alvo da Operação Erga Omnes, e Bendine está desde 27 de julho passado, alvo da Operação Cobra.
O executivo esteve à frente do Banco do Brasil entre 17 de abril de 2009 e 6 de fevereiro de 2015, e foi presidente da Petrobras entre 6 de fevereiro de 2015 e 30 de maio de 2016. Assumiu o comando da estatal petrolífera com a missão de acabar com a corrupção nas diretorias.
A delação da Odebrecht embasou as primeiras suspeitas contra o ex-presidente do BB e da Petrobras e provocou a deflagração da Operação Cobra.
Nesta quinta-feira, Odebrecht narrou a Moro que as primeiras solicitações de propinas de Bendine vieram de André Gustavo Vieira da Silva, apontado como operador das propinas, à época em que o empresário estava ainda no banco estatal.
Odebrecht contou que o primeiro pedido chegou via o operador de Bendine em conversa com o então presidente da Odebrecht Ambiental, Fernando Reis.
— O André procurou o Fernando e disse: o presidente do Banco do Brasil, que eu conheço, tá pedindo 1% dessa reestruturação.
À época, a Odebrecht tinha uma pendência com o Banco do Brasil relacionado a uma dívida da empreiteira na área Agroindustrial.
— No início de 2014, primeiro semestre, a Agroindustrial estava renegociando a reestruturação de uma dívida. Na época, não sei o valor que fechou, mas era 1,7 bilhão de reais a reestruturação. Na época, veio o pedido através de Fernando. Olha, Marcelo, o André, uma pessoa que eu conheço, está pedindo para o Bendine 1% na questão da reestruturação.
Diante do primeiro pedido, Marcelo diz ter recusado.
— Eu não dei muita bola para esse achaque.
Segundo o ex-presidente da empreiteira, um ano depois, Bendine — já nomeado na Petrobras — chegou a ser escalado pelo governo Dilma Rousseff para ser o interlocutor com a Odebrecht a respeito de assuntos relacionados aos impactos da Lava-Jato sobre o mercado.
— Aí ele foi nomeado presidente da Petrobras. A coisa muda um pouco de figura, porque ele tinha uma posição que de fato poderia atrapalhar a gente. Tínhamos vários temas bastante críticos na Petrobras no momento e eu procurei me cercar de evidências irrefutáveis para ter certeza primeiro de que havia esse pedido, esse achaque, e de que ele teria condições de atrapalhar a gente — relatou Odebrecht.
Ele disse ainda ter se reunido com Fernando Reis e Bendine, no apartamento de André Gustavo, em Brasília.
O suposto operador de Bendine teria dito que algumas palavras do então presidente da Petrobras serviriam de "senha" para confirmar que ele gostaria de receber propinas da empreiteira.
— No meio dessas discussões sobre Lava-Jato e tema da Petrobras, ele me trouxe as palavras que eram sinal de que ele (pedido de propina) existia. Ele foi mencionando o financiamento. Fora do contexto do assunto. Exatamente as palavras que André tinha dito para caracterizar que o pedido do André estava sendo...
"Eu saí dessa reunião falando: 'olha, não há duvida de que esse pedido existe'. Eu não acho que vamos precisar dar os 17 milhões mas vamos começar a pagar alguma coisa, administrando. Vai avaliando a capacidade de atingir a gente. Isso aconteceu. Três pagamentos de um milhão cada. Eu fui preso logo depois do primeiro pagamento. Se fosse uma consultoria técnica [prestada pelo operador de Bendine], legítima, não seria paga via equipe de Operações Estruturadas [departamento de propinas da empreiteira], ainda mais em um momento de tanto risco e exposição, eu já preso!", relatou.
Defesa
O criminalista Alberto Zacharias Toron, que defende Bendine, afirmou que o conteúdo do depoimento de Marcelo não passa de "ilação" e ressaltou que o próprio delator disse nunca ter recebido cobranças diretamente de Bendine.