Às 11h08min desta terça-feira, Carlos Marun (PMDB-MS) recebeu ligação de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Cassado na noite anterior, o ex-presidente da Câmara agradeceu, em dois minutos de conversa, o empenho do parlamentar, único peemedebista que teve coragem de subir à tribuna para defendê-lo.
Nascido em Porto Alegre e eleito pelo Mato Grosso do Sul, Marun foi o escudeiro solitário e incansável que restou a Cunha. Em entrevista a ZH, admite que o resultado da votação foi "acachapante" e credita o placar ao receio dos colegas de enfrentarem a opinião pública.
Por que o senhor ficou ao lado de Cunha até o fim?
Não tenho certeza de que ele tem dinheiro no Exterior, exceto o trust, que não é conta. Para votar por uma cassação, teria de ter certeza. Defendi suspensão, pena para a omissão dele. Podem falar do conjunto da obra, mas ele está sendo julgado no STF (Supremo Tribunal Federal). Considero surpreendente e acachapante o resultado, diante do intenso apoio que Eduardo tinha há poucos meses.
Há provas do conjunto da obra?
Dormir em hotel de luxo e comprar sapato caro não é crime. Só é crime se o dinheiro que paga os gastos é resultante de vantagem indevida. O conjunto da obra ainda não avançou no Judiciário, não há prova conclusiva de que Cunha tenha usado dinheiro mal havido.
Cunha classificou como "hipocrisia" os votos pela cassação de antigos aliados. O senhor concorda?
Não quero julgar ninguém. As acusações são as mesmas desde abril (mês da aprovação do impeachment na Câmara), quando Eduardo era bajulado, aplaudido, ovacionado. Não houve nada de novo, o que aumentou foi a pressão da opinião pública. Tenho certeza de que muita gente votou pela cassação contrariada.
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No PMDB, só o senhor foi à tribuna defender Cunha. Na bancada gaúcha do partido, também há simpatizantes dele que votaram pela perda do mandato. O que explica o abandono?
Não tem explicação. Entendo que os colegas tiveram receio de enfrentar a opinião pública. Desde que iniciei minha vida pública, nunca fiz questão de ser dependente da opinião pública. Não a desconsidero, mas não aceito ser refém.
O senhor teme não se reeleger?
Admito que teria dificuldade de disputar uma majoritária, até por isso não concorri à prefeitura de Campo Grande. Em uma proporcional, tenho a mais absoluta convicção de que continuarei sendo campeão de votos.
Cunha criticou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que já foi aliado dele. Maia apoiou a punição?
O Rodrigo lavou as mãos.
O senhor já conversou com Cunha depois da cassação?
Me ligou, falamos por dois minutos. Agradeceu, pois reiterou que eu não teria motivo para defendê-lo. Também manifestou mágoa com muitos que poderiam simplesmente ter se ausentado. Prefiro não tocar em nomes.
Cunha pode fazer delação premiada? Vai retaliar quem o abandonou?
Não tenho convicção de que o Eduardo seja bandido, então, não acredito em delação. Entendo que pode fazer um livro interessante sobre os meandros do impeachment, porque comandou o processo.
Ele pode prejudicar Michel Temer?
Não acredito, confio em Temer. A (Operação) Lava-Jato tem dois anos e até agora nada de consistente foi colocado em relação ao presidente.
O senhor tem família em Porto Alegre e veraneia no Litoral Norte. Volta tranquilo ao Estado?
Minha consciência é a imagem que meu pai faz de mim. É um homem nascido no Alegrete, advogado. Sempre que fui a Porto Alegre ouvi preocupação da minha mãe e, da parte do pai, o elogio de que estava fazendo a coisa certa. Não ia virar a casaca.