A deputada federal e ex-governadora Yeda Crusius (PSDB) afirmou que "não há relação" entre receber "uma renda alta" e participar da comissão que tratará dos supersalários na Câmara. Em agosto, a parlamentar recebeu R$ 66 mil em vencimentos relativos à pensão de ex-governadora e ao salário como deputada, acima do teto constitucional de R$ 33,7 mil.
Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, nesta sexta-feira (22), a tucana explicou que abriu mão, em julho, dos valores que recebia por ter estado à frente do Palácio Piratini. Mesmo com a solicitação para a exclusão do pagamento, Yeda recebeu R$ 32.427,37 em agosto (na verdade, o pedido da ex-governadora foi feito em 20 de agosto, e ela passará a não receber o valor na folha de setembro, conforme a Secretaria da Fazenda)
— Embora seja dentro da lei, embora sejam duas fontes, nenhuma delas é supersalário. É um salário alto, mas não é supersalário — afirmou. — Estou absolutamente, não apenas legitimada, como autorizada a participar dessa comissão — defendeu, em referência a medidas tomadas durante o seu mandato como governadora.
Confira, abaixo, a íntegra da entrevista:
Não há contradição entre receber R$ 66 mil e fazer parte de comissão que discutirá os supersalários na Câmara?
Desde que assumi (como deputada federal), esse é o tema. Parece que tem um alvo lá na frente e tem que dar flechada no tal do alvo. Eu tenho duas fontes de pagamento, a federal, como deputada federal, e a estadual, que é a pensão de ex-governadora.
A senhora também recebe como professora aposentada.
Essa você não mexe, né, porque essa é da minha família. Eu, (por) 30 anos trabalho, tenho uma aposentadoria. Na aposentadoria, ninguém mexe. Não é dela que se fala. Se você quiser saber quanto eu tenho na minha conta bancária, é transparente. Dinheiro público tem de ser transparente e graças a isso vocês conseguem os dados de vocês.
Mas, em julho, incomodada com algumas coisas e coerente com o que sempre fiz, eu pedi que fosse levantada minha pensão de ex-governadora para receber numa fonte só, que é de deputada. Eu fiz como fez o Olívio e o Pedro Simon. Isso não é notícia, tudo bem. Se não é notícia é porque não serve para ser notícia. E por que isso? A minha notícia é o que eu faço como deputada federal, e como deputada federal, eu vou fazer, através dessa comissão que foi montada no final de agosto, o mesmo que eu fiz durante a vida inteira. Como governadora, olhando aqueles penduricalhos da Justiça, que tinha um salário x depois bolsa-isso, bolsa-aquilo, propus a partir de emenda constitucional que se trocasse a forma (de pagamento) dessas remunerações ligadas à Justiça por um subsídio: junta tudo, dá um inicial bom, e depois a carreira vai até o teto constitucional, que é o que esta nossa comissão vai julgar. Então, eu já fiz coisas nesse sentido. A minha vida é registrada por uma batalha pela igualdade.
Estou vendo a Assembleia Legislativa batalhar outra vez buscando assinaturas para uma coisa que devia ser corriqueira, que é a lei dos duodécimos: foi rejeitada por essa Assembleia. Agora, essa mesma Assembleia vai voltar a analisar uma coisa que faz com que ninguém entenda, no Rio Grande do Sul, por que o Poder Executivo recebe parcelado e Poder Legislativo e o Poder Judiciário recebem integrais em função de uma receita prevista, e não de uma receita realizada. Essa desigualdade relativa à remuneração do serviço público é alguma coisa contra a qual eu sempre batalhei. (O objetivo) é batalhar para que não haja duas classes de pessoas no Brasil: uma chamada "setor público" e a outra chamada "setor privado", como está na discussão da reforma da Previdência. Devia ser um sistema só: não, mas o INSS tem um teto de R$ 5 mil e pouco e o setor público não tem teto, não obedece ao teto constitucional porque é permitido que seja feito isso.
Então, a minha notícia é dar essa informação: eu estou absolutamente não apenas legitimada como autorizada a participar dessa comissão. Da mesma maneira como eu vejo notícias que são dadas assim: "tal pessoa está participando...". Como se tivesse uma segunda intenção e ela fosse sempre negra, no sentido da falta de luz, negativa. Então, quero tranquilizar vocês de que não é isso. Tanto é que ta aí o filme que fui ver e aplaudi como todos os outros no cinema, "A lei é para todos". A gente tem que cuidar, eu no Legislativo, de que as leis sejam feitas de maneira a serem atendidas para todos. Então, esse filme que trata da Lava-Jato é muito bem feito, é verdadeiro, é real, quem puder vai ver, porque é de aplaudir a ação da Polícia Federal e a maneira como aqueles grupo que está no livro "A lei é para todos", do Carlos Graieb e da Ana Maria (Santos), e foi para o filme de uma maneira bem correspondente, a lei tem que ser para todos e eu vou cuidar de que seja assim, a começar por mim.
A Secretaria da Fazenda, no portal da transparência, informa que a senhora recebeu R$ 32.427,37 brutos em agosto, sendo R$ 25.440,77 líquidos. Essa informação tem que ser corrigida?
A pensão é legal, sempre a defendi, e a Secretaria da Fazenda toma algum tempo até concretizar o pedido (para suspender o pagamento). Embora seja dentro da lei, embora sejam duas fontes, nenhuma delas é supersalário. É um salário alto, mas não é supersalário. Fui atrás de saber se era possível fazer isso e era possível. Se em agosto veio inteiro (o valor), que bom. Eu não vou reclamar da Secretaria da Fazenda, não. O portal da transparência tem todas as informações que precisa. O jornalismo tem que buscar as informações extras. Eu quero dizer não há uma relação entre eu proteger uma renda alta indo para a comissão dos altos salários. É isso que eu quero negar. A minha intenção está (amparada) na minha história.
Na comissão da Câmara, a senhora vai trabalhar para que os penduricalhos acabem?
É uma barbaridade isso que acontece e isso que causa esse sentimento negativo na população. Pô, mas como é que eles podem fazer isso? Eles se autoconcedem benefícios para fugir do teto. Eu entrei no teto mesmo não precisando, porque são duas fontes.
Hoje, o teto constitucional do funcionalismo é de R$ 33,7 mil. O texto aprovado pelo Senado em dezembro prevê que adicionais incorporados ao salário não possam ultrapassar esse valor. A senhora vai propor que o teto seja cumprido para aqueles que já recebem acima do montante máximo?
Como isso está dentro da lei, quem ganha (acima do teto) toma a sua própria decisão, não sou eu a dizer como as pessoas vão tomar a sua decisão. O projeto de lei está no meu site, no site da Câmara. Eu estou pedindo para que as pessoas olhem para o projeto e sugiram. Tenho meu modo de pensar, mas eu sou representante de uma população que está machucada pelas desigualdades as mais diversas. Não vou pedir para os outros fazerem uma coisa que a lei lhes permita que faça, mas eu quero mudar a lei. Em que sentido vou mudar a lei? (Para) semana que vem, marquei um encontro com o presidente da comissão (deputado Benito Gama, PTB-BA) que acabou de ser montada. O relator é Rubens Bueno (PPS-PR). Quero trabalhar dentro da comissão para que a gente faça o melhor possível, atendendo aquilo que seja o corpo legal, o que é a lei e o que eu quero mudar, mesmo que conflita com o Senado, e de que maneira a gente vai colocar isso à disposição de toda a sociedade para ela nos ajudar a fazer isso.