Em coletiva de imprensa na tarde desta segunda-feira, em Brasília, o ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União (AGU), disse esperar que a anulação da votação do impeachment na Câmara seja respeitada. Ele admitiu ter se encontrado com o presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), autor da decisão, durante jantar na noite do último domingo para tratar do caso.
Na votação anulada por Maranhão, que atendeu pedido da AGU a partir de recurso apresentado no dia 25 de abril, 367 deputados se posicionaram a favor da admissibilidade do processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff. A reviravolta pegou Brasília de surpresa na manhã desta segunda-feira. Conforme determinação do parlamentar, nova votação terá de ser feita no prazo de cinco sessões.
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Cardozo, que é responsável pela defesa de Dilma, conversou por cerca de uma hora com jornalistas. Saudou a decisão e demonstrou confiança sobre o futuro, negando-se a revelar o que pretende fazer caso o Senado dê continuidade ao processo – menos de uma hora depois, o presidente do Senado, Renan Calheiros, anunciou que ignoraria a decisão de Maranhão e manteria o andamento do processo na Casa. Em vários momentos, Cardozo chegou a fazer brincadeiras. Sem ser questionado, reconheceu ter conversado pessoalmente com Maranhão em duas ocasiões desde sexta-feira.
A última vez ocorreu na noite de domingo, em jantar na casa do deputado federal Silvio Costa (PT do B-PE), em Brasília, na companhia do governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B). Ele disse que o próprio deputado o teria chamado para saber "mais detalhes" sobre seus argumentos jurídicos.
O encontro não foi registrado na agenda oficial do ministro, mas ele rebateu críticas de que o ato seria antiético ou "não republicano" e disse que pedirá aos assessores para que registrem o fato posteriormente para evitar polêmica.
– Foi num domingo à noite. Eu não tinha agenda oficial, mas fui procurá-lo (Maranhão). Se fosse não republicano eu não estaria dizendo o que ocorreu. Encontrar um parlamentar não tem nada de não republicano, especialmente quando tento convencê-lo da minha defesa como advogado – disse Cardozo, em um dos poucos momentos em que demonstrou irritação.
Ao ser questionado se o cargo de ministro da Educação teria sido oferecido a Maranhão, o advogado-geral da União negou a possibilidade. Cardozo afirmou apenas ter dito ao interlocutor que, se o processo tivesse continuidade no Senado, a questão acabaria judicializada e enviada ao crivo da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o que "não seria bom para o Brasil".
– O presidente se comprometeu a se debruçar sobre o caso. Ele não me informou o que pretendia decidir, e hoje eu soube. Basicamente, a decisão acolhe todos os pontos que suscitamos, menos um. Ele entendeu que não havia ilegalidade nas declarações de voto feitas pelos parlamentares enquanto votavam – afirmou Cardozo.
Com a nulidade, o advogado-geral da União disse acreditar que a Câmara não terá alternativa, senão realizar novamente a votação, desas vez "sem vícios".
– Não me parece correta a compreensão de que se pode continuar o processo no Senado. Se isso acontecer, só confirmará que a Constituição vem sendo violentamente atacada ao longo desse processo – destacou.
Sobre as dúvidas a respeito da validade da decisão de Maranhão, Cardozo também foi taxativo. Ele disse que a petição da AGU foi apresentada dentro do prazo e que, por isso, a anulação da votação não pode ser considerada "extemporânea".
– Não pode uma pessoa, pela demora, ter lesado seu direito. Isso, em si, é um absurdo. Não bastasse essa questão, cabe à Câmara avaliar o que de legal fez ou não fez. É o poder de autotutela. E a Câmara decidiu por anular sua decisão, exercendo o poder de tutela – concluiu.