A empreiteira Odebrecht e o Ministério Público Federal assinaram no dia 25 um pré-acordo de delação premiada de executivos da empresa e de leniência da companhia relacionados ao esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato. A reportagem confirmou com fontes envolvidas no caso a informação revelada pelo jornal Folha de S.Paulo.
Maior empreiteira do país, a Odebrecht teve o presidente do grupo empresarial, Marcelo Odebrecht, preso há quase um ano, em 19 de junho. Ele foi um dos principais alvos da Operação Erga Omnes (expressão em latim que significa "vale para todos"), 14ª fase da Lava-Jato. Na ocasião, também foi preso o então presidente da Andrade Gutierrez Otávio Azevedo, que já assinou acordo de delação premiada.
A negociação da Odebrecht com procuradores da República teve início há cerca de um mês e meio. Um dos itens discutidos entre as partes é que a empresa deixará de ser alvo de novos mandados de busca e apreensão ou de operações da PF.
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Além da Erga Omnes, a Odebrecht teve escritórios vasculhados nas Operações Acarajé e Xepa, pela ordem em fevereiro e março deste ano. A última dessas fases levou à prisão o publicitário João Santana, responsável pelas duas campanhas eleitorais da presidente afastada Dilma Rousseff e do presidente interino Michel Temer.
Com o acordo de delação e o de leniência, se efetivamente forem fechados, serão estabelecidas condições como o valor de multa que a empreiteira arcará e as sanções penais aplicadas a Marcelo Odebrecht e a seus pares. Mesmo já condenado a 19 anos de prisão por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa, Odebrecht poderá ter a pena "perdoada" ou significativamente reduzida, a exemplo de outros réus da Lava-Jato.
A eventual concessão de benefícios será decidida pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, se houver homologação da delação. Isso não tem prazo para ocorrer. Mas a expectativa, a partir do Acordo de Confidencialidade, é de que as negociações poderão, enfim, deslanchar. A delação de Odebrecht será submetida ao crivo da Corte máxima, e não ao juiz federal Sergio Moro, porque a previsão é que ele revele nomes de políticos com foro privilegiado, como deputados e senadores.
Na prática, como ocorreu com outras pessoas jurídicas que seguiram a mesma trilha, a Odebrecht agora se obriga a apresentar aos investigadores o que tem para revelar sobre fatos e obras em torno das quais teria funcionado esquema de propinas e cartel. O Acordo de Confidencialidade representa, também, um "armistício", a garantia de que a empreiteira não será mais alvo de novos "ataques" da Lava-Jato, as operações especiais, exceto se algum executivo seu for flagrado na prática de novos crimes.
Desde que o presidente do grupo, Marcelo Odebrecht, foi preso, em 19 de junho de 2015, a empresa tem sido alvo de constantes missões da Polícia Federal e da Procuradoria da República. As mais recentes operações, Acarajé e Xepa, atingiram o coração financeiro da empresa e descobriu a atuação de um "departamento" de pagamentos ilícitos, a partir da apreensão da superplanilha de pagamentos em poder de um de seus executivos, em fevereiro.
Os termos
A partir do Acordo de Confidencialidade, a empresa deverá informar detalhes preliminares sobre operações ilegais, que podem incluir outras construtoras, pagamentos ilícitos e nomes de agentes públicos contemplados com propinas sobre contratos fraudados. Nesta etapa, a empresa não entrega provas, o que só deverá fazer depois de eventualmente fechado o acordo de delação premiada – só aí são repassados aos investigadores, por exemplo, cópias de e-mails, números de contas, identificação de instituições financeiras, operadores e testemunhas.
É a fase dos Anexos. Cada Anexo traz o resumo de um fato. Não há limites de Anexos. Nesse período poderão ocorrer "conversas informais" entre os procuradores e os executivos. As provas só quando for assinado o Acordo de Colaboração. Investigadores acreditam que Marcelo Odebrecht poderá revelar muitas informações, inicialmente, sobre financiamento de campanhas eleitorais.
– Pega todo mundo, não escapa nada – avalia um investigador.
Os repasses teriam favorecido quase todos os partidos, especialmente as maiores legendas, e campanhas presidenciais. Teriam ocorrido repasses oficiais, declarados à Justiça eleitoral, e por caixa 2. Outro capítulo é relativo ao pagamento de propinas a agentes públicos de estatais.
Interessa aos investigadores dados sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Eles querem saber sobre o sítio de Atibaia, no interior de São Paulo, cuja propriedade a força-tarefa da Lava-Jato atribui ao petista – o que é negado com veemência por sua defesa. Os investigadores também miram em tráfico de influência supostamente praticado por Lula em favor da empreiteira, especialmente no exterior – conduta também repudiada pelos advogados do ex-presidente.
A suposição é de que Marcelo Odebrecht poderá oferecer "muita coisa sobre campanhas eleitorais e ir muito além da Petrobras".
Longo período
As negociações entre a Odebrecht e a força-tarefa tiveram início em fevereiro. De lá para cá foram realizadas nove reuniões entre advogados da empreiteira e os procuradores. As primeiras duas reuniões foram "duríssimas", as partes não se entendiam.
Algumas reuniões ocorreram por videoconferência. Delas participaram procuradores da República de Curitiba, base da Lava-Jato, do Rio e de Brasília, estes da Procuradoria-Geral da República, da equipe de Rodrigo Janot. No início, houve muita resistência das partes envolvidas na negociação, inclusive dentro da própria companhia.
Marcelo Odebrecht e nem qualquer outro executivo participou de reuniões com os procuradores. Ele ainda não sentou à mesa com a força-tarefa da Lava-Jato em nenhuma oportunidade. O empresário está preso no Complexo Médico Penal de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba. O avanço do processo de delação não reflete nas ações penais contra Marcelo Odebrecht e os outros executivos da companhia. Os processos seguem seu rumo natural, até porque existe a possibilidade de, ao final das negociações, a Procuradoria da República ou a própria empreiteira não aceitarem os termos.
A reportagem procurou o criminalista Téo Dias, que integra o núcleo de defesa da Odebrecht, mas ele não se manifestou sob alegação de que impedimento legal não o autoriza a fazer comentários sobre as negociações.