Ao final da mais exaustiva votação de um pacote de medidas da história da Assembleia Legislativa, o governo teve o êxito das 14 vitórias ofuscado pela retumbante derrota na mudança do cálculo do duodécimo dos poderes. Entre as 40 medidas anunciadas pelo governador José Ivo Sartori no final de novembro, a nova fórmula de repasse era a de maior impacto no fluxo de caixa, ao injetar cerca de R$ 700 milhões por ano nas contas do Executivo. A malograda tentativa de mexer no orçamento não só abreviou o pacote – que só será retomado no final de janeiro –, como também forçará uma reorganização da base de sustentação do Piratini.
Na madrugada de sexta-feira, o sentimento dos líderes governistas era de fracasso. Muitos se sentiam culpados por ter aprovado o fim das fundações – com a consequente demissão de 1,2 mil servidores –, sem conseguir repartir com as demais instituições, sobretudo com o Judiciário, a conta pela crise no Estado.
– Olha o que nós fizemos – desabafou um dos expoentes do governo.
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Dos 26 projetos enviados à Assembleia, 15 foram votados. A única derrota do Piratini, contudo, também foi emblemática por demonstrar que não havia os 33 votos necessários para aprovação de mudanças na Constituição. As defecções na base levaram o governador a abrir mão, por exemplo, de votar nesta semana iniciativas polêmicas, como a que retira a obrigatoriedade de plebiscito para privatização das estatais e a que posterga o pagamento do 13º e do salário dos servidores.
Outro reflexo foi o adiamento da convocação extraordinária. No início da semana, o Piratini trabalhava com a hipótese de, caso a pauta não fosse concluída, chamar os deputados para novas votações na semana entre o Natal e o Ano-Novo. O governo, porém, subestimou o ímpeto da oposição para se revezar na tribuna, atrasando as sessões, e foi surpreendido com a falta de apoio do PDT. Com sete deputados e duas secretarias, o partido atuou com o espírito de bancada oposicionista, sendo fundamental para barrar a mudança no duodécimo.
Piratini ganha tempo para enquadrar base aliada
Diante desse cenário – e da ausência de quatro deputados da base na próxima semana – o Piratini decidiu deixar o restante do pacote para ser votado em 2017. Além de ganhar tempo para angariar aliados, até lá já terá tomado posse Edu Oliveira (PSD), suplente de Jardel, cassado na última sessão do ano. Outro que reassume a vaga na Assembleia é o atual secretário de Minas e Energia, Lucas Redecker (PSDB).
A opção pela convocação somente no final de janeiro também se explica pela presença na presidência da Casa da deputada Silvana Covatti (PP), que comandou com mão de ferro as votações do pacote. Se deixar para fevereiro, na retomada dos trabalhos legislativos, o governo terá no comando da Assembleia um opositor, Edegar Pretto (PT).
Até lá, o Piratini deve avançar no assédio ao PTB, cuja postura de independência fragiliza o governo pelo comportamento dúbio de alguns deputados, que ora votam com o governo, ora com a oposição. O PSB, embora tenha sido fiel até agora, já avisa que não vota mudanças na folha de pagamento nem pela privatização de estatais. A resistência faz com que cresça no núcleo duro do Piratini a ideia de desistir da PEC dos salários e deixar apenas a Sulgás na vitrine da privatizações, já que é a estatal de maior interesse do mercado. Essa decisão, porém, será amadurecida durante o recesso.
– Por enquanto, nada muda. Vamos ver como se desenvolvem as negociações em janeiro e sentir o espírito do plenário. Os projetos podem ser alterados por emenda na hora da votação – diz uma fonte do governo.