Após quase 12 horas de sabatina, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, por 19 votos a sete, a indicação do ministro licenciado da Justiça Alexandre de Moraes para a vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal (STF). Apenas a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) se declarou impedida para participar do pleito por ser ré na Operação Lava-Jato, que tramita no STF. A intenção, segundo a petista, era que outros parlamentares investigados também se abstivessem, o que não ocorreu. Agora, o plenário da Casa vai decidir, às 11h desta quarta-feira, se aprova ou não a ida de Moraes para a Corte. Para passar pelo crivo dos parlamentares, Moraes precisa 41 votos – maioria simples – para garantir cadeira no Supremo.
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A sessão começou por volta de 10h15min e terminou pouco antes das 22h. Na sabatina, Moraes se defendeu de algumas acusações polêmicas, negando sua atuação como advogado da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) e a denúncia de ter plagiado trechos da obra do jurista espanhol Francisco Rubio Llorente.
– Jamais fui advogado do PCC ou de ninguém ligado ao PCC. O escritório do qual foi sócio-administrador tinha vários clientes, dentre eles uma cooperativa – afirmou, emendando que. em 2014, essa cooperativa emprestou uma garagem da sede pra uma reunião política e, dentre os participantes, havia investigados por ligação com o crime organizado.
– Em 2015 quando assumi a Secretaria de Segurança Pública, começaram a deturpar afirmando que eu era advogado do PCC – concluiu Moraes.
Sobre as acusações de plágio em sua tese de doutorado, o indicado ao STF disse que elas surgiram a partir de uma pessoa que não conseguiu passar em um concurso na Faculdade de Direito da USP.
– O próprio Tribunal Constitucional espanhol disse que o conteúdo do livro citado são compilações de decisões públicas do tribunal. E a viúva do autor foi induzida pelo repórter. Ela disse que "se" houve cópia, isso não deveria ter sido feito – disse aos senadores da CCJ.
Outra pergunta feita a Alexandre de Moraes sobre a atuação da esposa, que é advogada, em processos no Supremo Tribunal Federal.
No início da sessão da CCJ, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou questão de ordem pedindo o adiamento da sabatina de Alexandre de Moraes. Segundo Randolfe, Moraes omitiu que tem vínculo familiar com profissional que trabalha para o STF. A esse respeito, Moraes disse que informou ao Senado não ter parentes exercendo trabalho vinculado a função que exerce como ministro da Justiça.
Ele afirmou que, caso assuma a vaga no STF, irá se declarar impedido em causas que envolvam a atuação de sua esposa ou do escritório onde ela trabalha. Ele lembrou que há uma vedação legal para casos como esse e disse que se declararia impedido mesmo que não houvesse essa previsão legal.
– Obviamente seguirei a risca o que todos os ministros sempre fazem de se declararem impedidos.
Com relação ao conteúdo de sua tese de doutorado, em que critica a indicação de ocupantes de cargos públicos à condição de ministro do Supremo Tribunal Federal, Moraes explicou que na verdade apresentou vários modelos de indicações defendidos por diferentes juristas, de diversos países. O sabatinado afirmou que não vê nenhuma incoerência, nenhuma incompatibilidade entre defender uma alteração no modelo brasileiro de nomeação do STF e sua indicação para o cargo.
– O que eu posso garantir que não considero, não considerarei, entendendo que a minha indicação, e a minha eventual aprovação por Vossas Excelências, tenha qualquer ligação de agradecimento ou favor político. Isso eu posso garantir que, se aprovado for por Vossas Excelências, atuarei com absoluta independência, absoluta imparcialidade, e não falo isso da boca para fora – declarou Moraes.
Em seu discurso de apresentação à sabatina para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro licenciado da Justiça, Alexandre de Moraes, afirmou que tem atuação independente e que se compromete com um Poder Judiciário autônomo. Indicado pelo presidente da República, Michel Temer, Moraes era filiado ao PSDB até a semana passada e será o revisor da Lava-Jato no plenário.
– Reafirmo meu compromisso constante de luta pelos ideais democráticos. Minha atuação será com imparcialidade, coragem, dedicação e sincero amor à causa pública – disse.
Alexandre de Moraes defendeu também soluções para desafogar o sistema judiciário. Defendeu que as audiências de custódia são um "habeas corpus social", que diminui prisões arbitrárias, violência policial e a manutenção de presos que não precisariam estar presos. Ele sustenta que, na audiência de custódia, possa já ocorrer a transação penal.
Moraes também defendeu que o réu primário tenha pena de prestação de serviços em vez de pena de prisão com uma forma de desafogar o sistema penitenciário, além do Judiciário, reduzindo o número excessivo de processos.
Sobre a celeridade da Justiça, Moraes ressaltou que atualmente há 100 milhões de processos ainda não concluídos.
– Acredito e sempre acreditei, ao prever o princípio da eficiência, na necessidade da razoável duração dos processos e celeridade processual. Um país de alta litigiosidade precisa de mecanismos para garantir celeridade processual – afirmou.
Entre as medidas defendidas por ele para se ter uma diminuição do número de processos está a realização de audiências de conciliação para evitar a judicialização de casos que podem ser resolvidos antes de serem julgados pelos tribunais.
Aos senadores, Moraes também afirmou ser contra o que chamou de ativismo político em instâncias do judiciário.
