O eleitor que pretende se filiar a algum partido não pode reclamar de falta de opção. Existem 35 legendas em atividade no país e outras 66 aguardando registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A diversidade supera dicotomias entre direita e esquerda, incorporando as mais variadas ideologias, causas e nichos do espectro político brasileiro.
Mas nos últimos anos, a pluralidade que seria salutar para a democracia acabou se deturpando a ponto de converter o sistema partidário em um balcão de negócios, cuja moeda de troca são R$ 888,7 milhões em recursos públicos e tempo de exposição gratuita no rádio e na TV.
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Do mensalão à Lava-Jato, os maiores escândalos envolveram venda de apoio nas eleições.
– É ótimo negócio ter um partido. Tudo que se viu nos últimos anos são, na essência, siglas se vendendo por ocasião. Não há identidade ideológica – diz a procuradora da República e especialista em direito eleitoral Silvana Batini.
Sem consenso na Câmara, reforma política empaca
Na miscelânea de siglas e expressões das legendas em formação no TSE, tem para todos os gostos. Há o partido militar (PMBR), o conservador (Paco) e o federalista (PF). O da saúde (PNS), o do esporte (PE) e o da segurança (PSPC). O da família (PFB), o da favela (Frente), o pirata (Piratas) e o corinthiano (PNC).
Só cristãos, há sete, entre os quais o democrata (PDC), o liberal (PLC), o progressista (PPC) e o ecológico (PEC). Os saudosistas podem exercer militância na Aliança Renovadora Nacional (Arena) ou União Democrática Nacional (UDN).
Os adeptos da nova onda dos slogans têm à disposição o Raiz, o Patriotas, o Igualdade, o Iguais, o Força Brasil e o Renovar. Há até quem queira fundar dois partidos ao mesmo tempo: o Partido da Integração Social e Cidadania (Pisc) e o Partido da Mobilização Popular (PMP) têm como presidente João Caldas da Silva. ZH entrou em contato, mas ele não retornou as ligações.
Para frear a explosão partidária, a Câmara ainda tenta votar em segundo turno a criação de cláusula de barreira. O mecanismo limita acesso ao fundo partidário e ao tempo de rádio e TV para propaganda eleitoral. Pelo previsto, somente terão direito as siglas que obtiverem desempenho mínimo nas eleições (veja abaixo).
AS EXIGÊNCIAS DA REFORMA POLÍTICA
Regras para acesso ao fundo partidário em discussão
– A medida ajuda a sanear esse sistema tão fragilizado. O objetivo é organizar o acesso aos recursos públicos. Hoje, qualquer partido que obtenha registro já tem direito, inclusive os que não tem sequer um vereador ou deputado eleito – justifica a deputada Shéridan (PSDB-RR), relatora da proposta.
A falta de consenso trava a votação e, com chegada da segunda denúncia contra Michel Temer à Câmara, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode tomar as rédeas. Ministros avaliam usar ação ajuízada pelo ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre distribuição de vagas no Legislativo para proibir as coligações. proporcionais.
Para 2018, o fundo partidário será de R$ 888,7 milhões – 8,5% a mais do que neste ano, enquanto a inflação no período não chegou a 3%. Como são R$ 45 milhões acima do teto de gastos, o governo terá de tirar dinheiro de outras áreas.
O salto do fundo ocorreu em 2015, após o STF proibir o financiamento privado das campanhas. Naquele ano, o Congresso quase triplicou o valor, de R$ 317,9 milhões a R$ 867,5 milhões.
Para as eleições do ano que vem, deputados tentaram aprovar fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões. A verba seria correspondente a 0,5% da receita corrente líquida do governo federal, mas a reação negativa da sociedade acabou forçando recuo dos parlamentares, que retiraram o percentual do texto normativo. Agora, o valor será fixado pela Comissão de Orçamento do Congresso. Uma sequência de manobras cujo resultado Silvana resume:
– A classe política se acostumou a fazer campanha com muito dinheiro. Quando secou a torneira da pessoa jurídica, aumentaram o financiamento público. Como o sistema tem atrativo forte, que é esse acesso ao dinheiro, você tem cem partidos, quase nenhuma representatividade.
A EVOLUÇÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO
Em 2015, foi proibido o financiamento privado de campanha e o repasse público mais que dobrou.
2014 – R$ 371,9 milhões
2015 – R$ 867,5 milhões
2016 – R$ 819,1 milhões
2017 – R$ 819,1 milhões
2018 – R$ 888,7 milhões
COMO CRIAR UM PARTIDO
- O primeiro passo é obter a assinatura de 101 fundadores, distribuídos em pelo menos nove Estados. Em seguida, deve-se registrar a legenda no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
- Esse registro é provisório e se concretiza com o apoio formal da quantidade de eleitores correspondente a 0,5% dos votos dados na última eleição a toda a Câmara, sem os brancos e os nulos. Atualmente, seriam necessárias 484.169 assinaturas.