Os efeitos da pandemia podem ser sentidos além das crises sanitária e econômica. Na semana em que Caxias do Sul passou à bandeira vermelha no modelo de distanciamento controlado do governador Eduardo Leite, provocando reações devido às medidas mais restritivas, vieram à tona divergências políticas entre vereadores aliados na eleição de 2016 e no impeachment do ex-prefeito Daniel Guerra (Republicanos). São os sinais da divisão de águas na campanha eleitoral, de olho no comando da cidade, nas vagas no Legislativo e na projeção político-partidária.
Também pôde ser notado que não há total sintonia no pensamento da dupla Adiló Didomenico e Paula Ioris, que formam a chapa do PSDB, partido de Leite. Pelo menos no que se refere à pandemia. De um lado, Adiló, pré-candidato a prefeito, declarou à coluna Mirante, do jornal Pioneiro, que a medida determinada pelo Governo Leite era uma "punição muito severa para Caxias do Sul".
Adiló usou um tom praticamente de oposição quando se dirigiu a Porto Alegre, na segunda-feira, para tentar reverter a decisão junto ao governador. E repetiu termos como "pesada" e "forte" para dimensionar o que entende como "punição" a Caxias. De outro lado, Paula, pré-candidata a vice na chapa de Adiló, disse em pronunciamento na Câmara no dia seguinte:
– O modelo não veio para punir, veio para ter um equilíbrio entre a saúde e a economia.
E insistiu:
– A bandeira vermelha não veio para punir, ela veio para alertar [...] Não tem punição nisso, tem alerta de cuidado.
A manifestação foi claramente um contraponto ao que disse seu companheiro de chapa. Paula é a representante de Leite na Serra e é presidente do PSDB Mulher no RS. Adiló é cristão novo no partido, estava no PTB até abril, quando trocou de sigla.
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Vereador de Caxias do Sul chama colegas de oportunistas
Vale lembrar que Adiló, o deputado estadual Neri, O Carteiro (Solidariedade) e a vereadora Tatiane Frizzo (PSDB, ex-Solidariedade) levaram, ainda em abril, pedidos ao prefeito Flávio Cassina (PTB) para retomada gradual do comércio e das escolas de educação infantil. Paula não aderiu.
A medida permite a leitura de que a chapa se movimenta para os dois lados em busca do voto: os que querem a volta das atividades e os que defendem o "fica em casa".
De aliados à acusação de oportunistas
A ida de Adiló Didomenico ao lado do líder do Governo Cassina na Câmara, Velocino Uez (PTB), e do deputado Neri ao Palácio Piratini, na segunda-feira – voltaram sem conseguir falar com o governador – fez com que viesse a público o mal-estar que cerca os que fizeram parte do grupo que queria eleger Edson Néspolo (PDT) à prefeitura na eleição passada. Hoje a história é outra. Adiló e Paula formam uma chapa, Néspolo é pré-candidato a prefeito e o MDB garante que terá candidato próprio.
O vereador Paulo Périco (MDB), aos gritos na sessão de terça-feira passada (16/6), chamou Adiló, Uez e Neri de oportunistas, porque não convidaram o presidente da Câmara, Ricardo Daneluz (PDT), nem os outros deputados de Caxias (Carlos Búrigo, do MDB, e Pepe Vargas, do PT).
Périco também falou do governador, dizendo que ele "nunca teve carteira assinada", cobrou pelo fato de não ter avisado os prefeitos da região que a bandeira iria mudar e que ele não viesse a Caxias fazer politicagem. Pelo tom usado, deu a entender que o vereador pretende se insurgir diante da possibilidade de o governador vir à cidade, em especial por ser ano eleitoral.
Adiló foi diretor-presidente da Codeca na administração de José Ivo Sartori (MDB) na prefeitura de Caxias.
MDB segura o jogo
O MDB até agora evitou anunciar quem será o nome que o representará na disputa à prefeitura. Usa a estratégia de jogar com a possibilidade de o ex-governador José Ivo Sartori aceitar concorrer. Assim, atrasa definições de outros partidos, uma vez que Sartori atrairia apoios e enfraqueceria outras candidaturas.
Nos bastidores, eventuais aliados dizem que, apesar do jogo do MDB, Sartori não será candidato. Há também quem afirme que o próprio Sartori já teria dito a partidários, antes da pandemia, que o momento do MDB é o de Búrigo. Inclusive, de que era hora de ele (Sartori) fazer por Búrigo o que o Búrigo sempre fez por ele.
A resistência de alguns no MDB se dá em função da dependência de Sartori, porque entendem que com o ex-governador na disputa seria uma "campanha ganha". O PSB, por exemplo, é um que ainda não decidiu para onde vai, apesar de, na Câmara, os vereadores terem formado com o PDT o Bloco Social Trabalhista.
Há poucos dias houve um encontro do presidente Adriano Boff e do vice-prefeito Elói Frizzo com Néspolo no escritório do ex-prefeito Alceu Barbosa Velho (PDT). Nos bastidores, há comentários de que, se Sartori concorresse, Néspolo seria seu nome a vice.
Fator importante que trava o desfecho das alianças e candidaturas é a indefinição da data da eleição. Havendo o adiamento, os partidos têm mais tempo para as costuras políticas. Porém, há possibilidade de a data de 4 de outubro ser mantida, sendo ampliado o horário e locais de votação.
Outras rusgas
:: APOIO DE NERI E VAGA NA ASSEMBLEIA
Nada é por acaso. O apoio do deputado estadual Neri, O Carteiro, que era nome forte para a disputa a prefeito, foi cobiçado por vários partidos. Ele se definiu por apoiar a chapa tucana, ao mesmo tempo que vários integrantes de seu partido, o Solidariedade, foram para o PSDB.
Adiló disse publicamente, na sessão de terça, que Périco sabia o quanto o MDB tentou buscar o apoio de Neri.
– Não dá para desprezar as uvas que a gente não alcança [...] Então, não bata em quem vocês não conseguiram alcançar – afirmou Adiló.
Já Eduardo Leite derrotou o emedebista José Ivo Sartori, que buscava a reeleição em 2018. Mesmo assim, o MDB foi para o Governo Leite e ocupa a Secretaria dos Transportes. A licença do deputado estadual Juvir Costella na Assembleia é o que permite que Carlos Búrigo tenha uma cadeira na Assembleia Legislativa.
:: LEITOS DE UTI NO HOSPITAL GERAL
Não foi apenas a viagem a Porto Alegre que incomodou os então aliados que não apoiam Adiló. Na vinda do governador a Caxias no mês passado, quando foram entregues 10 leitos de UTI no Hospital Geral, a presença de Paula Ioris como a única parlamentar na ocasião, provocou mal-estar. O vereador Rafael Bueno (PDT) chamou de "sujeira política".
Bueno, que preside a Comissão de Saúde na Câmara, reclamou não ter sido convidado e ressaltou que Paula não faz parte da comissão.
Paula disse que foi ela quem intermediou a vinda do governador, que o protocolo da visita foi feito pelo Governo do Estado e limitou bastante o número de pessoas.
– Como intermediei a vinda, solicitei ao presidente da Câmara que eu representasse a Casa. Não era um momento de levar demandas – disse ela na ocasião.
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