– O papel do STF é relevantíssimo nesse contexto. Cresce a discussão do ativismo político no Brasil e no mundo. O ativismo judicial pode ser uma forma violenta de pragmatismo político – afirmou.
Isenção e Lava-Jato
Depois de responder à primeira etapa de questões apresentadas pelo relator Eduardo Braga, o indicado Alexandre de Moraes é submetido às questões dos outros senadores inscritos na sessão da CCJ. O primeiro a questionar Moraes foi o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que criticou a apresentação de várias questões polêmicas de uma só vez pelo relator.
Lindbergh destacou que um juiz precisa ser "imparcial e isento" e questionou Moraes sobre sua isenção em relação ao governo federal. O senador criticou a indicação de Moraes, que, caso nomeado, poderá ser revisor do processo da Lava-Jato no Supremo.
Lindbergh questionou Moraes sobre a relação dele com Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, que está preso em Curitiba no âmbito da Lava-Jato.
O senador perguntou se Moraes se considera isento para ser revisor e se ele se colocaria como impedido para exercer esta tarefa e julgar o processo da Lava-Jato, que tem integrantes do governo federal citados em delações premiadas.
Alexandre de Moraes se defendeu dizendo que a indicação de parlamentares ou ministros de Estado para o STF é uma tradição da Corte. Moraes citou outros casos de ministros do Supremo que já ocuparam cargos públicos e exercem a magistratura com independência.
– É uma tradição história do STF de ministros que atuavam no Executivo e Legislativo. Isso desde o início do Supremo. A corte tem quatro membros que tiveram participação no mundo político – disse.
Moraes destacou ainda sua capacidade para ocupar o cargo.
– Eu me julgo absolutamente capaz de atuar com absoluta imparcialidade, com absoluta neutralidade dentro do que determina a Constituição, sem nenhuma vinculação partidária – afirmou Moraes.
O indicado disse que a partir do momento que alguém é honrado com o cargo de ministro do STF, deve atuar somente de acordo com a constituição. Moraes disse também que provavelmente não será o revisor da Lava-Jato, posto que deve ser ocupado pelo ministro Celso de Mello.
– É importante ver o papel do revisor. Ele apenas age após o trabalho do relator – afirmou
Na réplica, Lindbergh afirmou que o indicado desconsidera o contexto político atual, em que vários membros do governo são citados na Lava-Jato, e o questionou se ele se declarará impedido para julgar o processo que pede a cassação da chapa Dilma-Temer, caso venha a participar da composição do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Moraes reafirmou que atuará, se aprovado, com "absoluta independência" e quando pertinente avaliará se a participação em determinado julgamento é caso de impedimento ou suspeição.
Entenda como é a sabatina:
– A sessão na CCJ do Senado foi marcada para as 10h desta terça-feira.
– Com seis senadores presentes é possível começar a sabatina de Alexandre de Moraes, que não tem limite de tempo para duração.
– Os senadores se inscrevem para falar. Cada um dos inscritos tem 10 minutos para fazer as perguntas. Moraes tem o mesmo tempo para responder.
– A tendência é que as perguntas sejam feitas em blocos – três senadores perguntam e Moraes responde, por exemplo.
– As perguntas enviadas pelo site do Senado passam pelo presidente da CCJ, Edison Lobão, e pelo relator do caso, Eduardo Braga (PMDB-AM).
– Encerrada a sabatina, a comissão vota a indicação de Moraes. A votação é secreta.
– A indicação precisa ser aprovada por maioria simples, ou seja, metade mais um dos presentes à sessão. A CCJ tem 27 titulares.
– Se Moraes for aprovado na CCJ, a indicação pode ir entre terça e quarta para votação secreta no plenário do Senado.
– A aprovação exige, no mínimo, os votos de 41 dos 81 senadores. Alcançada soma, Moraes poderá tomar posse no STF.
Biografia
Alexandre de Moraes é doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo (USP), jurista e trabalhou como promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Leciona na USP, na Universidade Presbiteriana Mackenzie, na Escola Superior do Ministério Público e da Escola Paulista da Magistratura.
Sua carreira no serviço público começou em 2002, quando foi nomeado secretário estadual de Justiça e da Defesa da Cidadania em São Paulo, no governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Ficou no cargo até 2005, quando saiu para ocupar uma vaga no Conselho Nacional de Justiça (2005-2007). Depois foi secretário municipal de Transportes (2007-2010) e Serviços (2009-2010) na cidade de São Paulo, nas gestões de Gilberto Kassab (DEM), e secretário estadual de Segurança Pública (2015-2016) de São Paulo, novamente no governo Geraldo Alckmin.
Moraes é o 27º nome a ser indicado para o STF desde a redemocratização do país, em 1985, e o 25º sob a vigência da Constituição Federal de 1988. Ele é e o quarto ex-ministro da Justiça a ser agraciado com a nomeação no mesmo período. Antes dele, Nelson Jobim (1997), Maurício Corrêa (1994) e Paulo Brossard (1989) também foram indicados. Apenas Corrêa não ocupava o cargo no momento da indicação – era senador pelo Distrito Federal e havia deixado o Ministério sete meses antes.
A indicação de Moraes é a primeira de um ministro de Estado em exercício desde 2009. Naquele ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nomeou para o cargo o então advogado-geral da União Dias Toffoli.