A menos de 20 dias do primeiro turno da eleição para a prefeitura de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL) intensificaram os ataques mútuos e ajustaram os discursos com vistas a um possível confronto direto no segundo turno.
O último levantamento do Datafolha, divulgado na quinta-feira (19), coloca ambos na liderança e o influenciador Pablo Marçal (PRTB) na terceira posição, após um crescimento rápido e uma estabilização. As campanhas do MDB e do PSOL interpretaram os números como um indicativo de que o candidato do PRTB perdeu tração na disputa.
Com Marçal isolado, Nunes e Boulos têm focado suas críticas um no outro, tanto em redes sociais quanto em declarações públicas e debates eleitorais. Nunes aposta em pautas de costumes, associando Boulos à liberação de drogas e à desordem social, enquanto Boulos explora polêmicas envolvendo a gestão Nunes e a vida pessoal do atual mandatário, como alegações de infiltração do crime organizado no transporte público e um boletim de ocorrência registrado contra Nunes por sua esposa há 13 anos.
A intensificação do confronto direto entre os dois ficou evidente no último debate, promovido por SBT, Terra e Rádio Novabrasil na sexta-feira (20), quando Nunes direcionou todas as perguntas a Boulos, ignorando outros adversários. O candidato do PSOL, por sua vez, escolheu José Luiz Datena (PSDB) e Tabata Amaral (PSB) para fazer questionamentos, mas aproveitou as duas oportunidades para criticar a gestão de Ricardo Nunes. No debate anterior, realizado por RedeTV! e UOL na segunda-feira (16), Nunes e Boulos chegaram a fazer perguntas um para o outro.
Após investir em uma ofensiva contra Pablo Marçal, destacando a suposta ligação de membros do partido do ex-coach com o Primeiro Comando da Capital (PCC), Nunes mudou a estratégia, incorporando pautas da cartilha bolsonarista ao discurso e investindo em ataques ao líder sem-teto. Nos últimos debates, ele afirmou que Boulos quer "liberar a maconha" no país. Recentemente, divulgou uma série de vídeos nas redes sociais associando o candidato do PSOL à descriminalização das drogas.
De acordo com integrantes da campanha de Nunes, os trackings indicam que Boulos é o adversário mais provável para o prefeito enfrentar no segundo turno, já que Marçal não conseguiu sustentar o ritmo de crescimento acelerado e viu sua rejeição aumentar nas últimas semanas. A estratégia do emedebista tem sido destacar suas diferenças em relação ao deputado federal, além de reforçar o estigma de radical, apontado por pesquisas qualitativas como a principal fragilidade da candidatura de Boulos.
O prefeito também adotou uma estratégia de alinhar seu discurso às pautas bolsonaristas no ambiente digital e em entrevistas a canais conservadores. Em entrevista ao youtuber Paulo Figueiredo Filho, investigado pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado, Nunes defendeu a abertura do processo de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e minimizou os ataques de 8 de janeiro às sedes dos três poderes, comparando a tentativa de golpe com manifestações promovidas por Boulos. Na mesma ocasião, Nunes também mudou de postura em relação à obrigatoriedade da vacina e ao passaporte vacinal.
O candidato do PSOL também intensificou os ataques contra Nunes, considerado por interlocutores de Boulos o principal adversário do projeto de poder do partido. Embora o deputado tenha direcionado críticas tanto a Nunes quanto a Marçal nas últimas semanas, tentando retratá-los como "duas faces da mesma moeda" do bolsonarismo, a estabilização de Marçal nas pesquisas fez com que ele voltasse a focar sua ofensiva no atual prefeito. Na última semana, Boulos elevou o tom de suas críticas, que agora exploram não apenas a administração pública, mas também controvérsias na vida pessoal de Nunes e supostas irregularidades em sua gestão.
Apenas nesta semana, Boulos fez 21 publicações contra Nunes no Instagram. Em uma delas, o candidato do PSOL explorou um boletim de ocorrência por violência doméstica registrado contra Nunes por a esposa, Regina Nunes, em fevereiro de 2011. O post incluía um vídeo mostrando reações do público às declarações do prefeito sobre o caso.
Nunes afirmou inicialmente que o documento era forjado, mas depois corrigiu-se, alegando que se referia à história em torno da queixa como falsa. Ele nega ter agredido a esposa. Na época, não foi aberto inquérito policial contra Nunes, pois, para que a apuração avançasse, era necessário que Regina apresentasse uma representação contra ele, o que não ocorreu.
Em resposta à reportagem, a campanha de Nunes afirmou que "o ataque de Boulos à família de Ricardo Nunes prova como ele e Marçal se assemelham não somente em técnicas de invasão - um de propriedade, outro de contas de idosos". Ele ainda afirmou que "seu 'pacto de civilidade' é mais uma de suas mentiras para a imprensa e a população".
"Marçal já foi condenado pela Justiça pelas agressões à família Nunes. Boulos está no mesmo caminho. Em tempo: Ricardo Nunes nunca falou sobre familiares de qualquer dos candidatos", diz a campanha do prefeito.
No debate da RedeTV!, Boulos também trouxe à tona outro episódio policial envolvendo Nunes: num incidente em 1996, o atual prefeito foi detido por disparar uma arma de fogo na porta de uma balada em Embu das Artes (SP), conforme revelado pelo site Metrópoles. O candidato do PSOL também publicou a reportagem sobre o episódio em suas redes sociais. Na época, Nunes negou ter atirado, e o processo foi arquivado após acordo.
As críticas contra o emedebista também chegaram à propaganda eleitoral do PSOL no rádio e na TV, com duas inserções de 30 segundos cada uma. Em um dos vídeos, são apresentados depoimentos de paulistanos que perderam familiares devido à suposta ineficiência dos serviços públicos municipais. Embora os depoimentos sejam encenados por atores, a campanha de Boulos afirma que as histórias retratadas são baseadas em casos reais. A outra propaganda se passa em uma sala de aula e critica a suposta ausência de Nunes durante a maior parte de seu mandato, sugerindo que o prefeito só está aparecendo agora por ser ano eleitoral.