Ao se apresentar ao juiz Sergio Moro como "vítima da maior caçada jurídica" a um político brasileiro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu o tom da sua narrativa até 2018. O petista busca se blindar do desgaste por eventuais condenações no primeiro grau e criar constrangimento entre desembargadores para retardar decisões em segunda instância, capazes de tornar inelegível o atual líder nas pesquisas. A dúvida sobre a presença – ou não – de Lula na corrida ao Planalto é o principal entrave para a costura de alianças entre os maiores partidos do país.
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Nas falas oficiais da arena política, as avaliações sobre as cinco horas do primeiro depoimento do petista a Moro em Curitiba, na ação penal do triplex no Guarujá (SP), ficaram no clima de Gre-Nal que permeia a Lava-Jato. Nos bastidores, as análises viram réu e magistrado em situação de tensão. O juiz deparou com contradições pontuais do ex-presidente, cujas respostas procuraram consolidar a versão de que as provas mostram que ele não recebeu qualquer vantagem indevida da construtora OAS.
– Todo esse tempo de investigação e ninguém trouxe uma prova de que o tal do triplex era do presidente Lula – destacou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
Na oposição, houve reconhecimento da habilidade retórica do petista e sobraram críticas às negativas diante das perguntas dentro do processo, considerado pelo senador José Medeiros (PSD-MT) o "mais simples" entre as ações penais que acusam Lula.
– Pode se resumir o depoimento em "uhum", "não", "não sei", "não vi" e "não tava lá". E, quando tava lá, jogou a culpa para dona Marisa – disse Medeiros.
Superado o depoimento, a expectativa gira em torno da sentença de Moro. Petistas garantem que, mesmo em caso de condenação de primeira instância, Lula será candidato, movimento considerado fundamental para reverter a tendência da bancada do partido encolher na Câmara. No caso gaúcho, por exemplo, as projeções indicam a chance de repetir os sete deputados federais se o ex-presidente tentar o terceiro mandato. Do contrário, pode cair para três ou quatro cadeiras.
– O PT será competitivo de qualquer forma, mas ficará ainda mais com Lula – afirma Pepe Vargas (PT-RS).
Entre os tucanos, adversários históricos do PT, a presença de Lula no pleito levará o discurso mais ao centro ou à direita, medindo o desempenho da plataforma conservadora de Jair Bolsonaro (PSC-RJ), em alta nas pesquisas de intenção de voto. No embate com o petista, a perspectiva é de alta no nível de radicalização.
– O PSDB será competitivo. Monitoramos o cenário para formarmos uma grande aliança para vencer a eleição – afirma Paulo Bauer (SC), líder tucano no Senado.
Com Geraldo Alckmin e João Doria como presidenciáveis, o PSDB já conversa para ter na chapa PP, PR, PSD, PTB, PRB e o PMDB de Michel Temer, com dificuldade para viabilizar candidato próprio. Contudo, tucanos avaliam que Lula pode dificultar a grande coalizão, por rachar as bancadas de médios partidos, a exemplo de PP, PSD, PR, PTB e PSB.
– O PSB já vive uma divisão, com grupo no governo Temer e outro fora dele. Pelas críticas à corrupção, fica difícil apoiar o Lula no primeiro turno. Se ele não concorrer, cria espaço para tentativa de candidatura socialista – projeta o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
O racha nas legendas atingiria o PMDB, inclusive na ala que apoiou o impeachment de Dilma Rousseff. No Norte e no Nordeste, regiões nas quais Lula é muito popular, senadores como Renan Calheiros (AL), Eunício Oliveira (CE), Edison Lobão (MA), Garibaldi Alves (RN) e Jader Barbalho (PA) mantêm perspectiva de dividir o palanque com o petista.
De olho nos votos de centro e de esquerda, Marina Silva e Ciro Gomes, presidenciáveis da Rede e do PDT, aguardam a definição da situação do ex-presidente para encaminhar suas estratégias. Com Lula no páreo, Ciro corre o risco de enfrentar pressão para desistir da candidatura ao Planalto, em nome da unidade da esquerda.
– Se Lula concorrer à Presidência, a candidatura do Ciro pode perder força. Se ele ficar de fora, Ciro pode surfar – resume o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).