As instituições de ensino confirmam que a política está na boca dos estudantes. Houve pelo menos cinco manifestações nesta semana em Porto Alegre — todas organizadas pelos próprios alunos, via WhatsApp.
Cecília Farias, uma das diretoras do Sindicato dos Professores do Ensino Privado (Sinpro-RS), avalia que as escolas da Capital respeitaram os atos dos estudantes "e devem respeitar, quando feitos de forma pacífica".
— As informações que temos é que os alunos trazem o assunto em sala de aula e o professor ouve. Se é da competência da matéria do professor, responde, mas não há prolongamento da discussão. A escola tem um projeto pedagógico para desenvolver — diz Cecília.
O Sindicato das Escolas Privadas do Rio Grande do Sul (Sinepe) não passou nenhuma orientação às instituições na hora de tratar política em sala porque cada uma tem autonomia em seu projeto pedagógico. O presidente da entidade, Bruno Eizerik, conta que há discussões entre alunos que pensam politicamente diferente e que, assim como em outros ambientes, houve separação entre grupinhos pró e a favor de determinado candidato à Presidência da República.
— Obviamente, se houve polarização e discussão na sociedade, isso acaba chegando na escola. O equívoco seria tapar o sol com a peneira. Em geral, os diretores estão orientando os professores a abordar o assunto em sala de aula. Você não vai abordar com os pequeninhos, mas, com os alunos mais velhos, não há como fugir, eles mesmos trazem o assunto — diz Eizerik.
Sindicatos de professores e de escolas, tanto da rede privada quanto estaduais, criticam iniciativas como a do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) e da deputada eleita Ana Caroline Campagnolo (PSL-SC), que estimularam jovens a filmar professores caso desconfiassem que alguma ideologia estivesse sendo promovida em sala de aula. A instrução segue a toada do projeto Escola sem Partido, que seria votado ontem na Câmara, mas foi adiado.
Helenir Aguiar Schürer, presidente do Cpers/Sindicato, que representa docentes da rede estadual de ensino, diz que os professores estão receosos de dar aula, com medo de serem mal-interpretados. A entidade chegou a publicar, em seu site, um manual para instrui-los a se defender contra tentativas de censura, com base na liberdade de cátedra, assegurada pela legislação brasileira.
— Hoje, passa-se aos alunos que o professor não merece confiança e que deve ser vigiado para, talvez, denunciá-lo. Isso é muito perigoso. Há uma intimidação que leva à autocensura na hora de abordar conteúdos didáticos. É uma paranoia, um terreno perigoso que estamos entrando na educação — diz Helenir, citando que há medo em abordar conteúdos de sociologia ou biologia.
A Secretaria Estadual da Educação (Seduc) analisa a vigilância sobre professores e afirma que irá se manifestar no futuro, mas ressalta que o currículo não é estático e que assuntos "quentes" devem ser abordados.
— Fenômenos sociais, culturais e políticos nos circundam. Se não fosse isso, os alunos se manifestariam sobre a Copa do Mundo. Quando há temas fortes, isso chega até a sala de aula — diz Sônia Rosa, diretora do departamento pedagógico da Seduc.
Colégios se dividem na forma como reagir
O Colégio Marista Rosário, onde ocorreram manifestações no início da semana, informa que irá realizar "trabalhos pedagógicos em sala de aula ressaltando a relevância da cidadania". A direção passou nas turmas de 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio para relembrar duas normas: a obrigação de usar uniforme, inclusive nos intervalos, e a proibição de política partidária.
Neste caso, os alunos foram lembrados que, dentro da escola, não é possível utilizar qualquer coisa que os identifiquem a algum movimento partidário, como broches, bandeiras ou camisetas. Além disso, foi ratificada a necessidade de consulta prévia à direção para realização de qualquer evento no ambiente escolar.
O Colégio La Salle Santo Antônio, por nota, informou que posições diferentes fazem parte da expressão dos estudantes, mas que a instituição orienta e acompanha os alunos "visando à harmonia e respeito com todos". As manifestações da segunda-feira envolveram alunos com camiseta preta e verde-amarelo, mas as aulas ocorreram normalmente, relatou.