Enquanto o governador José Ivo Sartori raspa o cofre para tentar pagar os servidores, Alan Luz deixou de comer carne e Daniela Engel passou a fazer faxinas. A ginástica da crise financeira que assola o Rio Grande do Sul aflige o inquilino do Palácio Piratini – que irá parcelar pela oitava vez os salários, com o depósito de apenas R$ 650 ao funcionalismo –, mas seus efeitos mais nefastos recaem sobre quem atua na máquina do Estado.
Coube ao secretário da Fazenda, Giovani Feltes, anunciar a precariedade das finanças públicas. Com pouco mais de R$ 232 milhões em caixa e diante de uma folha quatro vezes superior (R$ 996 milhões), o governo irá desembolsar a segunda menor parcela paga desde que começaram os atrasos.
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Em agosto de 2015, os servidores haviam recebido R$ 600. Contudo, desde que o aumento na alíquota de ICMS entrou em vigor, em janeiro deste ano, e que o Piratini ficou desobrigado de pagar a dívida com a União – cujo valor gira em torno de R$ 260 milhões mensais –, jamais o valor inicial repassado ao funcionalismo havia sido tão baixo.
Caso ocorra o ingresso de recursos nas contas do Tesouro ao longo do dia, Feltes sinaliza com novos depósitos até o fim da tarde, chegando a R$ 980 por matrícula. O secretário enumerou as razões para uma parcela tão baixa: queda na arrecadação e nos repasses federais, aumento das despesas e esgotamento de fontes alternativas de recursos, como os depósitos judiciais.
– É angustiante para eles (os servidores) e para nós – disse Feltes.
As justificativas, porém, em nada amenizaram as preocupações de Alan Luz, 46 anos, auxiliar de enfermagem do Instituto Psiquiátrico Forense. Ele diz receber, líquido, R$ 1,4 mil e estar há quatro meses no cheque especial. Colocou o carro à venda, parou de comer carne e só compra roupas usadas.
– A decepção é geral. Não sei mais o que fazer. Este mês não vai sobrar nada, pois o banco desconta o negativo e os juros –comenta o funcionário do manicômio judiciário.
Para a agente administrativa Daniela Engel, 40 anos, o novo parcelamento não fez efeito. Por conta de sucessivos empréstimos consignados contraídos para pagar as contas, o salário líquido dela está em R$ 617 – ou seja, este mês vai receber integralmente. Até fevereiro, Daniela trabalhava na Secretaria de Meio Ambiente, em Porto Alegre. Com gratificações e benefícios, sua remuneração bruta, diz, chegava a R$ 2 mil. Sem reajuste e enrolada em dívidas, pediu transferência para Viamão, onde mora, e com isso reduziu os gastos com os deslocamentos. Ainda assim, usa as horas vagas para complementar a renda fazendo faxinas e trabalhando de garçonete.
– O triste é saber que o parcelamento não muda nada na minha vida. Não tenho nada mais a receber. Continuo me virando em 10 para tentar sobreviver – indigna-se a servidora.