O plenário da Câmara cassou na noite de segunda-feira, por 450 votos, o mandato do ex-presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) após 335 dias de processo. Considerado até poucos meses como um dos parlamentares mais poderosos do Congresso, o fluminense recebeu o apoio de 10 colegas – outros nove abstiveram-se devotar. Em seus últimos apelos, o parlamentar disse estar sendo perseguido por conta da instauração do processo que levou à cassação de Dilma Rousseff.
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Sem foro privilegiado, Cunha tentará blindar família contra Moro
Após o resultado, disse que fará um livro sobre o impeachment e reclamou da atuação do governo. Derrotado, Cunha tem uma prioridade definida: proteger a mulher e a filha. Para escudeiros, o ex-presidente da Câmara agirá nos próximos meses para blindar a família de eventuais condenações na Lava-Jato. Na política, o peemedebista deve operar nos bastidores, uma vez que está inelegível até janeiro de 2027, quando terá 68 anos.
– Até existem casos de ressurreição, mas a cassação é uma morte política. Ele tem que se concentrar na defesa no Judiciário – afirma Carlos Marun (PMDB-MS), que liderou as tentativas em plenário de abrandar a pena, substituindo pela suspensão do mandato.
A tendência é de que a batalha jurídica de Cunha fique concentrada na Justiça Federal do Paraná, sob ameaça da caneta do juiz Sergio Moro. Mulher do ex-deputado, a jornalista Cláudia Cruz é ré na Lava-Jato, enquanto a filha Danielle é investigada. Como perdeu o foro privilegiado, o peemedebista deve ver seus processos passarem do Supremo Tribunal Federal (STF) para o Paraná.
Réu em duas ações penais, denunciado em um inquérito e alvo de outras investigações, Cunha prefere manter os casos no STF, pois considera inevitável a condenação de primeira instância com Moro. Sua defesa deve formalizar o pedido, porém a Corte tem decisões na contramão. Aliados evitam falar abertamente, mas, nos bastidores, temem pelo futuro imediato do ex-parlamentar.
Projetam, inclusive, a possibilidade da prisão de Cunha em futuras etapas da Lava-Jato. Sobre uma eventual delação, apostam que a hipótese seria cogitada apenas para “salvar” a mulher e a filha, com a chance de o Ministério Público Federal dificultar um acordo.
– Ele passou brigando com o Janot (Rodrigo, atual procurador-geral da República). Se a delação do Marcelo Odebrecht não saiu até hoje, imagine a novela que seria para fechara do Cunha – disse um ex-escudeiro.
Na Câmara e no Planalto, a ordem é não tripudiar a fim de evitar provocações.
– Se ele delatar ou começar a vazar informações na imprensa para se vingar, todos vão virar as costas. Se ficar quieto, haverá solidariedade – projeta um parlamentar do centrão, bloco partidário próximo a Cunha.
Redução de poder já é observada
Entre as bancadas do PMDB e dos partidos do centrão, há divergência sobre sua influência dentro da Câmara que presidiu com mão de ferro por 15 meses. Deputados acreditam que ele terá condições de operar nos bastidores em defesa de interesses empresariais, como fazia quando era líder do PMDB. Essa força passa pela não fragmentação do centrão.
Defensor do ex-presidente da Casa, Jovair Arantes (PTB-GO) trabalha para herdar o comando do bloco.
– Cunha é um homem com raízes profundas e muito trânsito. Não será surpresa se continuar mandando – destaca Jorginho Mello (PR-SC).
Antigos parceiros discordam. Desde maio, quando Cunha foi afastado pelo STF, seu poder sofreu um processo de erosão, acelerado com a renúncia à presidência da Câmara, em julho. Ele não conseguiu emplacar seu candidato na disputa pelo comando da Casa. Escolhido pelo centrão, Rogério Rosso (PSD-DF) foi derrotado por Rodrigo Maia(DEM-RJ).
O mesmo ocorreu na bancada do PMDB. Chancelado por Cunha, Hugo Motta (PMDB-PB) optou por ficar de fora da disputa pela liderança com Baleia Rossi (PMDB-SP), nome de Michel Temer.
– Observa-se um esvaziamento de poder. Sem a caneta (de presidente), é difícil – comenta José Fogaça (PMDB-RS).
A situação de Cunha também é delicada em seu Estado. No Rio de Janeiro, a rejeição a seu nome é alta. A declaração de voto pró-cassação dada por Pedro Paulo (PMDB-RJ), candidato à prefeitura do Rio, indica que Cunha não tem a proteção do diretório local do próprio partido.
– Ele sempre foi um deputado eleito porque tinha o apoio de muitos prefeitos, vereadores e dos evangélicos – diz um desafeto.