Um torpedo disparado pelo Planalto que acertou em cheio o ninho tucano. Assim foi entendida por ala do partido a escolha de Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) como relator da segunda denúncia contra Michel Temer na Câmara. A exemplo da primeira acusação, líderes da sigla que defendem o desembarque do governo não queriam um correligionário no posto. Mais uma vez foram derrotados.
– Claro que foi um movimento do governo que fez questão de mobilizar alguém do PSDB para nos deixar expostos, nessa situação de divisão para o grande público – reclama um dos caciques tucanos na Câmara, que atribui a manobra a uma retaliação ao líder do PSDB na Casa, Ricardo Tripoli (SP), crítico do Executivo.
O final de semana foi de articulações para pressionar Andrada a recusar o posto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O coordenador da bancada tucana na CCJ, Betinho Gomes (PE), prega a medida como saída para pacificar o PSDB:
– Seria o melhor caminho se a intenção for apaziguar e deixar o partido mais coeso à frente.
O novo relator não demonstra estar receptivo aos apelos. Aliado do senador afastado Aécio Neves (MG), no 10º mandato de deputado federal e aos 87 anos, se mostra irredutível.
– Estou à disposição. Fui indicado pelo presidente da Comissão de Justiça e vou exercer essa tarefa – diz Andrada, que foi procurado pelo presidente interino do PSDB, Tasso Jereissati.
Reunião entre os dois está marcada para esta segunda-feira, na tentativa de mediar a situação. Apesar do racha no partido, o governo não vê risco à relação que mantém com os tucanos defensores da permanência na base de sustentação de Temer. Inclusive, nos corredores, há a aposta de que o apoio da legenda ao congelamento da segunda denúncia poderá ser ampliado em comparação à primeira acusação.
Relator da Reforma Trabalhista, o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) votou contra o prosseguimento das investigações envolvendo Temer em agosto. Destaca que, apesar do desgaste, o partido deve pensar nas consequências de eventual afastamento do presidente.
– Isso poderia gerar instabilidade econômica e social. Além disso, encabeçamos o processo de impeachment (da ex-presidente Dilma Rousseff), apresentamos reformas, indicamos ministros – elenca Marinho.
O líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), segue a mesma linha e garante que a questão referente ao desembarque já foi decidida e não haverá mudança de posição:
– Esse é um assunto vencido. O partido seguirá participando e contribuindo com o governo.
Centrão eleva fatura e pede cabeça de Imbassahy
Na votação da primeira denúncia, 22 dos 47 deputados federais tucanos votaram a favor de Temer. Outros 21 queriam dar o aval à abertura de investigação contra o presidente e quatro se ausentaram. Ainda assim, o presidente obteve 263 votos de aliados, 91 a mais que o necessário.
Mas é justamente a cobrança da fatura pela vitória que coloca em xeque a relação entre PSDB e governo. Com o início da tramitação da segunda acusação, partidos da base aliada intensificaram a pressão sobre o Planalto. A conta ficou mais cara, já que os partidos que ajudaram o presidente a escapar da primeira vez agora querem a cabeça do ministro tucano Antonio Imbassahy (Secretaria-Geral de Governo), responsável pela articulação política de Temer com o Congresso. Eles também cobram a liberação mais rápida de verbas para emendas e a entrega de cargos na máquina federal, compromissos assumidos em troca de apoio e ainda não cumpridos.
As críticas a Imbassahy partem do centrão, grupo de legendas de médio e pequeno porte que reúne cerca de 200 dos 513 deputados federais.
– Ele atrapalha muito mais do que ajuda. É um secretário que não conversa com os parlamentares – disse o líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL).
Imbassahy afirma não ter conhecimento de queixas. Em sua defesa, saiu o líder do PMDB, Baleia Rossi (SP):
– A posição que ele ocupa é das mais difíceis no Palácio. Por mais que ele se esforce, não consegue atender a todas as demandas. Acaba ficando com alguém reclamando. Mas ele tem trabalhado de maneira correta e tem sido leal.
CAPÍTULOS DO ATRITO
- A relação entre o governo e tucanos da Câmara estremeceu após divulgação da gravação de conversa entre o dono da JBS Joesley Batista e Michel Temer. Houve ameaça de saída da base aliada.
- Na Câmara, o relatório de Sergio Zveiter, (ex-PMDB e atual Podemos), a favor da denúncia, foi derrotado. O deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), aliado de Aécio Neves (MG), foi escalado como novo relator, apesar da contrariedade do líder da sigla na Câmara, Ricardo Tripoli (SP), e fez parecer favorável a Temer. No plenário, houve racha: 22 deputados votaram a favor de Temer, 21, contra, e quatro se ausentaram.
- Com a segunda acusação, Tripoli pediu ao presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), que não escolhesse tucano para relatoria. Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) foi alçado ao posto. A medida foi vista como retaliação do Planalto.
OS NÚMEROS DO PSDB
4 ministérios: Relações Exteriores, Cidades, Direitos Humanos e Secretaria-Geral de Governo
47 deputados: terceira maior bancada na Câmara
11 senadores: Segunda maior representação partidária no Senado
6 governadores: Legenda com o segundo maior número (SP, PR, GO, MT, MS e PA)