Na noite de quarta-feira (27), a Câmara concluiu a votação de mais uma fatia da reforma política, validando a criação de uma cláusula de barreira para frear a explosão de partidos no país. Ainda pendente de aprovação em dois turnos pelo Senado, a medida limita o acesso ao fundo partidário e ao tempo de rádio e TV às legendas que não atingirem um desempenho mínimo nas eleições.
Incluída na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 282/2016, a regra determina que, para receber recursos públicos destinados às legendas e ganhar espaço nas propagandas obrigatórias, a sigla precisa conquistar 1,5% dos votos válidos para deputados federais em pelo menos nove Estados, com no mínimo 1% dos votos em cada um. Caso não alcance a exigência, precisa eleger uma bancada mínima de nove parlamentares na Câmara, também em nove Estados.
A cada legislatura, os limites previstos tornam-se mais rígidos, chegando ao ápice em 2031. A partir deste ano, os critérios subiriam para 3% dos votos válidos para deputados federais ou eleição de uma bancada mínima de 15 nomes na Câmara. Na prática, a cláusula dificulta a sobrevivência de partidos recém-criados e de legendas com pouca expressão.
Para o advogado e professor de Direito Eleitoral Antônio Augusto Mayes dos Santos, a proposta representa um avanço ao racionalizar o sistema considerado "hiperpartidário". Hoje, o país possui 35 legendas em atividade e outras 66 que aguardam registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
— É positivo porque se restringe a proliferação de partidos nanicos e a consequente negociata de tempo de rádio e TV. No fundo, também há um elemento de qualidade, porque, em razão da necessidade de desempenho mínimo, os partidos terão de melhorar suas escolhas para as eleições — avalia Santos.
Pelas regras atuais, assim que se cria uma legenda, automaticamente tem-se acesso aos recursos do fundo partidário — que, em 2017, chegou a R$ 888,7 milhões — e recebe-se direito à propaganda partidária. Diante da irrestrita multiplicação de siglas, legendas tornaram-se balcões de negócios, vendendo apoio em campanhas ao ofertar recursos públicos e tempo de exposição.
— Criam-se partidos unicamente para acesso ao fundo partidário e ao tempo de rádio e TV, com poder de barganha na época de eleições, quando legendas pequenas vendem esses recursos. Naturalmente, com a cláusula, essas siglas devem se esvair, acabando com os "partidos de aluguel". Tornou-se um negócio — analisa Roger Fischer, especialista em Direito Eleitoral.
Na proposta que avança no Congresso, também há o inerente interesse dos parlamentares em acessar uma quantia maior parcela do fundo para financiamento de campanhas. Segundo proposta aprovada pelo Senado, que ainda precisa passar pela Câmara, a reserva eleitoral seria de ao menos R$ 1,7 bilhões. Mantido o bolo, mas encolhido o número de partidos, engorda-se a parcela de verba pública prevista para as legendas mais expressivas.
Cláusula de barreira
Determina exigência para que partidos recebam dinheiro do fundo partidário e tenham direito ao tempo de propaganda no rádio e na TV.
De 2019 a 2023 — 1,5% dos votos válidos em 2018 para deputados federais em pelo menos nove Estados, com 1% em cada, ou bancada mínima de nove deputados federais em nove Estados.
De 2023 a 2027 — 2% dos votos válidos em 2022 para deputados federais em pelo menos nove Estados, com 1% em cada, ou bancada mínima de 11 deputados federais em nove Estados.
De 2027 a 2031 — 2,5% dos votos válidos em 2026 para deputados federais em pelo menos nove Estados, com 1,5% em cada, ou bancada mínima de 13 deputados federais em nove Estados.
A partir de 2030 — 3% dos votos válidos nas eleições para deputados federais, em pelo menos nove Estados, com 2% em cada, ou bancada mínima de 15 deputados federais em nove Estados.